Nas máximas históricas, o Ibovespa acumula alta de 21% no ano e está a apenas 2 pontos percentuais de bater o melhor retorno anual desta década. Apesar do desempenho expressivo do benchmark, o fundo Minas, da gestora mineira AF Invest, tem superado com folga a performance do índice, com retorno de 72% em 2025.
A casa, uma das poucas fora do eixo Rio de Janeiro-São Paulo atuando na renda variável, credita o resultado do fundo à estratégia de alocação em empresas que geram caixa, e não necessariamente lucro.
“Fazemos a conta de quanto eu compro de Ebitda por milhão investido e vamos ajustando a posição. Compramos resultado operacional”, diz Leandro Saliba, head de renda variável da AF Invest, em entrevista ao NeoFeed.
Como a métrica praticamente ignora o efeito da dívida da empresa, que deteriora o lucro por meio da despesa financeira, o resultado é uma carteira concentrada em nomes alavancados. No fim de agosto, 64% do portfólio estavam em companhias com essas características. Com a expectativa de que os juros comecem a cair nos próximos meses, Saliba acredita que ainda há um grande espaço para a bolsa subir.
"O bull market nem começou ainda. O múltiplo ainda está muito abaixo da média histórica, principalmente nas cíclicas domésticas, que são essas empresas mais alavancadas e mais expostas a juros de longo prazo", afirma o gestor da AF Invest, que detém R$ 4 bilhões sob administração, incluindo a estrutura de wealth management.
“Tem empresa que tem CDI + 2% de dívida, com custo de 17% a 20% ao ano. Quando o CDI cair, esse custo diminui e o lucro aumenta na hora. A tendência é essas ações se valorizarem bastante”, complementa.
Um dos setores que ajudaram a impulsionar o retorno do fundo mineiro foi o de educação. Desde que foi criada há 19 anos, a asset nunca teve ações de educação no portfólio.
"Esse setor chegava a negociar a EV/Ebitda [valor da empresa sobre o Ebitda] de 17 vezes na época do Fies. Antes da pandemia, estava em 12 vezes e, no início deste ano, foi a 3 vezes. É algo que nunca tinha acontecido. Então, aproveitamos e ainda temos parte relevante da carteira no setor”, diz Saliba.
Entre as grandes apostas do fundo estiveram as ações da Cogna, que lideram os ganhos do Ibovespa em 2025, com 190% de alta. Esse foi o papel que gerou o maior retorno. A companhia chegou a ser a maior posição do fundo mas, de uma hora para outra, disparou.

"Quando entendemos que o papel tinha andado muito, trocamos por outro que ficou para trás, que foi o da Ânima. No mês seguinte, subiu 50% e trocamos de novo”, diz o gestor.
A terceira escolha da AF Invest no setor, seguindo essa mesma lógica, foi a Vitru - posição que a gestora mantém. Segundo Saliba, o mercado está equivocado nas contas da Vitru.
"É uma empresa com preço/lucro de 3 vezes com os juros onde estão. Com a queda de juros, pode ser um absurdo. Eu nunca comprei tanta geração de caixa em uma empresa”, afirma ele.
Além dos movimentos táticos com ações alavancadas no setor de educação, os papéis da Movida e da Simpar, também mais endividados, contribuíram significativamente para o desempenho do fundo no ano.
Saliba assumiu a gestão de renda variável da AF Invest em 2021 e, desde o início de 2022, o fundo Minas mantém pelo menos 38% do portfólio concentrado em ações de empresas alavancadas, estando próximo do maior patamar alocado nessa estratégia.
Outra diferença em relação à maior parte do mercado é a alta concentração em nomes específicos, com o número de empresas investidas podendo variar de 8 a 15.
“Se você está concentrado e cai, é muito ruim. Mas se está concentrado e sobe, é muito bom. E a gente entende que volatilidade não é risco. Volatilidade é até mais oportunidade para quem faz conta e está convicto do que está fazendo”, diz ele.
O efeito da Selic
Essa mesma estratégia, porém, teve efeito contrário quando o Banco Central voltou a subir a taxa de juros no ano passado. O fundo teve um retorno negativo de 39,87%, quase o dobro da perda de 20,36% do Ibovespa em 2024. Ainda assim, o fundo Minas está à frente do benchmark na corrida de longo prazo, com retorno de 227% (111 pontos percentuais acima do índice) desde seu início, em 2010.
Para Saliba, não há problema em manter uma posição até que uma distorção de mercado retorne ao equilíbrio. “É igual ao cenário: não sabemos que dia a Selic vai começar a cair, se vai ser em dezembro ou no início do ano que vem. Mas vai cair, porque 10% de juros reais não existe em lugar nenhum.”
Apesar do otimismo com a trajetória dos juros, Saliba reconhece que pode ter que mudar a estratégia a depender da corrida eleitoral do ano que vem. “Se tiver um cenário de reeleição, os juros podem subir mais ainda e demorar muito mais para cair. Aí teremos que ajustar a carteira. Se tiver troca de governo, não precisaremos fazer nada. É só reinvestimento.”
A lógica, conta, passa pela expectativa de que um novo governo aumentaria a credibilidade fiscal do País, provocando a queda da taxa de juros de longo prazo. Mas o gestor avalia que ainda é cedo para colocar as eleições em primeiro plano e afirma que é apenas o cenário macroeconômico que tem direcionado as posições do portfólio.
“O juro real está tão alto que vai frear a economia mais rápido do que o esperado. Isso fará o BC cortar os juros mais rápido do que o mercado imagina”, diz. “Não faz sentido antecipar o [trade eleitoral] para este ano.”