Dentro e fora de cena, ela esteve em guerra. E, apesar de ter enfrentado uma legião disposta a tudo na ficção, veio a descobrir que seu pior inimigo não estava no roteiro.
Enquanto encarnava a todo-poderosa Daenerys Targaryen, a mãe dos dragões na premiada série Game of Thrones, da HBO, Emilia Clarke tinha que lutar, nos bastidores, pela própria vida – a atriz sofreu não apenas um, mas dois aneurismas. O primeiro deles foi logo ao final da primeira temporada do programa de TV.
O que ela não imaginava, contudo, é que, de certa forma, as batalhas tinham suas semelhanças: em ambas, a arma mais poderosa que poderia contar era a resiliência.
No palco do Dreamforce 2019, evento organizado pela Salesforce, em São Francisco, a artista, hoje com 33 anos, narrou sua tragédia pessoal, cujo ápice foi esquecer o próprio nome depois de uma cirurgia cerebral de três horas.
A condição de amnésia era seu seu pior pesadelo, porque impactaria diretamente sua carreira – e ser atriz era seu propósito de vida. "Nos momentos mais sombrios, eu queria desligar tudo. Cheguei a pensar em pedir para morrer. Meu trabalho era o meu grande sonho de vida e, sem isso, eu estava perdida", revelou em entrevista à revista Harpers Bazaar.
Tamanha dificuldade pode ser superada apenas pela resiliência. "Fui criada para nunca dizer 'coitada de mim'. Sou uma pessoa patologicamente esperançosa. Tanto que, quando as horas mais difíceis chegaram, não lutar sequer era uma opção. E essa lutadora que há em mim é provavelmente onde está também a minha força", afirmou Emilia, no palco do evento da Salesforce.
Na plateia, empresários, executivos e profissionais de todas as áreas ouviam atentos às palavras da atriz, sem perceber, talvez, que o maior aprendizado de Emilia Clarke nos bastidores de Game of Thrones pode ser o "segredo do sucesso" que tanto buscam para suas empresas e projetos.
No livro "Como Funciona a Resiliência", a escritora Diane Coutu explica que as pessoas resilientes têm três características: a aceitação absoluta da realidade, uma crença profunda de que a vida tem sentido e a habilidade inata de improvisar. "Você pode superar alguns desafios usando uma ou duas dessas características, mas a resiliência só vem com essa trinca", explicou a autora à Harvard Business Review.
Felizmente, resiliência é algo que se pode aprender e ensinar. O professor de psicologia da Universidade da Pensilvânia, Martin Seligman, detalha sua teoria na obra "Construindo Resiliência", usando como exemplo um programa do exército americano que ajuda ex-soldados a superarem os seus traumas revivendo seus obstáculos sob um prisma mais positivo, de aprendizado ou de autoconhecimento.
Foi basicamente isso que fez, intuitivamente, Emilia Clarke. A atriz em nenhum momento entrou em estado de negação de sua condição física. Com acompanhamento médico recorrente, ponderou a opinião e os cuidados dos melhores especialistas para continuar gravando o seriado enquanto zelava por sua saúde.
Depois, ela adotou uma postura flexível, mudando dieta e hábitos para lidar com os desafios de forma segura e sadia. E, com todas as lições que foi, de certa forma, obrigada a aprender, ela criou, em maio de 2019, a fundação Same You, focada na conscientização de problemas neurológicos, sobretudo entre jovens adultos.
Além de trazer o tema para a pauta de grandes veículos, a organização promove e apoia pesquisas relacionados à questão, bem como oferece auxílio aqueles que estão reconstruindo suas vidas e carreiras depois de enfrentar um aneurisma.
Tantos ganhos na esfera pessoal são, obviamente, refletidos no ambiente profissional. Uma pesquisa conduzida pela consultoria BetterUp mostrou que indivíduos que demonstram baixa resiliência são quatro vezes mais suscetíveis à síndrome do burnout, também conhecida como síndrome do esgotamento.
A resiliência, portanto, é quase um antídoto natural contra o estresse, a principal causa de afastamento e insatisfação profissional. O Instituto Americano de Stress conduziu uma análise que mostrou que 75% das pessoas acreditam que funcionários hoje são mais estressados do que os da geração passada, enquanto 40% dos entrevistados descreveram suas atividades laborais como muito ou extremamente estressante.
"Fui criada para nunca dizer 'coitada de mim'. Sou uma pessoa patologicamente esperançosa", diz Emilia Clarke
Mais do que criar um ambiente saudável de trabalho, promover a resiliência entre times e líderes é uma forma de garantir a própria sobrevivência da empresa. "A agilidade organizacional está altamente correlacionada com a resiliência corporativa. São fatores que aumentam a competitividade e a lucratividade das organizações, mesmo sob condições altamente perturbadoras", lê-se na conclusão do relatório da BetterUp.
Apesar das palavras bonitas, a prática nem sempre é tão fácil como a teoria – e Emilia Clarke pontuou muito bem isso. "Quando você quebra uma perna, pelo menos sabe exatamente o que precisa tratar. Mas quando falamos da mente, que cuida de tudo, não há sequer uma parte que possa ser deixada de lado. É assustador", disse.
Tal qual a mãe dos dragões, líderes e empresas precisam aprender a encarar os fatos, abraçar o propósito e se manter flexível às mudanças, que são inevitáveis. No final das contas, todo mundo tem seu próprio "trono de ferro" particular, que pode ser o domínio de um mercado, uma nova carreira, uma promoção, um desafio familiar ou, como no caso de Emilia, a própria vida.
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