A descarbonização da indústria minerária está intrinsecamente associada à sustentabilidade de sua logística. E, graças aos avanços das tecnologias emergentes, é possível não só reduzir as emissões de gases de efeito estufa (GEE), como tornar as operações mais eficientes e seguras.

Uma das grandes novidades do ecossistema de inovação minerária está ancorado no Porto de Tubarão, em Vitória, no Espírito Santo. Vindo da China, o navio Sohar Max chegou ao Brasil movido pela força do vento.

Com 362 metros de comprimento e capacidade para 400 mil toneladas de carga, a embarcação é fruto da parceria entre a Vale e a armadora Asyad, de Omã — a maior do mundo de propulsão eólica, segundo a mineradora.

Com um investimento de US$ 13 milhões, a companhia equipou o Sohar Max com cinco rotores cilíndricos, de 35 metros de altura e 5 metros de diâmetro, cada um. As velas permitem ganhos de eficiência de até 6% e uma redução anual de cerca de 3 mil toneladas de CO², o equivalente ao plantio de 21.500 árvores.

“A primeira viagem superou essa estimativa, mas, para uma medição mais correta, precisamos avaliar o desempenho da tecnologia ao longo das viagens por pelo menos um ano”, diz Rodrigo Bermelho, diretor de navegação da Vale, em entrevista ao NeoFeed.

“A empresa tem uma tradição de inovação na navegação, que remonta a décadas, com a construção do Porto de Tubarão [inaugurado em 1966] e a utilização de capesizes [grandes embarcações cargueiras]”, complementa.

Com contratos de afretamento com cerca de 200 navios, a empresa prevê ampliar o uso de energia eólica para pelo menos 40% de sua frota nos próximos anos, sem especificar o período. O objetivo é alinhar a companhia às metas da Organização Marítima Internacional (IMO) de zerar as emissões líquidas no segmento marítimo até 2050.

“As mineradoras estão olhando com bastante atenção para a necessidade de se encontrar iniciativas mais sustentáveis na logística”, diz Paulo Assis, professor titular do departamento de engenharia metalúrgica e de materiais da Universidade Federal de Ouro Preto (Ufop), em conversa com o NeoFeed. “Temos sido muito procurados por algumas empresas para desenvolver pesquisas e projetos justamente sobre esse tema.”

Um dos estudos em andamento na Ufop visa reduzir a pegada de carbono no transporte rodoviário, com o desenvolvimento de um concreto asfáltico ecológico, à base de resíduos do processamento do minério de ferro. A ideia inicial é oferecer o material para que as mineradoras possam utilizá-lo em suas áreas internas, mas ele pode substituir parte de uma estrada comum.

Além de ter mais durabilidade e ser mais barato em relação ao asfalto comum, o concreto ecológico pode garantir mais segurança, por causa da porosidade do material. “Os resíduos do minério podem ajudar a reduzir em até 50% o uso de cimento em uma via”, explicar Assis. “Além disso, essa iniciativa pode ajudar a gerar crédito de carbono para a mineradora.”

Algumas iniciativas envolvem a eletrificação da frota de veículos e trens usados para o escoamento dos produtos da mineração. Outras focam no uso de biocombustíveis e de hidrogênio como fontes de energia.

Há ainda projetos para a automação dos caminhões fora de estrada. Guiados à distância, os veículos inteligentes reduzem as perdas de produção em cerca de 20% e os custos operacionais com manutenção em, aproximadamente, 10%.

Apesar do entusiasmo em torno das novas tecnologias, ainda há um longo caminho para a descarbonização completa da logística da mineração. Mas, ao que tudo indica, a rota está traçada.

Logística, mineração e transição energética

Com a urgência da transição energética e a crescente demanda por minerais críticos, a logística é cada vez mais estratégica na mineração. Da prospecção e exploração à chegada dos produtos lavrados a seus destinos finais, o deslocamento de materiais está presente em todas as etapas da cadeia mineral.

E, dada a importância da mineração rumo a um futuro mais sustentável, produtivo e resiliente às mudanças climáticas, os meios de transporte usados pela indústria minerária têm impacto direto na transição energética global.

Um dos focos das inovações logísticas está nos caminhões fora de estrada, imprescindíveis para o trabalho nas minas

Para se ter ideia da importância da logística da mineração, basta dar uma olhada nas projeções de crescimento do mercado mundial para os próximos anos.

Avaliado em US$ 33,4 bilhões, em 2024, o setor deve movimentar US$ 38,3 bilhões no próximo ano até atingir US$ 133,8 bilhões, em 2034, segundo relatório da consultoria Precedence Research. Ao longo da próxima década, a taxa de crescimento anual composta está prevista em quase 15%.

“O crescimento pode ser atribuído ao aumento na procura por metais e minerais, expansão das atividades de mineração em áreas remotas e avanços tecnológicos”, diz relatório da empresa de análise de mercado Grand View Research.

“Países como China, Índia e Brasil estão testemunhando uma rápida industrialização e urbanização, levando ao aumento do consumo de matérias-primas. Isso, por sua vez, está impulsionando a demanda por soluções logísticas eficientes para transportar esses materiais das minas para as plantas de processamento e usuários finais.”

Dentro das minas, os materiais lavrados circulam nos gigantescos caminhões fora de estrada, capazes de carregar até 300 toneladas de produto, nas correias transportadoras e nos minerodutos. Fora delas, os modelos de transporte mais utilizados são o rodoviário e o ferroviário — a mineração, aliás, é a principal “passageira” dos trens de carga no Brasil. Já as movimentações portuárias e marítimas são cruciais para as exportações.

Entre os modais utilizados no transporte de cargas no Brasil, segundo a Fundação Dom Cabral (FDC), o sistema rodoviário representa 62,2%. No minério de ferro, no entanto, de acordo com o levantamento, o meio logístico mais utilizado é o ferroviário, com 83,6%.

No Brasil, a atividade é tão essencial quanto desafiadora. Um dos estudos mais recentes da FDC sobre os custos com logística no país coloca a mineração na liderança do ranking das indústrias que mais gastam com transporte.

Enquanto a média nacional gira em torno de 12,4% do faturamento bruto das companhias, entre as mineradoras, esse índice chega a 26,1%, como mostra o levantamento realizado com 130 das maiores companhias brasileiras, de 14 setores da economia.