Alguns reis franceses, como Luís 14, conhecido como “Rei Sol”, ou Luís 16, casado com Maria Antonieta e que morreu guilhotinado, são mundialmente conhecidos e marcaram a história francesa. Não é o caso de Luís 15, apesar de seu reinado ter durado quase 59 anos. Mesmo na França, pouco se fala sobre ele.

Apelidado inicialmente de “bem-amado”, ele acabou se tornando muito impopular. A tal ponto que no momento de sua morte, provocada pela varíola, não houve homenagens nacionais e seu caixão teve de ser levado na calada da noite para a Basílica de Saint-Denis, onde estão enterrados os reis franceses, para evitar protestos da população pelo caminho.

A exposição “Luís 15 – Paixões de um Rei” em cartaz no Palácio de Versalhes, permite descobrir quem foi o homem que assumiu a coroa da França aos 5 anos de idade e seu grande interesse pelas ciências que começavam a surgir, em um momento em que emergem na Europa as ideias do Século das Luzes.

A mostra, em cartaz até 19 de fevereiro, foi organizada para celebrar o tricentenário da cerimônia de sua coroação, que marca também o retorno da corte real e do governo ao Palácio de Versalhes.

Há cerca de 400 obras de coleções do mundo todo, várias delas jamais apresentadas na França. Entre as peças raras, uma cômoda que decorava o quarto do rei, considerada uma obra-prima da arte rocaille (rococó) - e que havia deixado Versalhes em 1774, data da morte de Luís 15, hoje pertencente ao museu Wallace Collection, de Londres -, voltou pela primeira vez ao castelo, em mais de 200 anos, para ser apresentada na exposição.

Cômoda considerada uma obra-prima da arte rocaille (rococó) e que havia deixado Versalhes em 1774

Luís 15 nasceu em 1710 e se tornou rei em 1715, aos 5 anos, após a morte de seu bisavô, Luís 14. Coroado na catedral de Reims em 1722, Luís 15 foi o único rei francês que nasceu e morreu no Castelo de Versalhes. A primeira parte da exposição, “o homem privado”, apresenta a infância do rei, sua educação, sua família e suas amantes, a mais célebre madame de Pompadour.

Ele se casou pela primeira vez aos 12 anos com a filha do rei da Espanha, que tinha apenas quatro. Mas como ela ainda demoraria para ter filhos, acabou sendo enviada de volta à Espanha apenas três anos depois.

Considerado tímido e melancólico, Luís 15 preferia a companhia de um círculo restrito de pessoas com quem ele tinha o hábito de jantar. Na exposição há um serviço de jantar de prata de 133 peças, “Berkeley”. Considerado excepcional, ele pertencente a um colecionador privado e está sendo apresentado pela primeira vez ao público. O conjunto foi realizado pelo ourives do rei, Jacques Roëttiers, que teve uma produção pequena e, por isso, suas peças são muito raras.

“Luís 15 é menos conhecido porque se tornou impopular. Seu reinado também foi associado à decadência da França, já que o país não era mais tão próspero em termos econômicos”, disse ao NeoFeed Yves Carlier, um dos curadores da exposição. Seu reinado também coincidiu com o surgimento de uma visão crítica em relação ao exercício do poder, impulsionada pelas ideias do Iluminismo, entre elas a que combatia o absolutismo monárquico.

Além disso, completa Carlier, a vida pessoal de Luís 15 e suas inúmeras amantes também era algo malvisto. Embora muito religioso, provavelmente ele teve tantas relações fora do casamento quanto Luís 14, mas muitas de suas conquistas não faziam parte da aristocracia, o que era menos tolerado. Como mostra a exposição, Luís 15 instalou suas favoritas em casas próximas do castelo, o que contribuiu para alimentar os comentários negativos sobre ele.

Pêndulo de Passemant: monumento científico do século 18

Logo na entrada da mostra há uma obra considerada espetacular: o famoso pêndulo de Passemant adquirido por Luís 15, que deve indicar os anos até 9999 e é tido como um monumento científico do século 18. Foram necessários 35 anos para criar o objeto com sofisticados mecanismos, que apontam desde o movimento dos planetas às fases da lua e ligam o sistema solar aos minutos e segundos.

Aprovado pela Academia Real de Ciências em 1749, ele escapou, por representar o “gênio francês” da época, das vendas realizadas após a Revolução Francesa para equilibrar as contas do Estado. O pêndulo é considerado ainda como uma obra prima da arte rococó, estilo que Luís 15 impulsionou e é ligado ao seu reinado. Ele acaba de ser restaurado com o apoio da Rolex France.

“Na época havia um impulso muito grande às ciências. Luís 15 tinha um espírito científico e encorajou o desenvolvimento dessas disciplinas. Ele financiou ou favoreceu expedições marítimas para medir os meridianos e realizar cartografias”, afirma Carlier.

A segunda parte da exposição, “as paixões do rei”, evoca justamente o grande interesse de Luís 15 pelas ciências, com objetos de tecnologia de ponta na época que pertenciam ao ele, como globos e ainda um raro microscópio de Passement, o mesmo que realizou o pêndulo.

A mostra também revela seu gosto pela botânica, que o fez transformar o Trianon de Versalhes em um jardim de experimentos, além da caça e da arquitetura, a arte que mais o interessava, segundo Carlier.

A mostra reúne objetos de tecnologia que pertenciam ao rei e que eram considerados de ponta na época

“O urbanismo das cidades do interior foi transformado sob o impulso de Luís 15”, ressalta o curador. Durante seu reinado, foram construídos a atual praça da Concórdia (antes da Revolução Francesa era praça Luís XV) e o Panthéon (inicialmente uma igreja), onde estão enterradas as grandes personalidades da França.

A exposição reúne ainda inúmeras peças de arte rocaille (rococó) que pertenciam a Luís 15. A mostra também é uma ocasião para redescobrir os apartamentos de madame du Barry, última favorita do rei, no palácio de Versalhes, que acabaram de ser restaurados especialmente para a mostra. Atribui-se a Luís 15 a frase “depois de mim, o dilúvio”. Na prática veio a Revolução Francesa, 15 anos após sua morte.