A gigante dinamarquesa Vestas, fabricante de turbinas eólicas, enxerga no avanço das construções de data centers no Brasil, principalmente a partir do desenvolvimento do Plano Nacional de Data Centers, o caminho para aumentar sua presença no mercado nacional. O País está no top 5 do ranking global dos principais mercados da companhia.
Mas há uma barreira que impede o avanço desse vento no País: o enorme volume de subsídios do governo federais para a ampliação de centrais de placas solares de pequeno porte, como as instaladas em residências e pequenos negócios e que integram o setor de micro e minigeração distribuída (MMGD) no Brasil.
Segundo estudo produzido pela companhia, os benefícios fiscais oferecidos pela União para o desenvolvimento do MMGD no Brasil alcançaram a marca de R$ 12 bilhões em 2024. Em 2020, representava R$ 449 milhões, um crescimento acima de 2.600% em subsídios para o setor em apenas quatro anos.
“Esse desequilíbrio faz com que a Vestas tenha uma perda de bilhões de reais no Brasil. Ou iguala os subsídios para todos ou não garante para ninguém”, diz Eduardo Ricotta, CEO da Vestas na América Latina, em entrevista ao NeoFeed.
“Quando a gente chega a ver 75% de subsídio, é criada uma precificação artificial dessa solução. Por isso que ela é barata. E faz com que a outra parte pague essa conta”, afirma o executivo. “Isso causa uma pausa nos investimentos das empresas.”
Na prática, quem paga a conta desse benefício é o contribuinte. E isso acarreta, na ponta final, o aumento da tarifa na conta de energia elétrica, com o valor sendo repassado pela concessionária. Isso acontece porque a geração distribuída não paga a transmissão da energia.
O resultado desse crescimento desordenado no sistema é o aumento do chamado curtailment, que é quando o ONS interrompe a produção de energia elétrica por causa do excesso de produção, para evitar uma pane no sistema. Só que, como a geração distribuída não é controlada, ela não sofre essa interrupção, ao contrário do setor eólico. Isso é sinônimo de prejuízo para as empresas.
“Com esse descontrole, uma hora isso vai gerar um apagão no Brasil. Além de aumentar a conta do cidadão, isso quebra os geradores de energia, que perdem muito. Esse é um grande problema que estamos passando no momento”, afirma Ricotta.
Segundo o executivo, esses benefícios fiscais resultaram no crescimento desordenado da geração distribuída no Brasil, que hoje atinge o volume de 43,4 GW de potência instalada, o que corresponde a 17,8% de toda a capacidade da matriz energética.
Hoje, a capacidade total instalada no País é de 268 GW, segundo o Operador Nacional do Sistema Elétrico (ONS). O sistema mais utilizado é o hidrelétrico, com 107,9 GW (44,3% do total). Em segundo está justamente o setor de geração distribuída, seguido pela energia eólica, com 33,9 GW (13,9%).
Para o CEO da Vestas, entre as saídas para esse problema é a criação de um modelo curtailment contábil, em que o governo poderia calcular qual seria o prejuízo de um período e dividir igualmente por todas as fontes, para minimizar o impacto desse excesso de privilégio a apenas um setor. “A geração distribuída também deveria ser penalizada. Não dá para distribuir uma perda em só uma parte.”
Outra iniciativa que, na avaliação de Ricotta deveria ser adotada com urgência, é garantir a isonomia entre os setores elétricos no Brasil. “Enquanto o subsídio do eólico gira em torno de 35%, no caso da geração distribuída ultrapassa 75%. É muito desigual. Isso fez sentido no início da indústria solar. Hoje não mais. É preciso condições isonômicas.”

Para Ricotta, é ruim para a imagem do Brasil, que irá sediar a Conferência das Nações Unidas para Mudança do Clima (COP-30), em novembro, em Belém (PA), demorar para encontrar essa solução que afeta o avanço da utilização equilibrada de fontes renováveis.
“É um risco para o nome do Brasil. A gente precisa liderar esse movimento de transição energética. Vamos ajudar outros países. Ao mesmo tempo, a gente vê esse dilema e sem uma solução rápida”, afirma o CEO da Vestas.
“As fontes renováveis precisam trabalhar juntos. É bom ter energia eólica, solar, biomassa, hidrelétrica. Quando não há condições econômicas de competição, gera um problema real”, diz.
Espaço para crescimento
Mesmo com esses desafios, Ricotta acredita que a companhia vai conseguir capturar parte significativa da demanda a partir desses centros de processamentos de dados que serão instalados no País, principalmente para atender as empresas de tecnologia de Inteligência Artificial (IA).
“Essas big techs, que são as que mais irão construir data centers, querem usar 100% de energia renovável. Como o processamento está aumentando muito, se não buscarem essa fonte renovável, vão subir demais a emissão de CO²”, explica.
“Nesse sentido, o Brasil se tornou um mercado atrativo. E a maior parte desse espaço pode ser ocupado pela Vestas, justamente pelo perfil de nossa geração”.
A expectativa para minimizar as perdas com o desequilíbrio de subsídios está na necessidade da instalação de um projeto de energia rentável para esse data center. “O investidor vai ter que construir um parque eólico perto desse equipamento. É óbvio que uma interrupção forçada pode afetar essa geração, mas a tendência que, pela proximidade desses parques, esse impacto seja menor.”
Com projeção de faturamento global para 2025 entre € 18 bilhões e € 20 bilhões, a Vestas reportou receita líquida de € 3,7 bilhões no segundo trimestre, com alta de 14% sobre o mesmo período do ano anterior. O lucro registrado abril e junho foi de € 34 milhões.
Na Bolsa de Copenhague, as ações da companhia registram valorização de 17,1%. O valor de mercado da Vestas é de 125,11 bilhões de coroas dinamarquesas, o equivalente a US$ 19,5 bilhões.