Após ser alvo de intrigas e de uma investigação secreta interna por má gestão até então desconhecida, o indiano Ashwani Gupta, diretor de operações da Nissan, que chegou a ser apontado como futuro CEO da montadora japonesa, deverá deixar a empresa nos próximos dias.

A revelação, feita na quinta-feira, 15 de junho, pelo jornal britânico Financial Times, se confirmada, deverá colocar um ponto final numa disputa interna que vinha se arrastando desde abril no alto comando da Nissan.

A eventual saída de Gupta deverá facilitar a normalização da aliança da Nissan com a francesa Renault, iniciada em 1999, em meio à maior crise de governança na montadora desde a saída turbulenta do CEO brasileiro Carlos Ghosn, em 2018.

O destino de Gupta parecia selado desde maio, quando a montadora japonesa anunciou que o executivo não seria reconduzido ao conselho de administração da Nissan ao final de seu mandato, que expira no próximo dia 27. Na época, os constantes atritos de Gupta com o CEO da Nissan, Makoto Uchida, e também com a Renault foram citados como decisivos.

O desgaste teve início em janeiro, quando as duas montadoras concordaram em refazer a aliança, com a Renault reduzindo sua participação na Nissan de 43% para 15%. Gupta sempre se opôs às concessões exigidas pelo lado francês em troca da redução de sua participação na Nissan.

Outras revelações do jornal britânico, porém, indicam um verdadeiro cerco para forçar Gupta a abrir mão do cargo. Motoo Nagai, diretor externo que chefia o comitê de auditoria da Nissan, por exemplo, apresentou várias reclamações internas contra Gupta.

Algumas queixas não foram investigadas quando foram feitas pela primeira vez, há cerca de um ano, mas ressurgiram em abril, como parte de uma campanha para arquitetar a saída do indiano que teria a anuência (ou omissão) do CEO Uchida.

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Makoto Uchida, CEO da Nissan

Em um comunicado, a Nissan disse ao Financial Times que “terceiros independentes foram contratados para verificar os fatos e realizar as ações apropriadas”. Gupta, Nagai e Uchida se recusaram a comentar as revelações do jornal.

Rivalidade entre executivos

Desde que Uchida e Gupta assumiram a gestão da Nissan, no final de 2019, pessoas dentro do grupo descreveram uma rivalidade acirrada entre os dois executivos.

Os aliados de Gupta pressionaram o conselho de administração da montadora japonesa em 2020 para promovê-lo ao cargo de co-CEO, esperando que ele impulsionasse a recuperação da empresa e melhorasse seu relacionamento com a Renault, mas a promoção não se concretizou.

O executivo indiano de 52 anos ingressou na Renault na Índia em 2006 e mais tarde tornou-se vice-presidente responsável por seus negócios globais de veículos comerciais. Ocupou o cargo até 2019, quando ingressou na parceira júnior da aliança, a Mitsubishi Motors, para depois ser nomeado COO da Nissan.

O cerco a Gupta, tendo a disputa com a Renault como pano de fundo, se fechou de vez quando foi negada sua recondução ao conselho de administração, juntamente com outros dois executivos. No começo do ano, Gupta foi contra a proposta de o grupo japonês assumir uma participação minoritária na Ampere, spin-off de veículos elétricos da Renault.

Ele também pressionou para garantir que a Nissan não compartilhasse sua propriedade intelectual com a Renault, a menos que as duas montadoras tivessem participações iguais. Depois de longas negociações, a Nissan concordou em assumir uma participação minoritária na Ampere em fevereiro.

Desgastado, Gupta ficou mais isolado depois que Hari Nada - ex-diretor jurídico interno da Nissan que desempenhou um papel central na expulsão de Ghosn - enviou uma carta a todos os diretores independentes em abril.

Na carta, Nada, que atualmente é conselheiro sênior, alegou que o CEO da Nissan e Takashi Nagai colocaram Gupta sob vigilância por meses. A carta, cujo conteúdo foi descrito ao Financial Times por pessoas com conhecimento de seus detalhes, afirmava que o CEO Uchida estava cooptando funcionários do entorno de Gupta para fornecer informações que poderiam ser usadas contra ele.

Com o fantasma de Ghosn ainda rondando o alto comando da Nissan, a saída de Gupta da montadora japonesa deverá ser anunciada provavelmente  na reunião do novo conselho de administração, na próxima semana.