A fintech Jeitto, focada em crédito para as classes C e D, enfrenta um aumento repentino da inadimplência em seu principal veículo de financiamento, o FIDC Jeitto, administrado pelo Banco Master. De acordo com dados da Comissão de Valores Mobiliários (CVM), do total da carteira de crédito de quase R$ 1,1 bilhão no Master, R$ 879,56 milhões estavam inadimplentes no fim de outubro, contra apenas R$ 201,04 milhões em dia.
Essa porção dos créditos inadimplentes sofreu um aumento de 67% em relação ao mês de abril e de 146% em relação ao início deste ano. Já os créditos adimplentes do FIDC caíram 60% e 70%, respectivamente, no mesmo período. Desde outubro de 2024, o veículo não recebia novos aportes. Com patrimônio líquido estimado em R$ 481,7 milhões, o FIDC Jeitto é o maior entre os 52 administrados pelo Master, segundo levantamento da Uqbar.
A piora da qualidade de crédito da carteira, inclusive, foi motivo de uma batalha entre a fintech e o Master nos últimos meses. A instituição de Daniel Vorcaro, na condição de administradora, notificou a Jeitto pelo não pagamento dos créditos com mais de 90 dias de inadimplência – uma condição que, segundo o Master, estava prevista em anexo do regulamento do fundo.
A interrupção dos pagamentos ocorreu ainda antes de maio deste ano, quando, por meio de uma Assembleia Geral Extraordinária (AGE), foi concedido um waiver até o fim de setembro, tirando a obrigatoriedade da recompra dos créditos com mais de 90 dias de inadimplência.
No documento público que o NeoFeed teve acesso com as justificativas para obter o waiver, a Jeitto afirmou que a estrutura do FIDC era “fiscalmente ineficiente” e que lhe custou R$ 200 milhões em três anos em “impostos adicionais e custos de funding adicionais (versus uma estrutura de mercado)”.
Segundo a Jeitto, “a estrutura do FIDC dificulta a captação de recursos de outros investidores, dado suas regras diferentes dos padrões utilizados pelos fundos de mercado no Brasil”, e que existia a necessidade de migrar para uma estrutura de FIDC mais eficiente. A conclusão era que a transição aumentaria "consideravelmente os resultados do Jeitto de maneira imediata".
Naquele momento, o crédito vencido há mais de 90 dias era de R$ 72 milhões e representava 13,6% do total inadimplente. Até outubro, data dos dados mais recentes, esse volume cresceu 517% para R$ 445 milhões e passou a representar cerca da metade do total inadimplente. A situação pode se agravar ainda mais, dado que havia mais de R$ 200 milhões em créditos inadimplentes entre 61 e 90 dias.
“Aparentemente, a inadimplência vinha sendo contida pelo pagamento dos créditos com mais de 90 dias vencidos. Quando cessou esse pagamento, a inadimplência explodiu”, disse um analista de FIDCs que analisou os documentos, a pedido do NeoFeed.
Em outubro, o Master encaminhou uma notificação extrajudicial impedindo o fundo de realizar novas aquisições de direitos creditórios até que os valores sejam pagos. Outubro foi o primeiro mês em que o FIDC não fez novas aquisições.
O fundo, segundo documentos da CVM, foi criado em 2020 e é constituído por um único cotista na cota sênior, classificado como banco comercial.
No início de dezembro, questionada sobre o que faria com o FIDC administrado pelo Master, a Jeitto afirmou que o fundo já estava em processo de liquidação antes mesmo de o Banco Central decidir encerrar as operações do banco. A fintech afirmou ainda que o Master era apenas o administrador do fundo, sem qualquer outra relação com a empresa.
A Jeitto era vista como uma das fintechs emergentes na disputa pelo crédito para baixa renda, tendo adquirido a Pilla em fevereiro deste ano. Mas, sem conseguir levantar recursos com o FIDC administrado pelo Master, a Jeitto afirmou que precisou interromper a originação de empréstimo pessoal em março e reduziu o ritmo de empréstimos no rotativo.
A empresa ainda informou que encerrou o primeiro trimestre com Ebitda negativo de R$ 18,9 milhões, mas que, se tivesse uma estrutura mais eficiente em seu FIDC, já teria atingido o breakeven ainda no primeiro trimestre.
Com o FIDC parado no Master, a Jeitto estruturou um novo FIDC para financiar suas operações, desta vez administrado pela Oliveira Trust. O fundo começou a rodar em agosto e, no fim de outubro, tinha R$ 61,9 milhões em créditos adimplentes e R$ 3,27 milhões inadimplentes.
Após a oferta inicial, o fundo está com uma emissão em aberto, com o objetivo de captar até R$ 40 milhões em cotas mezanino e R$ 160 milhões em cotas sêniores. De acordo com dados da CVM, até o fim de outubro, o fundo tinha um investidor na cota sênior, dois na mezanino e um na júnior.
A Jeitto tem mais um FIDC, administrado pela Vórtx, segundo dados da plataforma Uqbar, com cerca de R$ 7,5 milhões em carteira e quase R$ 6 milhões em provisões.
Procurada pelo NeoFeed, a Jeitto não retornou o pedido de entrevista até a publicação desta reportagem.