Gênios normalmente são chatos. E isso é longe do que o Washington era.

Prefiro chamá-lo de ícone.

O gênio é craque em uma coisa, por sua total habilidade única e pessoal.

Já os ícones são maiores do que suas realizações. Eles influenciam a cultura popular, inspiram mudanças e estabelecem transformações que ficarão marcadas no tempo.

Gênios passam, ícones não.

Washington era vários em um.

Sabia de tudo, tudo. Era amigo de todos, dos artistas, dos garçons, dos vendedores de loja, dos donos de quiosques, dos presidentes, de todo mundo que gostasse de contar ou ouvir uma boa história.

Empresário global, autor bestseller, letra de música, marido da Patrícia, pai do Homero, Antônia e Theo, empreendedor, mentor, colecionador, investidor, lenda viva sem nunca deixar de se apresentar orgulhosamente como publicitário.

E, como publicitário, criou um novo modelo para a publicidade nacional, agora não mais enlatada e importada da Madison Avenue, e sim com narrativas que apelavam ao imaginário coletivo e ao tom do humor verde e amarelo. Passamos até orgulho do que falávamos.

Foi a consagração da brasilidade na publicidade igual a importância da Tarsila do Amaral na pintura. Ambos usando suas linguagens para criar algo que fosse genuinamente brasileiro e inovador.

Muitas de suas campanhas publicitárias ultrapassaram o contexto comercial e se tornaram parte da memória cultural do país. Ele criou um estilo de comunicação que reflete e exalta o cotidiano e o modo de ser brasileiro, influenciando tanto a publicidade quanto a percepção popular do que é ser brasileiro.

De gringo, o Washington só tinha o nome. Era só mais corintiano do que brasileiro.

Contava e encantava o Brasil nas suas campanhas só falando do Brasil.

De Pelé, Gisele, Sebastião Salgado, Arnaldo Antunes, Gil, Fernanda até o gari Sorriso. Todos passaram pela sua Olivetti.

Suas ideias sempre dialogaram com comportamentos exclusivamente brasileiros e por isso, se tornaram parte da cultura popular. A nossa propaganda passou a disputar com a resenha do futebol as mesas dos bares.

Quem não se lembra do primeiro sutiã, do cachorrinho da Cofap, do garoto Bombril e tantos outros?

Jorge Ben Jor se referia a ele como o maior criador de hits da nossa história. Era ainda pouco para esse ícone.

Sabia de tudo e tinha uma história para todos. Falavam com linguagem nobre e era celebrado por um país ainda pobre.

Nunca aceitou o Brasil colônia, defendia um Brasil Global.

Valorizava a Sorveteria da Ribeira tanto quanto a Gelateria del Porto, em Antibes, da carne do Rodeio como o foie gras da La Ferme au Foie Gras.

Com todo seu sucesso, poderia ter receio de se expor, como tantos fazem. Mas ficar em cima do muro nunca foi sua opção. Sempre usou seu poder de influência para escancarar sua opinião, provocar reflexões. Uma raridade para alguém do seu tamanho.

Fez parte da democracia corinthiana e era crítico voraz do momento atual do Brasil e da propaganda. O amor por ambos não permitia aceitar a mediocridade.

A propaganda nunca conseguiu agradecer o suficiente tudo o que você fez por ela.

Sem ele não teríamos a Camila, o Nizan, o Marcello Serpa, Fabinho Fernandes, Loducca, Rynaldo, Ricardo Freire, Tetê, Branquinho que trabalharam ou se inspiraram nas suas andanças.

Fizemos, uma vez, um tour juntos que se chamava os 6 tenores: ele, o Nizan, o Sergio Valente, Sergio amado, o Zé Victor Oliva e eu.

Cheguei mais cedo e vi uma senhora sentada com a filha segurando um cartaz que dizia: “seu Uochintom vim aqui só para te ver.”

Obrigado “seu Uochintom”, eu também vim aqui só para te ver.

*Sérgio Gordilho é publicitário, sócio e co-presidente da agência África Creative