O executivo Alexandre Abreu assumiu a presidência do Banco Original, em janeiro, com a missão de promover uma revolução – praticamente uma refundação da instituição financeira. As mudanças têm mexido tanto na cultura como na estrutura do banco.
Abreu, ex-presidente do Banco do Brasil, trouxe para o time o executivo Raul Moreira, que era CEO da Alelo, a empresa de benefícios do grupo Elopar, para comandar a diretoria executiva de tecnologia, inovação e operações.
A meta de Moreira é implementar no banco o modo fintech de desenvolver produtos. “Conseguimos reduzir o tempo de lançamento de produtos de 12 meses para três meses”, diz Abreu. Raul Moreira faz coro. “Acabamos de criar uma empresa de tecnologia para desenvolver tudo internamente”, diz ele.
Nesta entrevista, os dois executivos falam sobre a estratégia de crescimento do banco e a ambiciosa meta de atingir 10 milhões de contas até 2022. Hoje são 1,3 milhão e até o fim do ano a expectativa é a de que sejam 2,5 milhões.
O objetivo é que o banco seja cada vez mais tech, mas sem deixar de lado a presença física. Abreu revela com exclusividade ao NeoFeed que o Original abrirá uma rede de espaços para atender os clientes que querem ver a “cara” do banco. “Queremos ter entre 20 e 30 espaços espalhados pelo Brasil”, diz ele. Acompanhe:
O Banco Original está passando praticamente por uma refundação. Como tem sido essa virada de chave?
Alexandre Abreu: Desde que cheguei, encontrei duas questões para serem tratadas. Uma era a operação de banco digital para pessoas físicas, que precisava de ajustes. A segunda preocupação era definir um escopo de atuação mais amplo. O Original poderia aproveitar o investimento que já tinha sido feito no banco digital para dar um escopo maior à operação do que só atuar no segmento de consumidor bancário. Então, refinamos o modelo de crédito. Esse é um dos principais fatores críticos de sucesso de uma operação digital porque o modelo de crédito é diferente do modelo adotado por um banco tradicional. Hoje estamos com um modelo bem interessante.
Raul Moreira: Mudamos a análise de crédito, que era feita com base em informações de renda, para uma estratégia de crédito pré-aprovado. Antes, pedia-se comprovante de renda e uma série de dados de análise cadastral. Agora, passamos a adotar uma estrutura com integração de bureaus e desenvolvemos uma metodologia de crédito pré-aprovado com renda presumida. Hoje nem pedimos informações de renda dos clientes.
Quais outras mudanças foram implementadas?
Abreu: Internalizamos a tecnologia. Antes, tínhamos muitos processos terceirizados. Fizemos um ajuste para trazer a tecnologia para dentro e adotamos a metodologia Agile para a construção dos produtos. Isso deu mais velocidade para os nossos lançamentos.
O banco então trouxe desenvolvedores de software para dentro?
Moreira: Isso mesmo. Trouxemos 30 desenvolvedores e vamos chegar a 90 desenvolvedores no primeiro trimestre do ano que vem. Criamos uma empresa de tecnologia chamada Original APP. Essa empresa será o grande suporte da tecnologia do Original tanto para a melhoria de prestação de serviço para o próprio banco, como para auxiliar na implementação do open banking com outras instituições. Ou seja, trabalhará para o banco e para as fintechs que fizermos convênio. E, além dessa empresa de tecnologia, criamos também o Original Labs, que é o ambiente onde recebemos as empresas parceiras com toda a estrutura de pessoas e relacionamento de fornecedores.
"Trouxemos 30 desenvolvedores e vamos chegar a 90 desenvolvedores no primeiro trimestre do ano que vem", diz Raul Moreira
Em termos tecnológicos, o que muda para o cliente?
Abreu: A primeira questão que trabalhamos muito foi o “time to market”. Ter velocidade para lançar os produtos. Tínhamos ideias boas, mas demorávamos para pôr os produtos no ar. Agora, conseguimos acelerar o lançamento. Haja visto a nossa conta de pagamentos que foi lançada na segunda quinzena de abril. Ela começou a ser pensada em dezembro.
E, antes de ter a equipe própria de desenvolvedores, quanto tempo levava?
Abreu: Demorávamos, no mínimo, um ano para lançar um produto. É só olhar, por exemplo, a conta de pessoa jurídica. Começamos a pensar nela em janeiro e ela já está no ar.
Moreira: O tempo de lançamento de um produto caiu de um ano para três meses. A maioria das coisas tem sido assim. De 12 meses para três meses. A mudança de crédito pré-aprovado aconteceu em dois meses e isso só foi possível por conta da tecnologia.
O que mais mudou no banco?
