No próximo dia 28 de abril, os acionistas da Light estão convocados a participar de uma assembleia geral ordinária e extraordinária (AGO/E) para decidir, entre outros pontos, sobre o plano de recuperação da empresa de geração, distribuição e comercialização de energia elétrica.
Em 119 páginas, a proposta da administração da companhia é pública e disponibiliza tudo o que será votado pelos detentores das ações. E um ponto, especificamente, preocupa o pool de credores: a possibilidade dos diretores ficarem milionários com o sucesso do corte da dívida.
Na página 109 do documento, o item opções de compra de ações deu um choque nos credores. Basicamente, se o plano de recuperação for aprovado em assembleia e os gestores conseguirem cortar a dívida da companhia, eles terão direito a adquirir até 5% de ações da Light por R$ 0,01.
Na sexta-feira, 14 de abril, a ação da Light encerrou o pregão cotada a R$ 2,03, com o valor de mercado de R$ 750 milhões. Nas condições atuais, caso obtenham sucesso no corte das dívidas, os administradores teriam direito a adquirir, aproximadamente, R$ 37,5 milhões em ações por R$ 185 mil com lock-up de um ano.
“Hoje, como credor, eu não me sinto confortável para sentar e negociar. Os administradores têm um incentivo muito grande”, diz uma fonte dos credores em conversa com o NeoFeed.
Outro credor seguiu a mesma linha: “É OK ter um plano de opção de compra de ações. Mas o futuro da empresa está em jogo e do outro lado está alguém que vai ficar milionário se conseguir me prejudicar”.
Nesse caso, os credores estão de mãos atadas. Eles não participam da assembleia de acionistas e acreditam que “ninguém chegará à página 109 do documento”.
Relação desgastada
A publicação da proposta da administração no site de relações com investidores em 3 de abril é o último ato de uma relação que já estava desgastada.
No quarto trimestre do ano passado, os credores sabiam que a Light apresentaria um prejuízo bilionário naquele exercício e que precisaria renegociar suas dívidas para passar pelo ano de 2023.
A companhia encerrou 2022 com um prejuízo de R$ 5,6 bilhões, resultado bastante impactado pela determinação da Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel) da devolução dos créditos fiscais relacionados à cobrança indevida de PIS/Cofins dos consumidores finais. O endividamento total da companhia foi de R$ 9 bilhões, um aumento de 22,8% ante 2021.
Mesmo nesse cenário, os credores não viam uma situação fora de controle. Em dezembro, antes do caso Americanas vir à tona e fechar a torneio do crédito corporativo, a Light conseguiria renegociar as dívidas e com bancos, gestores e fundos.
Mas, segundo pessoas próximas que relataram para o NeoFeed, o time formato pelo CEO Octavio Pereira Lopes, que assumiu em agosto de 2022, fechou as portas para qualquer conversa.
“Essa gestão tinha condição de rolar a dívida, mas contrataram a Laplace antes de qualquer conversa e não quiseram falar conosco”, diz a fonte.
Em entrevista ao Pipeline, Lopes argumenta ter “engatado conversas com credores, mas temos uma base pulverizada de credores, alguns já reunidos em grupos, mas há milhares de pessoas físicas detentoras de debêntures. Entendemos que chamar assembleias individuais de cada série ia levar três, quatro meses, a gente não ia chegar num waiver a tempo. Sem uma medida judicial, alguém ia puxar uma carta do castelo antes.”
Procurada, a Light não se manifestou até a publicação desta reportagem.