A disputa pela compra da brasileira Medley, unidade de genéricos da francesa Sanofi, vai ser acirrada. No fim de outubro, o NeoFeed revelou que oito farmacêuticas estavam no páreo. No entanto, a Cimed, uma das interessadas, buscava mais “olhar os números” da concorrente do que brigar até o fim pelo ativo.

O CEO João Adibe Marques afirma que é exatamente o contrário. Após o aporte do fundo soberano de Singapura, o Government of Singapore Investment Corporation (GIC), em março deste ano, ele garante que a Cimed está pronta para disputar a Medley com as rivais, especialmente com a EMS, vista pelo setor farmacêutico como a favorita neste deal.

“A Cimed está no negócio para comprar. Vou brigar para valer até o fim pela Medley. E quem entrou de sócio tem dinheiro. Admiro muito a marca, que foi um dos primeiros genéricos do Brasil”, diz Adibe, em entrevista ao NeoFeed.

“Além de dar condições de otimizar meu portfólio, consigo penetrar a marca Medley em uma cadeia que hoje eles não frequentam, como o varejo independente, em que a Cimed tem grande distribuição”, complementa.

Ainda que não revele o valor que estará escrito na sua proposta, Adibe dá uma pista ao dizer que oferecerá condições parecidas às da EMS. Isso significa dizer que sua oferta será semelhante aos US$ 500 milhões que a companhia farmacêutica da família Sanchez se dispôs a colocar na mesa para donos da Medley, conforme apurou o NeoFeed - uma shortlist de até quatro empresas vai ser montada pela Sanofi até fevereiro do ano que vem.

Adibe confirma que o recurso para a compra virá do GIC, hoje detentora de fatia minoritária da Cimed. Ele não revela o valor do negócio, mas o mercado afirma que o fundo asiático aportou R$ 1 bilhão. A definição agora é se o dinheiro virá com um novo aporte do CIG ou por meio de um financiamento externo.

“Já tivemos reuniões com a direção da Sanofi e a compra nos colocaria em outro patamar. Passaríamos a ser o segundo de genéricos no Brasil [atrás da EMS]”, diz. Atualmente, a unidade de medicamentos representa 50% da receita da Cimed. Com a Medley, passaria para 70%.

Atualmente, a Medley fabrica perto de 300 milhões de unidades (caixas) de medicamentos ao ano. A Cimed tem uma produção de 600 milhões de unidades, o que pode levar a empresa para uma fabricação anual de quase 1 bilhão de caixas.

Mas o empresário tem um plano diferente ao da EMS caso realmente se sagre vencedor da concorrência feita pela Sanofi. O dono da Cimed não quer ter nas gôndolas das farmácias dois medicamentos genéricos com o mesmo princípio ativo produzido tanto pela Cimed como pela Medley.

Existe, na avaliação de Adibe, uma sobreposição de cerca de 25% dos produtos. Para ele, vai ficar no mercado, em caso de vitória, aquele que tiver o melhor resultado na combinação custo versus participação de mercado. “Não há razão para ter duas bandeiras. Não vou ter uma nimesulida da Cimed e outra da Medley. Vou ter uma só na farmácia”, diz ele.

Isso, no entanto, não significaria perda de participação ou receita, já que ele centraria forças na produção do medicamento que for definido para seguir no mercado.

Há uma questão logística para também justificar o interesse real pela concorrente do mercado de genéricos. A Cimed tem um complexo industrial na cidade mineira de Pouso Alegre, que fica a apenas 200 quilômetros da paulista Campinas, onde fica a fábrica da Medley.

“Ganha este jogo quem tiver o menor custo de fabricação, a melhor distribuição e uma marca desejada. Cimed e Medley estão entre as marcas mais desejadas do Brasil”, afirma Adibe.

Além de Cimed e EMS, estão na disputa pela compra da Cimed as farmacêuticas Aché, Althaia, Eurofarma, Hypera, Torrent e União Química. Na segunda quinzena de dezembro, as interessadas vão formalizar as ofertas não vinculantes.

Entre janeiro e fevereiro, deverá ocorrer a fase de diligências e de encontros presenciais com executivos brasileiros e franceses. Se tudo seguir como o planejado, o anúncio da vencedora será feito em março.

A disputa faz sentido: o setor de genéricos faturou em 2024 R$ 20,4 bilhões e, entre janeiro e agosto deste ano, ultrapassou R$ 14 bilhões, segundo a Associação Brasileira das Indústrias de Medicamentos Genéricos e Biossimilares (PróGenéricos).