Abreu: Mudou a cultura também. E tem outra coisa, o Banco Original tem um diferencial em relação aos outros bancos digitais que são os agentes digitais. São agentes autônomos, pessoas que temos contrato de remuneração baseada em desempenho. São centenas de pessoas espalhadas pelo País. Temos 903 agentes contratados e 700 trabalhando. Duzentos estão em treinamento. Pretendemos chegar a 1,5 mil agentes até o fim do ano, mas acredito que devemos antecipar esse número até setembro ou outubro.
"Pretendemos chegar a 1,5 mil agentes até o fim do ano, mas acredito que devemos antecipar esse número até setembro ou outubro", diz Alexandre Abreu
O que esses agentes vendem?
Abreu: Eles vendem tudo. Eles são uma espécie de consultores dos clientes. Eles indicam fundo de investimento, o mais arriscado, o menos arriscado; se é melhor ou pior tomar empréstimo... Enfim, eles fornecem uma orientação financeira completa baseada nos produtos que temos.
Como funciona essa remuneração baseada em desempenho?
Abreu: Pago um percentual da rentabilidade da carteira. Os agentes são voltados 100% para o varejo, tanto pessoa física como o empresário individual. O mesmo agente financeiro vai atuar de forma conjunta, atendendo o mesmo cliente que tem conta nas pessoas física e jurídica.
Hoje há uma guerra dos bancos digitais pelos clientes. Vários foram criados nos últimos anos e até os grandes bancos lançaram seus bancos digitais. Por que o microempreendedor escolheria o Original?
Abreu: Primeiro, porque temos um bom produto. Um produto que você pode, com o mesmo login, estar nas contas física e jurídica. Isso é muito importante. Além disso, fizemos uma parceria com a Cielo para oferecer a maquininha. E o pagamento da máquina não existe, já está no pacote de serviços do nosso cliente.
O banco tem conseguido captar esse cliente?
Abreu: Sim, e um ponto fundamental nisso também é o nosso marketing digital. Quando cheguei aqui, em agosto de 2018, abríamos na faixa de 15 mil contas por mês. Antes de lançar a conta digital, já estávamos em 50 mil por mês. Hoje, estamos em 100 mil por mês e, em maio, foram quase 380 mil contas por mês. Saímos do marketing analógico para o marketing digital, de performance. Estamos chegando a 10 mil contas abertas por dia. O Luciano Formozo (diretor de marketing do banco) é o cabeça disso aí.
O crescimento traz dores de cabeça também. O banco está conseguindo atender esses clientes?
Moreira: Essa parte de atendimento foi totalmente reformulada. Fizemos uma revisão da estratégia de gestão da nossa central para transformá-la em mais digital possível. Hoje, 72% do nosso atendimento já acontece via chatbot.
Abreu: Todos os dias recebo uma informação de como está o nível de atendimento. O tempo médio de espera é de 1 minuto. A gente vem reduzindo mês a mês e vamos reduzir mais.
Vocês acompanham isso?
Abreu: Quando eu era gestor de banco tradicional (Alexandre Abreu foi presidente do Banco do Brasil), visitava muito as agências. Ia lá, conversava com o gerente, com o cliente, via a fila. Aqui não tem isso. Como eu faço? Tenho um fone de ouvido na minha mesa e todo dia separo um tempo para ouvir o call center.
"Todo dia separo um tempo para ouvir o call center", diz Alexandre Abreu
E o que faz com isso?
Abreu: Primeiro percebo se tem um processo com algum problema. Se eu escuto uma, duas, três, quatro vezes um processo como, por exemplo, dificuldade na entrega de cartão, peço para darem uma olhada. Vejo também a postura do atendente. Eu mesmo dou nota e chamo os melhores para almoçar comigo. É uma forma de eu saber tudo o que está acontecendo com o cliente. Percebo também que tem muito cliente que nunca teve conta bancária e agora está tendo. Tem muita inclusão aí. Um banco digital tem essa facilidade. Com o celular, a pessoa consegue se relacionar com o banco. Tem gente que tem medo de entrar em uma agência bancária, com porta-giratória, de ser barrado...
Mas, ao mesmo tempo, há um público que gosta de ter a agência e ser atendido por uma pessoa. Como resolver isso?
Abreu: Alugamos espaços em algumas capitais onde o agente financeiro recebe os clientes, aperta a mão, olha no olho. Mostramos a nossa marca e as pessoas que trabalham no banco em lugares que não são agências, mas espaços. Temos um espaço na Avenida Faria Lima, em São Paulo; outro em Ipanema, no Rio de Janeiro; estamos abrindo em Campinas, interior de São Paulo; em Belo Horizonte, em Minas Gerais; e vamos abrir em outras capitais. A minha ideia é ter entre 20 e 30 espaços espalhados pelo Brasil. O cliente precisa mesmo ver. Outro dia escutei uma ligação de um cliente no call center e ele dizia ‘estou achando legal o banco, mas estou com medo de depositar dinheiro porque não vejo o banco’. A atendente foi bem e explicou que somos um banco digital, regulamentado pelo Banco Central e a cliente ficou satisfeita. Mas você vê a necessidade das pessoas de ver o banco físico.
