A Americanas divulgou nesta terça-feira, 13 de junho, fato relevante confirmando oficialmente que as demonstrações financeiras da empresa vinham sendo fraudadas pela diretoria anterior.
“Os documentos que deram origem ao relatório demonstram ainda os esforços da diretoria anterior das Americanas para ocultar do Conselho de Administração e do mercado em geral a real situação de resultado e patrimonial da companhia”, informa um trecho do fato relevante.
São citados como participantes da fraude o ex-CEO Miguel Gutierrez, e os ex-diretores Anna Christina Ramos Saicali, José Timótheo de Barros e Márcio Cruz Meirelles, além dos ex-executivos Fábio da Silva Abrate, Flávia Carneiro e Marcelo da Silva Nunes.
De acordo com o relatório, foram identificados diversos contratos de verba de propaganda cooperada e instrumentos similares (“VPC”), incentivos comerciais usualmente utilizados no setor de varejo, que teriam sido artificialmente criados para melhorar os resultados operacionais da Americanas como redutores de custo, mas sem efetiva contratação com fornecedores.
Esses lançamentos, feitos durante um significativo período, atingiram, em números preliminares e não auditados, o saldo de R$ 21,7 bilhões em 30 de setembro de 2022.
"Esses contratos de VPC criados ao longo do tempo, os quais não tiveram lastro financeiro associado, se deram majoritariamente na forma de lançamentos redutores da conta de fornecedores, totalizando, em números preliminares e não auditados, o saldo de R$ 17,7 bilhões em 30 de setembro de 2022", diz a nota. "A diferença de R$ 4 bilhões teve como contrapartidas lançamentos contábeis em outras contas do ativo da companhia."
Em adição às operações de VPC, e como forma de gerar o caixa necessário para a continuidade das operações das Americanas, a diretoria anterior contratou uma série de financiamentos nos quais a empresa é devedora perante instituições financeiras, sem as devidas aprovações societárias, todas inadequadamente contabilizadas no balanço patrimonial da companhia de 30 de setembro de 2022 na conta fornecedores.
Entre eles, operações de financiamento de compras (risco sacado, forfait ou confirming) de R$ 18,4 bilhões, em números preliminares e não auditados; e operações de financiamento de capital de giro de R$ 2,2 bilhões, em números preliminares e não auditados.
"A indevida contabilização dessas operações de financiamento nos demonstrativos financeiros da Americanas não permitiu a correta determinação do grau de endividamento da companhia ao longo do tempo", diz o relatório.
"Também foram identificados lançamentos redutores da conta de fornecedores oriundos de juros sobre operações financeiras, que deveriam ter transitado pelo resultado da Companhia ao longo do tempo, totalizando, em números preliminares e não auditados, o saldo de R$ 3,6 bilhões em 30 de setembro de 2023", acrescenta o documento do comitê de investigação.
Os ajustes contábeis, derivados dos fenômenos acima, são preliminares, não auditados e ainda estão sujeitos a alterações. "Os ajustes contábeis definitivos estarão refletidos nos demonstrativos financeiros históricos auditados que serão reapresentados assim que os trabalhos estiverem concluídos", diz o comitê.
Entenda o caso Americanas
Em janeiro, a Americanas divulgou que havia encontrado inconsistências contábeis de mais de R$ 20 bilhões. A informação foi divulgada por Sergio Rial, que havia assumido o comando da empresa há apenas 9 dias.
O anúncio das falhas contábeis, feito de forma apressada, levantou uma série de dúvidas sobre Jorge Paulo Lemann, Beto Sicupira e Marcel Telles, os acionistas de referência da varejista.
Dez dias depois do anúncio dos problemas contábeis, a Americanas entrou com um pedido de recuperação judicial em caráter de urgência na 4ª Vara Empresarial do Rio de Janeiro, declarando dívidas superiores a R$ 40 bilhões.
Desde então, o mercado se pergunta como um "buraco" dessa magnitude ficou tanto tempo sem ser notado pelos acionistas da empresa, pelos bancos credores e pelo mercado, de forma geral.
Até agora, a Comissão de Valores Mobiliários transformou em réu apenas o ex-presidente da empresa, Sergio Rial, e o ex-diretor de relações com investidores da companhia, João Guerra Duarte Neto.
Segundo a CVM, o processo envolve infrações ao artigo da Lei das S.A. que trata do sigilo sobre informações relevantes que não foram divulgadas.
O processo trata ainda de descumprimentos de resoluções da CVM a respeito da forma como notícias importantes a respeito das companhias, que possam influenciar nas decisões de investidores, precisam ser feitas ao mercado.