A Medley fechará 2025 com receita de R$ 1,3 bilhão e Ebitda de R$ 200 milhões. Em 2009, a Sanofi pagou R$ 1,5 bilhão à família Negrão, fundadora da empresa. Fontes do mercado dizem que a francesa planejava vender por algo em torno de US$ 1 bilhão, mas já teria entendido que o negócio seré fechado em um valor bem menor.

Mesmo com a intenção de avançar nos produtos de consumo e se tornar uma espécie de “Procter & Gamble brasileira”, a Cimed ainda tem no segmento de genéricos sua principal força de crescimento.

Nesse sentido, com olhar para a área de consumo, a empresa pisou um pouco no freio sobre a decisão do local em que pretende implementar uma fábrica para desenvolver sua linha de produção de higiene e beleza. Inicialmente, o plano era ter a cidade definida até o fim de 2025, provavelmente em um estado do Nordeste, mas o calendário mudou.

“A gente ainda não definiu. Tem havido muitas mudanças em estados relacionados à substituição tributária, como em São Paulo e Minas Gerais. Há algumas oportunidades na mesa”, diz Adibe.

Com isso, o empresário deve definir o local em fevereiro de 2026, com execução prevista para 2027. Mas, independentemente do lugar, o investimento projetado para a nova fábrica da Cimed é de R$ 130 milhões.

A Medley não será a única empresa que a Cimed pretende comprar. A perspectiva é de anunciar um M&A do segmento de higiene e beleza até o início de dezembro. A empresa ainda não revela detalhes. “Fomos a única empresa que se movimentou para valer em 2025”, afirma o empresário.

Caneta amarela virá de fora

No plano de crescimento para 2026, o dono da Cimed confirma ao NeoFeed que a empresa entrará no mercado de canetas emagrecedoras a partir do segundo trimestre do próximo ano, quando expirar a patente da semaglutida no Brasil, mas em um modelo diferente do que havia planejado inicialmente.

Ao contrário do que devem fazer algumas farmacêuticas brasileiras, como a própria EMS, a Cimed agora pretende licenciar o produto do exterior, a partir de uma parceria com uma farmacêutica estrangeira, e vender a caneta emagrecedora “amarela”, como o empresário já chamou, no País.

“Vou trazer o produto pronto. Não temos tecnologia para produzir. Vou fazer parceria com uma farmacêutica que não está no Brasil”, diz Adibe, que ainda não conta de que região será essa indústria nem o plano de negócios para o medicamento no País.

Sobre a liraglutida, que teve a exclusividade encerrada no ano passado, Adibe afirma que não está nos planos da Cimed a comercialização desse produto, até pela proximidade da liberação do ‘Ozempic genérico’.

Em 25 de agosto, a Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) publicou um edital de chamamento garantindo prioridade na avaliação de registros de liraglutida e semaglutida que tenham fabricação no Brasil. Na prática, esses registros vão “pular na frente” de outras solicitações.

A decisão foi vista como uma derrota para a dinamarquesa Novo Nordisk, detentora da patente do Ozempic (que tem a semaglutida como princípio ativo), que expira em março de 2026.

Na ocasião, a Anvisa informou que já havia pelo menos nove pedidos sobre semaglutida e sete de liraglutida em andamento, ainda sem prazo de conclusão. Mas fontes ouvidas pelo NeoFeed afirmam que já há 13 solicitações para produção de semaglutida a partir do ano que vem. Nenhuma aprovação ainda foi concedida.

Relatório recente do BTG Pactual mostra que o mercado de canetas emagrecedoras no Brasil já alcança receita entre R$ 6 bilhões e R$ 7 bilhões. Para 2026, a projeção é de chegar a R$ 9 bilhões.

Feirão milionário

Segundo Adibe, a farmacêutica planeja chegar ao fim de 2025 com um faturamento de R$ 4,5 bilhões, o que significará um crescimento de 25% sobre os R$ 3,6 bilhões alcançados em 2024. Até outubro, a empresa alcançou receita de R$ 3,3 bilhões.

Isso significa que a Cimed precisará faturar R$ 1,2 bilhão em dois meses. Para o empresário, a meta é totalmente possível de ser alcançada. “Vamos atingir o melhor bimestre da nossa história, com uma ação forte de vendas tanto de medicamentos quanto na área de higiene e saúde”, diz ele.

Até sexta-feira, 7 de novembro, a Cimed projeta garantir pelo menos R$ 300 milhões para o caixa, a partir do inédito programa "feirão yellow friday", que começou na quinta-feira, 6 de novembro, para atender fornecedores, como redes varejistas farmacêuticas. Na prática, a ação deve garantir, sozinha, pelo menos 25% do que a companhia projeta de receita para novembro e dezembro.