O Original é um banco e está ganhando cara de fintech. E as fintechs querem virar banco. O que é mais difícil?
Abreu: A fintech tem condição de ser boa em um determinado serviço. Mas acho mais difícil uma fintech ter uma gama de serviços, ser completa. Posso te dar o nosso exemplo aqui, o caso da PicPay, da qual somos sócios. Ninguém faz um trabalho melhor do que ela em carteira digital, a experiência é muito agradável.
O Original pretende comprar outras fintechs?
Abreu: Pretendo fazer parcerias com várias outras. Participação acionária não está nos planos, mas, se surgir uma boa oportunidade, não está descartada. O objetivo não é fazer aquisições, mas sim parcerias.
Que tipo de parcerias?
Moreira: É o open banking na essência, abrir a nossa plataforma para trabalhar com outras empresas.
Qual vai ser o impacto do open banking?
Moreira: A diretoria do Banco Central determinou que os bancos dos grupos S1 e S2, bancos maiores que fazem parte de grupos com riscos sistêmicos, serão obrigados a aderir ao open banking. Nós somos do S3 e, mesmo não sendo obrigados, vamos aderir às regras do open banking. O reflexo disso é que vai em linha com a nossa estratégia. A nossa plataforma já foi desenvolvida baseada em serviços, as chamadas APIs, que permite que entidades externas se conectem com essas nossas aplicações e possam consumir serviços. É aí que entra a nossa estratégia de open banking. Não só consumir e ceder serviços de outros bancos, como trabalhar diretamente com as fintechs. As fintechs poderão beber da nossa fonte. Vamos prover serviços de criação de contas digitais para elas.
Na prática, como isso vai funcionar?
Moreira: Se a fintech precisar de um banco por trás que tenha conta digital, interligação com o SPB (Sistema de Pagamentos Brasileiro), com a rede de banco 24 horas, que faça a custódia e todo o compliance, nós ofereceremos tudo isso.
Então uma fintech poderá criar o serviço de conta corrente, mas o serviço por trás é do Banco Original?
Moreira: Sim, toda parte de checagem de lavagem de dinheiro, checagem de fraude, de custódia do dinheiro, a criação de conta, a concessão de crédito digital, será o Banco Original por trás.
O banco já está negociando com alguma fintech?
Moreira: A própria PicPay nasce assim. Ela foi reformulada a partir disso. Toda a parte de backoffice, de concessão de crédito, de integração de ATMs e SPB é o Banco Original que está por trás. E estamos conversando com outros players. Um grande player de e-commerce pretende criar uma conta digital, uma carteira digital, e nós seremos o banco por trás disso. Estamos abrindo a nossa plataforma para as fintechs para dar capacidade de competição para as próprias fintechs. Por isso que criamos o Original Labs, para atender as fintechs e para que elas conheçam as nossas APIs.
"Um grande player de e-commerce pretende criar uma conta digital, uma carteira digital, e nós seremos o banco por trás disso", diz Raul Moreira
São mudanças enormes para todo o setor...
Abreu: É importante dizer que, por trás do open banking há uma filosofia que é a seguinte. Não quero nunca que o cliente fique amarrado aqui por outras questões que não seja a vontade dele. Esse modelo, de reter o cliente baseado em conexões que ele tem dificuldade de se desfazer, está caindo com o open banking. Aqui no Original toda a estratégia tem esse princípio. Vou te dar um exemplo prático. Você gostou do meu cartão, achou legal, tem cash back, tem um limite bom e está satisfeito, ok? Mas você tem uma conta no banco A e você gosta de ter a conta no Banco A. Zero de problema. Se o banco A topar, e o open banking deve permitir isso, debita a minha fatura lá e você fica feliz. O inverso também é verdadeiro. Você tem uma conta aqui e gosta do cartão de outro banco. Zero de problema. Debita aqui. Nesse mundo novo, o grande vencedor é o cliente. Ele vai ter mais mobilidade e acesso aos produtos.
Abrir capital está nos planos do banco?
Abreu: Essa é uma decisão do acionista. Tenho mandato para tocar o banco, não para mexer com isso. É uma opinião pessoal, mas acredito que, num futuro próximo, com o banco maior, os acionistas vão pensar nisso.
Quais são as metas de crescimento do banco?
Abreu: A nossa meta é fechar 2019 com 2,5 milhões de clientes. Até o fim de 2022, pretendemos ter 10 milhões de clientes.
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