Eduardo Tracanella, o homem que trabalhou no Itaú por mais de duas décadas e que nos últimos três anos comandou seu marketing, está volta. Desde a sua saída do banco, em que foi desligado devido ao mau uso do cartão corporativo, ele permaneceu submerso, calado. Agora, retorna ao mercado em voo solo como empreendedor.

Ele acaba de lançar a consultoria al.in, união das iniciais de alma e inteligência. “Durante toda a minha carreira, eu tive uma crença que as marcas fortes são resultantes de uma combinação entre alma e inteligência”, diz Tracanella com exclusividade ao NeoFeed. “Entre atributos mais racionais e emocionais.”

A ideia de Tracanella, agora empreendedor, é colocar a serviço de outras marcas tudo o que ele desenvolveu e aplicou na construção de branding do Itaú. “A gente vê hoje pequenas, médias e marcas gigantes conseguindo se diferenciar porque conseguem construir uma conexão com as pessoas. Não é somente sobre o produto, mas é sobre identificação”, afirma.

Tracanella afirma que a consultoria é fruto de diversas conversas que teve com vários players do mercado como CMOs, CEOs, donos de agências de publicidade e líderes de veículos de comunicação. “E a resposta que obtive foi que, sim, existe um espaço para alguém que se propõe a potencializar e reenergizar marcas.”

A al.in já está trabalhando com duas marcas cujos nomes Tracanela prefere manter em sigilo, mas atuam nos ramos de tecnologia e de mídia. Em todas elas, ele pretende aplicar uma metodologia que desenvolveu ao longo dos anos que combina branding, criatividade e conteúdo.

Essa metodologia engloba o que ele chama de Six Cs. Isso inclui cultura, o quanto a marca tem de relevância cultural; curadoria, quais as melhores escolhas a se fazer para a marca; calor, a conexão emocional; craft, o bom design de produto e de expressão; consistência e, por último, coragem de assumir riscos.

Tracanella explica que, em alguns casos, vai trabalhar com CEOs e fundadores de empresas grandes, mas que não têm marcas estabelecidas; em outros casos, vai atuar ao lado de CMOs de empresas que têm marcas já consolidadas.

Outra frente que ele pretende abrir é junto a fundos de venture capital e private equity para levar valor para as marcas das empresas dos portfólios dos investidores. E disso ele entende. Afinal, ajudou a construir a marca mais valiosa do Brasil. “Pretendo atuar em médias a grandes empresas de todos os segmentos”, diz Tracanella.

A estrutura da al.in será asset light, plugando tarimbados profissionais por projeto. Num primeiro momento, o plano é ter, no máximo, entre e oito e dez clientes. “Eu quero estar à frente de todos os projetos”, afirma Tracanella, que recebeu convites de sociedade de grandes grupos, mas preferiu seguir solo.

Indagado sobre o que falta hoje às marcas em geral, Tracanella diz que “há certa racionalização no processo criativo das marcas e isso faz com que todas se pareçam muito, com estratégias muito parecidas”. Isso, explica, acontece por estarem sendo guiadas essencialmente por dados e algoritmos – o que deve aumentar com a IA generativa.

A criação da sua própria marca é fruto de um processo de autorreflexão que Tracanella diz ser um “download de toda a sua carreira”. “Precisei fazer um trabalho realmente autobiográfico, para ver o que me trouxe até aqui, onde acertei e onde errei”.

Diante disso, cabem algumas perguntas que tomaram conta de todo o mercado no anúncio de saída de Tracanella do Itaú. O que, de fato, aconteceu? “Foi uma questão essencialmente operacional e administrativa. Não teve um uso do cartão para benefício próprio, não teve uso do cartão para alguma compra vultuosa. Foram coisas cotidianas e foi um momento em que acabei me atrapalhando e não fazendo o ressarcimento”, diz Tracanella.

Perguntado se houve algo além disso, ele reforça a questão operacional e diz que se tivesse acontecido algo a mais o caso teria se estendido – o que não ocorreu. “A minha saída acabou tendo uma repercussão que me surpreendeu. Se tratava de um tema operacional e específico que ganhou uma visibilidade desproporcional. Saiu da esfera pessoal para a pública.”

Estrela do marketing, até então dono da cadeira mais poderosa e cobiçada do setor, ele diz que os holofotes sobre a sua saída afetaram-no pessoalmente e que não tinha se pronunciado sobre o caso “para não alimentar polêmicas e pelo respeito e pela relação que construí ao longo do tempo com a companhia e com as pessoas.”

“É uma jornada longa, é uma história muito longa, é uma relação que deu muito certo. Então, por respeito a isso, eu achei que não valia a pena alimentar” afirma. E prossegue. “O que eu posso te dizer é que ficou para trás. Eu continuo muito orgulhoso da jornada que eu construí no Itaú. É uma empresa espetacular, com pessoas incríveis.”

Uma das principais lições do caso, explica Tracanella, é que “o tempo tem uma beleza incrível”. “Você tem a oportunidade de ver pessoas pulando do barco e você tem a oportunidade de ver a beleza que é as pessoas subirem no barco com você. Isso faz com que a vida fique mais leve porque você sabe com quem você pode contar e, ao mesmo tempo, as pessoas podem contar mais com você quando não carrega o nome corporativo.”