Uma portaria assinada pelo ministro da Economia Paulo Guedes promete trazer um novo impulso para o segmento de varejo de viagem no Brasil. Publicada na última terça-feira no Diário Oficial da União, a medida amplia o limite para gastos em free shops dos atuais US$ 500 para US$ 1 mil.
Prevista para entrar em vigor a partir de 1⁰ de janeiro de 2020, a mudança vale apenas para as compras efetuadas nas lojas instaladas nas salas de embarque e desembarque de aeroportos de todo o País. No caso dos produtos adquiridos pelos viajantes no exterior, a cota limite segue sendo de US$ 500.
De um lado, a Receita Federal estima uma perda de arrecadação de US$ 62,64 milhões, em 2020, com a medida. No entanto, além dos viajantes, há quem comemore a decisão. É o caso do grupo suíço Dufry. Principal nome desse mercado em escala global, a empresa também domina boa parte do segmento no Brasil, com uma forte presença nos aeroportos locais.
O mapa de operações da Dufry no País é extenso. E inclui os seguintes aeroportos: Guarulhos, Congonhas e Viracopos (SP); Galeão e Santos Dumont (RJ); Confins (MG); Vitória (ES); Natal (RN), Recife (PE); Fortaleza (CE); Brasília (DF); Belém (PA); Curitiba (PR); Goiânia (GO); Cuiabá (MT); Florianópolis (SC); e Salvador (BA).
No total, são 53 unidades, divididas em três modelos. Carro-chefe da empresa, a bandeira Duty Free abrange as lojas instaladas nas áreas de embarque e desembarque restritas aos viajantes internacionais e com produtos isentos de impostos.
Já a Dufry Shopping inclui as unidades localizadas nos setores destinados a voos domésticos ou de livre acesso, com a incidência de impostos locais. A marca Hudson, por sua vez, compreende as lojas de conveniência que oferecem um mix diverso de produtos, de livros e bebidas a souvenirs e acessórios de viagem.
Procurada, a Dufry não concedeu entrevista. As fontes consultadas pelo NeoFeed ressaltam, porém, que a empresa será a principal beneficiada com a portaria. “Eles estão em Guarulhos e no Galeão. São os dois free shops mais importantes do País”, diz Alberto Serrentino, sócio da consultoria Varese Retail.
Os números reforçam essa afirmação. Em 2018, 18,9 milhões de viajantes com destinos internacionais passaram pelos dois aeroportos. O volume representou 80,65% dos turistas com esse perfil no período, segundo dados da Agência Nacional de Aviação Civil (Anac).
Diversificação
Com o aumento do valor estipulado na cota, a diversificação do mix de produtos e a ampliação da oferta em determinadas categorias já trabalhadas pela empresa são outros ganhos potenciais. Além do provável aumento do tíquete médio.
Atualmente, as lojas da Dufry no Brasil já conseguem competir com outros free shops do mundo em categorias como perfumaria, cosméticos e beleza. “Agora, eles vão poder explorar, de fato, os eletrônicos e produtos digitais, um segmento cuja oferta atual é muito restrita, por conta da faixa de preço”, afirma Serrentino. “Em uma projeção conservadora, a perspectiva é de um crescimento de 30% no faturamento local da empresa.”
A Dufry não divulga números locais. Um levantamento da Sociedade Brasileira de Varejo e Consumo (SBVC), no entanto, estima que a companhia faturou R$ 2,08 bilhões no Brasil em 2018. A canetada de Paulo Guedes pode significar um adicional de R$ 600 milhões ao faturamento da Dufry.
Presidente da SBVC, Eduardo Terra ressalta que o limite de compras não sofria alterações desde 1991. “Essa mudança não só vai ser benéfica para a Dufry, como vai dar mais tração ao mercado e, possivelmente, atrairá outros competidores.”
Hoje, a principal rival da Dufry no Brasil é a americana Duty Free Americas (DFA). Entre free shops, lojas e quiosques instalados em áreas de livre acesso, a companhia tem 19 unidades no País.
A maior presença da DFA está na região Sul, com seis pontos no aeroporto internacional de Curitiba e outros quatro no aeroporto de Porto Alegre. A operação inclui ainda unidades em Congonhas (SP), Manaus (AM), Maceió (AL) e Salvador (BA).
Expansão
Fundada em 1865 e com sede na Basiléia, a Dufry se consolidou nas últimas décadas como a principal empresa global do setor. Avaliada em US$ 4,3 bilhões, a empresa fechou 2018 com um faturamento de US$ 8,6 bilhões.
A companhia é listada na Bolsa de Zurique desde 2005. Entre seus principais acionistas estão as empresas e fundos Travel Retail Investments, Qatar Investment Authority, Richemont, Franklin Mutual Advisors e GIC Asset Management. Juntos, eles detêm 38% do negócio.
A estratégia de crescimento da Dufry combinou expansão geográfica e aquisições. Presente em 64 países e com 30 mil funcionários, a empresa opera cerca de 2,3 mil lojas em aeroportos, navios, portos e outros pontos turísticos.
Uma das transações realizadas foi a compra da Hudson, empresa responsável por lojas de conveniência em aeroportos, especialmente nos Estados Unidos e no Canadá. Em fevereiro de 2018, a companhia captou US$ 749 milhões em sua abertura de capital na Bolsa de Nova York.
O desembarque no Brasil aconteceu justamente com uma aquisição. Em 2006, quando ainda era controlado pela gestora de investimentos Advent, o grupo pagou US$ 500 milhões pela Brasif, companhia do empresário Jonas Barcellos, que, na prática, monopolizava esse mercado no País.
Em 2013, o empresário Abilio Diniz e a gestora de recursos Tarpon compraram uma fatia de 5,22% de participação na operação. A fatia foi vendida tempos depois.
De lá para cá, o Brasil integrou algumas ações relevantes no mapa global da companhia. Uma dessas iniciativas foram os projetos-piloto que deram origem à bandeira Dufry Shopping, a partir de 2014.
Depois de sete lojas no País e uma primeira unidade no aeroporto de Las Vegas, inaugurada em 2017, o grupo planeja agora expandir esse modelo em outros aeroportos pelo mundo.
No Brasil, a estratégia recente inclui outros passos. Em setembro, a companhia assinou um novo contrato com o aeroporto de Florianópolis, administrado pela Zurich Airport International. O novo terminal do local, inaugurado no início do mês, passará a contar com mais quatro lojas da empresa.
Já em agosto, a Dufry abriu uma nova frente de negócios no Brasil. A empresa inaugurou, em Uruguaiana (RS), sua primeira loja cross border no País. O modelo envolve unidades localizadas perto de fronteiras – nesse caso, a Argentina - e foi instalado a partir da liberação expressa em uma regulação publicada pela Receita Federal em 2018.
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