Uma vez bad boy, sempre bad boy? Essa parece ser a sina de Travis Kalanick. O empresário fundou a Uber e, em junho de 2017, precisou renunciar ao cargo de CEO e ao seu assento no conselho da empresa após acusações de assédio contra funcionários. E agora, está envolvido em uma nova polêmica. Desta vez, com a CloudKitchens.

Avaliada em US$ 15 bilhões, após um aporte de US$ 850 milhões recebido em 2021, a CloudKitchens passou a ser comandada por Kalanick em 2018. Na época, o ex-CEO da Uber desembolsou US$ 150 milhões para adquirir a fatia majoritária da City Storage Systems na operação.

A empresa atua com “dark kitchens”, como são chamadas as cozinhas compartilhadas voltadas exclusivamente ao segmento de delivery. E, ao que tudo indica, terá um grande imbróglio à frente para digerir nos tribunais.

De acordo com o site americano Business Insider, centenas de funcionários da startup deixaram seus empregos alegando questões como trabalho excessivo, tratamento precário, pagamento insuficiente e discriminação, entre outros problemas. As demissões motivaram uma série de processos judiciais contra a companhia.

Um dos processos foi movido por Corinne Specter, ex-recrutadora que trabalhou por quase dois anos na CloudKitchens. Na ação, Specter alega que a companhia não realizou o pagamento de horas extras e não permitiu que ela tivesse intervalos mínimos de 30 minutos para realizar refeições.

Outra ação trata a respeito de discriminação por gênero. "Funcionárias femininas e de minorias são menos remuneradas do que empregados homens e brancos em todos os cargos e níveis de emprego", diz a denúncia feita por Alyssa Perez ex-executiva assistente da CloudKitchens.

No processo movido por Perez contra a City Storage Systems e o próprio Kalanick, a alegação é de que seu salário era de US$ 65 mil por ano, enquanto colegas homens e brancos ganhavam US$ 110 mil para realizarem funções semelhantes.

O valor pedido em ambas as causas ainda não foi estipulado. Na Uber, uma ação conjunta baseada em denúncias de discriminação racial e por gênero gerou prejuízo de US$ 10 milhões para a empresa. Por ora, CloudKitchens mantém silêncio sobre o assunto.

Em outra esfera, uma ação de US$ 200 mil movida pela empresária Zena Powell acusou a startup de cometer práticas comerciais enganosas. A reclamação é de que a companhia não teria realizado uma série de ações de marketing e serviços de limpeza que estavam inclusos no contrato de aluguel dos espaços.

“A promessa de limpeza geral noturna da cozinha (todos os equipamentos e pisos), limpeza semanal do capô e limpeza profunda trimestral, marketing, assistência na aplicação e sinalização eram mentiras”, escreveu Powell no processo.

Ela também afirmou que o aplicativo da startup, batizado de Otter e que gerencia os pedidos online dos restaurantes que utilizam suas estruturas, apresentava problemas constantes.

Em uma entrevista anterior ao Business Insider, um porta-voz da companhia chegou a afirmar que a startup não conseguiu cumprir promessas feitas aos clientes, o que motivou uma alta rotatividade dos espaços.

As reclamações contra a CloudKitchens não são novas. Além dos processos, a companhia vem enfrenta críticas e acusações relacionadas ao aumento do tráfego, ao desrespeito às regras de trânsito e a outros problemas supostamente causados no entorno das suas cozinhas.

No Brasil, onde a startup desembarcou, como de costume, silenciosamente, no primeiro semestre de 2020, não foi diferente. Conforme apurou o NeoFeed, na época, a empresa foi alvo das reclamações de moradores no bairro da Lapa, em São Paulo, por conta do barulho gerado por um hub de 30 cozinhas instalado na região.

Histórico de polêmicas

Tido como um bad boy do mercado de tecnologia, Travis Kalanick colecionou polêmicas enquanto comandou a Uber. O “sucesso” foi tanto que motivou até mesmo a criação da série de TV Super Pumped: The Battle for Uber, que estreia em maio e conta a história do empresário e de sua jornada no comando do aplicativo de transporte.

Um dos casos que pode ser retratado na produção foi uma discussão que Kalanick teve com um motorista da Uber durante uma viagem que fez pelo aplicativo. No trajeto, o motorista acusou o empresário de realizar muitas mudanças que tornaram as corridas baratas demais. Kalanick, por sua vez, tentou se justificar e a discussão virou um bate-boca que foi filmado por uma câmera dentro do veículo.

Além desse episódio, foi sob o comando de Kalanick que a Uber foi acusada de espionagem industrial contra a Waymo, divisão de carros autônomos do Google. Outra denúncia envolveu a criação de um método para que o aplicativo escapasse da fiscalização em cidades em que o serviço era proibido por lei.

A lista inclui ainda casos de assédio e discriminação envolvendo a empresa.  O principal deles foi relatado pela engenheira Susan Fowler. A ex-funcionária teve uma denúncia de um caso de assédio cometido por um colega ignorada porque o funcionário em questão era “bem avaliado”.