Em agosto de 2022, Paulo Camargo deixou o comando da Arcos Dorados no Brasil e assumiu como CEO da Espaçolaser. Na época, o executivo entendeu que era preciso ir muito além de um simples “tapa no visual” para que a rede de depilação a laser voltasse a atrair os investidores.

Desde então, ele lidera um plano para recuperar a rentabilidade, as margens e as vendas, além de reduzir a alavancagem da operação. Complexa, essa repaginação ainda está em curso e à espera de um voto de confiança do mercado. E uma das suas próximas medidas foi antecipada ao NeoFeed.

A Espaçolaser está dando os toques finais em um projeto para testar a oferta de serviços de estética facial em suas unidades. Esse “facelift” no modelo da rede também vai passar pela integração das suas lojas com os pontos-de-venda da Estudioface, marca lançada pela companhia em 2017.

“Ainda vamos validar essa tese”, diz Camargo. “Mas ela pode trazer um caminho de crescimento sustentável, com maior recorrência na nossa base, novos clientes e, naturalmente, oportunidades de vendas cruzadas.”

A busca da rede por rentabilizar seus metros quadrados dialoga com o mantra de eficiência adotado desde a chegada do CEO e com uma das correções de rota feitas em sua gestão. Há um ano, ele freou a expansão da Estudioface, marca que, hoje, tem 9 unidades. Outras duas foram fechadas nesse intervalo.

“A Estudioface não foi exatamente como esperávamos”, afirma Camargo. “Mas aprendemos quais procedimentos o nosso cliente está disposto a fazer conosco, os serviços que têm melhores margens e aqueles que têm menor intercorrência.”

A companhia ainda estuda quais ofertas serão incluídas no piloto. O portfólio da Estudioface envolve serviços como preenchimento facial, aplicações de botox, harmonização facial, peeling químico e tratamento capilar.

Em fase final de preparação, o projeto terá início neste segundo semestre. Até o fim do ano, o plano é testá-lo em sete unidades da Espaçolaser, tanto em lojas próprias como em franquias em diferentes praças do País.

“Há dois exemplos em São Paulo, nos shoppings Iguatemi e Top Center, em que as lojas das duas marcas ficam uma ao lado da outra”, diz Camargo. “No projeto-piloto, as paredes que separam essas unidades vão cair.”

Caso os racionais do projeto sejam confirmados nos testes, a Espaçolaser planeja começar a escalar o formato a partir de 2024. A base disponível para essa tração envolve 771 lojas no Brasil, sendo 574 próprias e 197 franquias.

Cidades e prazos menores

Esse mix de lojas ajuda a explicar a crise da rede. Em 2021, após captar R$ 2,6 bilhões em seu IPO, o grupo deu velocidade à recompra de franquias, que já vinha em curso. A visão era de que o modelo, que resultou em 100 acordos naquele ano, era o ideal para ampliar seus retornos.

A combinação de fatores como a piora no cenário macroeconômico, a escalada dos juros e a queda na demanda, especialmente com a forte presença da rede junto às classes C e D, fez, entretanto, com que o consumo de caixa, os custos, as perdas e o endividamento da empresa crescessem substancialmente.

No segundo trimestre de 2023, por exemplo, apesar de uma evolução, em base anual, de 31,9%, a companhia encerrou o período com R$ 208,3 milhões na linha de caixa e equivalentes.

A concorrência também cresceu, com o avanço de nomes como a ViaLaser e de players menores e locais. E, assim como a rede tem Xuxa Meneghel entre seus acionistas, parte da ascensão dos rivais veio na trilha de celebridades como Ana Hickman (Mais Laser) e a atriz Giovanna Antonelli (GioLaser).

A Estudioface tem 9 unidades no País

Nesse contexto, as vendas e margens da empresa registraram quedas consecutivas, assim como suas ações. Do preço de R$ 17,90, no IPO, os papéis despencaram para menos de R$ 3 a partir do fim do primeiro semestre de 2022.

A rede já tinha começado a inverter a roda e concentrar sua expansão via franquias quando Camargo chegou e deu ainda mais fôlego a essa orientação. No primeiro semestre de 2023, a Espaçolaser inaugurou 16 unidades, todas franquias. Em contrapartida, encerrou as operações de 15 lojas próprias.

