No Itaú desde 2002, Milton Maluhy Filho acompanhou de perto a ascensão das fintechs e neobanks. Munidos com uma pegada digital e financiados por cheques polpuldos de investidores, esses novos rivais ganharam terreno e entraram em rota de colisão com os grandes bancos na disputa por clientes.

Em fevereiro de 2021, o executivo entrou de vez na linha de frente desses embates, quando assumiu o posto de CEO do Itaú Unibanco. Agora, prestes a completar dois anos no cargo, ele enxerga, no entanto, um novo cenário nesse campo de batalha.

“Hoje, o mercado está muito mais racional do que aquele que observamos lá atrás”, disse Maluhy Filho, em sua participação no Macro Vision 2022, evento que está sendo promovido pelo Itaú BBA nesta quinta-feira, 8 de dezembro. “Eu vejo uma convergência acontecendo no médio prazo.”

O executivo traçou um panorama para justificar o entendimento de que os grandes bancos e esses novos players caminham para uma competição mais equilibrada. A começar pelos impactos do cenário macroeconômico nas operações desses rivais.

Em um roteiro conhecido, de um lado, ele ressaltou que a elevação da taxa de juros fez com que os investidores reduzissem o apetite por aportes nesses ativos e, ao mesmo tempo, passassem a pressionar por rentabilidade e para que esses negócios sejam sustentáveis no longo prazo.

“Estamos entrando em uma nova era em que esses neobanks começam a falar de monetização e vários deles estão mudando seus modelos de negócio”, disse, ressaltando que alguns dos apelos desses entrantes caíram por terra. “Aquilo que era a remuneração de uma conta, a 100% do CDI, já não remunera mais.”

Maluhy Filho observou que, ao mesmo tempo, muitos desses bancos digitais acabaram focando em segmentos como os clientes jovens e de baixa renda, perfis que, nesse momento de inflação elevada, estão engrossando as estatísticas de inadimplência.

Em outro ponto, ele ressaltou que boa parte dessas fintechs e neobanks começaram com modelos monoproduto e avançaram para outras ofertas. Esse portfólio mais amplo trouxe, naturalmente, desafios para essas empresas.

“Eles estão começando a gerir ecossistemas mais complexos, mudando o preço e isso tem um impacto no NPS (Net Promoter Score) e nós, por outro lado, fizemos a lição de casa”, afirmou. “Já fechamos quase 20 pontos percentuais de diferença para esse NPS.”

Como em outras oportunidades, o executivo também abordou a necessidade da aplicação de um arcabouço regulatório condizente com o patamar que muitas dessas fintechs alcançaram. E que seja proporcional aos parâmetros e obrigações que os grandes bancos estão sujeitos.

“Eu defendo a proporcionalidade. Não dá para ter uma regulação única para um banco do nosso tamanho e imaginar que ela se aplica exatamente igual a uma empresa que está nascendo”, disse. “Mas muitos desses players já não são mais pequenos. Eles já nasceram, cresceram e começam a trazer um risco sistêmico.”

Entre outros pontos de atenção, ele frisou que é preciso ser rigoroso nas questões relacionada à prevenção da lavagem de dinheiro. Nesse âmbito, Maluhy Filho ressaltou que o modelo de abertura de conta 100% digital e a facilidade para acessar esses serviços é um dos aspectos que amplia esses riscos.

“De um lado, se o processo não é bem feito, você acaba trazendo para o sistema muitas contas frias e fraudulentas”, disse. “Ao mesmo tempo, você cria um endividamento numa população que tem pouca ou nenhuma educação financeira.”

Nesse contexto, ele citou que o Itaú Unibanco observou uma sobreoferta de cartões no mercado e, como consequência, passou a reduzir, “de forma muito relevante”, seu apetite nessa linha, especialmente no “mar aberto”.

“Essa é uma conta que o sistema já está pagando e vai continuar pagando por um bom tempo”, afirmou. “Nossa agenda não é anticompetição. É uma agenda de regulação proporcional e ‘same level field’. Queremos ter as mesmas regras para negócios de portes parecidos.”