A nova corrida espacial é marcada pela disputa (acirradíssima, frise-se) entre a SpaceX, de Elon Musk, e a Blue Origin, de Jeff Bezos. Correndo por fora, na briga por um mercado previsto para movimentar US$ 1 trilhão, em 2040, empreendedores do ecossistema spacetech alimentam sonhos tão ousados quanto os dos bilionários.

Os engenheiros americanos Tim Ellis e Jordan Noone, porém, acrescentaram uma dose extra de intrepidez à ambição de explorar o cosmos. Eles querem chegar à Lua e a Marte com foguetes impressos em 3D.

Colegas de faculdade, na Universidade do Sul da Califórnia, em 2015, eles fundaram a Relativity Space. Com US$ 1,3 bilhão em financiamentos e US$ 4,2 bilhões em valor de mercado, a empresa se propõe a simplificar, agilizar e baratear a fabricação das aeronaves espaciais. E, assim, “construir o futuro multiplanetário da humanidade”, como se lê no site da startup. Audácia pouca é bobagem.

Um pequeno grande salto foi dado em março passado. De Cabo Canaveral, na Flórida, a spacetech lançou seu primeiro protótipo, o Terran 1. Com 33 metros de altura, dois de largura e 85% de sua massa impressa em 3D, no voo teste, o foguete não alcançou a órbita (veja vídeo abaixo). No estágio 2 da missão, o motor perdeu ignição e despencou, antes de alcançar os 200 quilômetros de altura.

Mesmo assim, a missão foi considerada um sucesso por Ellis e Noone. “A viagem inaugural provou que foguetes impressos em 3D são estruturalmente viáveis – inaugurando uma nova era na fabricação aeroespacial”, disseram os fundadores, em comunicado.

O foco agora é o Terran R, uma nave espacial com 66 metros de tamanho. Para tanto, eles deram um outro passo importante. Acabam de firmar um acordo com a Nasa para usar uma bancada de testes subutilizada pela agência espacial americana. Inédita, a parceria público-privada prevê o investimento de US$ 267 milhões, por parte da Relativity Space, no Stennis Space Center, o maior centro de pesquisas em propulsão aeroespacial dos Estados Unidos.

Inaugurado em 1960, na cidade de Bay St. Louis, no estado do Mississipi, o estande A-2 foi construído para testes do programa Apollo – aquele que culminou com o astronauta Neil Armstrong pisando a lua, em 20 de julho de 1969. Há quase 20 anos, a plataforma estava praticamente sem uso. Com a chegada da Relativity Space, ganha função na agenda aeroespacial 4.0.

O Terran R está planejado para ser totalmente reutilizável e transportar até 20 toneladas de materiais para o espaço. Além de lançar satélites ao redor do espaço, o foguete também se prestará como cargueiro, “ponto a ponto entre a Terra, a lua e a Marte”, defendem Ellis e Noone.

As espaçonaves da Relativity Space são construídas na fábrica Wormhole (“Buraco da Minhoca”), na área metropolitana de Los Angeles. Nos quase 93 mil metros quadrados da construção, estão as maiores impressoras 3D em metal do mundo. Trabalhando a uma velocidade de três metros por segundo, a fábrica está projetada para construir 45 espaçonaves do modelo Terran R, por ano.

A impressão 3D já é usada pela indústria aeroespacial, mas apenas para a manufatura de algumas peças – não um foguete inteiro, como propõe a spacetech californiana. Os ganhos são muitos. Uma câmara de combustão leva entre 10 meses e 14 meses. Impressa, fica pronta em poucas semanas. A tecnologia diminui também o número de peças usadas na montagem de um foguete, o que diminui a resistência e o peso e aumenta a estabilidade e carga útil da espaçonave.

impressora 3d gigante
A spacetech californiana pretende construir foguetes inteiros em impressoras 3D gigantes

Além disso, como o artefato sai direto do computador para a impressora, é possível alterar os projetos rapidamente. Nos cálculos da spacetech, graças a essas vantagens, é possível passar diretamente da matéria-prima para um foguete pronto para voar em cerca de dois meses. Ao fim e ao cabo, a economia é de custos.

Conforme o anotado em relatórios da empresa, a Relativity Space já garantiu US$ 1,7 bilhão em contratos para o lançamento de satélites. Em ascensão em um mundo cada vez mais conectado, o mercado global apenas de satélites pequenos deve evoluir de US$ 3 bilhões, em 2022, para US$ 13,2 bilhões, em 2032, segundo a consultoria Spherical Insights.

Antes de fundar a Relativity Space e se lançar no universo dos foguetes impressos, o CEO Ellis, 33 anos, e o CTO Noone, 30 anos, passaram pela Blue Origin e a SpaceX, respectivamente. Se a teoria proposta por eles vai funcionar, só tempo dirá. E não vai demorar muito, não. O Terran R está previsto para ser lançado já em 2026.