Embora não revele uma projeção de aberturas, Camargo ressalta que o mercado brasileiro de depilação a laser ainda é pouco penetrado e comporta, pelo menos, três mil lojas. Com quase 800 unidades, a Espaçolaser está descendo a régua para ampliar sua fatia nesse mapa.

“Antes, apenas as cidades acima de 100 mil habitantes interessavam”, diz. “Derrubamos essa tese e já validamos municípios com mais de 70 mil habitantes. Agora, vamos começar a pilotar naquelas com mais de 50 mil.”

A Espaçolaser também reduziu seu quadro, de 7,2 mil funcionários, há um ano, para 6,8 mil profissionais, e tem renegociado aluguéis e prazos com fornecedores. Em paralelo, vem tentando gerar mais visitas às suas clínicas, com descontos e promoções.

“A estratégia é atrair essa experimentação e aumentar os volumes”, afirma. “Em média, 20% dos clientes que compram essas sessões promocionais adquirem novos pacotes, a preços normais, nos 60 dias seguintes.”

Numa lógica inversa, a empresa vem atacando outro ponto que tem afetado seu balanço: o prazo médio de pagamento concedido na compra dos pacotes de depilação. Esse foi um dos focos do segundo trimestre de 2023, mas o CEO reconhece que a rede foi com muita sede a esse pote.

“O prazo saiu de 14 para 13 meses e, em um dos meses, chegou a 11,5 meses. Mas fomos rápidos demais e acabamos deixando algumas vendas na mesa”, afirma Camargo.

O principal impacto veio na linha de same store sales, que, entre abril e junho, registrou um ligeiro avanço de 0,4% sobre igual período um ano antes. O indicador mostrou uma forte desaceleração frente aos crescimentos de 18,8% e 8,7% apurados nos dois trimestres anteriores.

Camargo ressalta que a ideia é calibrar a estratégia de redução dos prazos com o uso de mais tecnologia e uma abordagem mais personalizada, levando em conta os “diferentes tamanhos” de bolso dos clientes.

Resultado misto

O número tímido de same store sales foi a principal razão para a queda de 9,55% das ações em 11 de julho, após a empresa divulgar uma prévia dos dados operacionais do segundo trimestre.

Na segunda-feira, 14 de agosto, a divulgação do balanço consolidado foi seguida por sinais de recuperação. Desde então, as ações acumularam alta de 5,4%, fechando a quarta-feira, 16 de agosto, cotadas em R$ 1,47. No ano, os papéis da companhia, avaliada em R$ 531,2 milhões, registram valorização de 10,5%.

No trimestre, a rede registrou lucro líquido ajustado de R$ 2,3 milhões, revertendo a perda de R$ 23,6 milhões, um ano antes. O Ebitda ajustado cresceu 131,3%, para R$ 56,4 milhões, e a margem Ebtida ajustada evoluiu de 11,3% para 23,9%.

Com um preço-alvo de R$ 1,30 para o papel, o Goldman Sachs ressaltou o resultado misto, ainda com efeitos da demanda fraca, mas com melhoras na rentabilidade da operação.

“O Ebitda ajustado ficou amplamente em linha com as nossas expectativas (e acima do consenso), impulsionado principalmente pelo controle mais rígido de despesas”, escreveram os analistas Irma Sgarz, Felipe Rached e Gustavo Fratini.

No trimestre, a empresa reduziu sua dívida líquida em R$ 96,1 milhões, para R$ 611,9 milhões. Já a alavancagem foi de 2,6 vezes, contra 3,1 vezes, um ano antes.

O indicador veio abaixo do patamar de 3,5 vezes, fixado nos covenants da emissão de debêntures que integrou o processo de aumento de capital, de R$ 225 milhões, e de reestruturação da dívida da rede, concluído em outubro.

Embora não entre em detalhes, Camargo observa que a empresa já mantém conversas para avançar mais nessa esfera. “Estamos estudando outras alternativas de revisitação do perfil dessa dívida e, nos próximos meses, devemos ter novidades.”