"É preciso se acostumar às grandes emoções quem se destina às grandes aventuras" – a frase extraída do romance "As Relações Perigosas", de Chordelos de Laclos, fala sobre amor, mas poderia muito bem ser aplicada sem retoques à adrenalina que os investidores do Snapchat sentiram – e talvez ainda sintam.
A empresa fundada por Evan Spiegel em 2011 vive uma verdadeira montanha russa na bolsa de valores. Em setembro de 2018 atingiu sua mínima histórica. Suas ações eram negociadas abaixo de US$ 6, um valor 60% menor do que o da estreia da companhia na bolsa, há mais de dois anos.
A rede social que se notabilizou por vídeos efêmeros e conquistou a preferência dos jovens americanos sofreu ataques de todos os lados desde que abriu o capital. Em especial do Instagram, do Facebook, que lançou recursos semelhantes aos do aplicativo de Spiegel.
Mas nada está tão ruim que não possa piorar. Em abril deste ano, o jornal britânico Financial Times fez uma análise dos números do Snap e chegou a uma conclusão terrível. Se continuar a queimar caixa na mesma velocidade desde o IPO, a rede social cujo símbolo é um fantasminha ficará sem dinheiro em três anos.
É uma corrida contra o tempo para reduzir custos e ser lucrativa. Desde que abriu o capital, o Snap nunca deu lucro. São 17 trimestres consecutivos de prejuízo. O mais recente foi de US$ US$ 310 milhões, no primeiro trimestre de 2019.
Mas nem só de más notícias vive o Snap. Depois de um longo tempo de estagnação, a base de usuários que acessa diariamente o aplicativo cresceu. Chegou a 190 milhões de pessoas por dia no primeiro trimestre deste ano, uma alta de 2%. Atualmente, o aplicativo atinge 90% de jovens entre 13 anos e 24 anos. Apesar de operar no vermelho, o faturamento cresceu, atingindo US$ 320,4 milhões, uma alta de 39%.
Esse desempenho se refletiu no valor das ações e na expectativa dos analistas de Wall Street. Hoje, a rede social está avaliada em US$ 18,7 bilhões. Suas ações estão sendo vendidas na faixa US$ 14, num crescimento constante desde que atingiu seu "fundo do poço" no ano passado.
Embora ainda esteja distante da máxima histórica de US$ 27 por ação, alcançados em março de 2017, logo após a abertura de capital, o Snapchat tem dado duro para reconquistar a confiança dos investidores, sobretudo depois do desligamento do diretor de estratégia, Imran Khan, e na contratação de Tim Stone, ex-Amazon, para comandar as finanças da empresa, em setembro do ano passado.
"Os investidores não estavam muito impressionados com o desempenho de Khan", disse ao NeoFeed Michael Pachter, analista da consultoria de investimentos e serviços financeiros Wedbush, o único a manter a indicação de compra no período mais sombrio da gigante tecnológica.
A aposta certeira, contudo, não evitou que Pachter rebaixasse o status do Snapchat, levando a empresa de "acima da média" para neutra – a previsão para 12 meses, contudo, segue intacta nos US$ 12,25. "A companhia tem tomado várias medidas para melhorar o aplicativo, promover o engajamento dos usuários e se aproximar de anunciantes e, apesar das últimas expectativas, seguimos confiantes que o Snapchat vai superar essa fase crítica", escreveu Pachter, em seu último relatório sobre a empresa.
Se continuar a queimar caixa na velocidade atual, o Snapchat pode ficar sem dinheiro em três anos
De fato, a recente (e esperada) repaginada que o app ganhou em sua versão Android agradou aos analistas de Wall Street, tanto que o banco de investimento JP Morgan "promoveu" a empresa de "enfraquecida" para "neutra". Mais: subiu sua projeção de US$ 7 para US$ 11.
"O Snapchat tem muitas possibilidades de mercado, tem uma base de usuários engajados e um sólido histórico de inovação. A empresa tem mais vias de monetização pela frente e provavelmente será capaz de crescer”, afirmou Dough Anmuth, analista da JP Morgan, ao NeoFeed. “Embora reconheça o quão competitivo é disputar pela atenção do usuário e por publicidade, achamos que o Snap cresceu operacionalmente mais forte e mais disciplinado."
Além da repaginada na versão Android de seu aplicativo e a aproximação com os anunciantes, o Snap mantém a sua força com as chamadas "máscaras", aquelas animações em realidade virtual que os usuários escolhem (ou não) usar nas redes socias para mostrar que o fantasminha assusta, mas não desaparece (e até sorri).