O saudoso presidente da Câmara Ulysses Guimarães (1916-1992) cunhou uma expressão eternizada no mundo da política. “Jabuti não sobe em árvore. Se está lá, ou foi enchente ou mão de gente”. Toda vez que uma emenda aparece de última hora em uma Medida Provisória, já se sabe: eis o jabuti.
Pois um deles está deixando até banqueiros que poderiam ganhar dinheiro com isso de cabelo em pé. Trata-se de uma emenda incluída de última hora – decerto “por mão de gente” – em uma Medida Provisória sancionada semana passada pelo presidente Jair Bolsonaro.
A MP estabelece que a margem de empréstimos consignados para aposentados e pensionistas do INSS passe de 40% a 45% e a possibilidade de ter mais um cartão de crédito. A decisão vem em um momento em que grande parte da população está endividada e os bancos cada vez mais preocupados com os índices de inadimplência.
Dados da Pesquisa de Endividamento e Inadimplência do Consumidor (Peic), da Confederação Nacional do Comércio de Bens, Serviços e Turismo (CNC), divulgada na segunda-feira, apontaram que o endividamento das famílias chegou a 78% em julho. Trata-se de um recorde desde que essa pesquisa passou a ser realizada há mais de uma década.
“Essa margem passar para 45% é um excesso”, diz ao NeoFeed um banqueiro que preferiu não se identificar. “Vai ter muita inadimplência”, afirma. Outro banqueiro com o qual o NeoFeed conversou diz há um pouco de exagero.
“Os grandes bancos não querem porque é uma operação que não dá lucro para eles e bancos menores, que dominam o mercado, estão preocupados em perder espaço para outros players que possam entrar com mais agressividade”, afirma.
O fato é que o deputado federal Jeronimo Goergen (PP-RS), relator da lei da Liberdade Econômica e presidente do Instituto Liberdade Econômica, viu o jabuti dos 45% e resolveu agir. Como o governo federal enviou uma nova MP com temas que envolvem o consignado, ele aproveitou para mandar uma emenda para alterar a margem.
“Querem dar dois cartões, não tem problema. Mas o limite tem de ser 40%”, diz Goergen ao NeoFeed. “Colocaram esses 45% na calada da noite”, diz ele. E prossegue. “Se os bancos, que concedem o crédito, estão preocupados com algo que pode fazer com que ganhem mais dinheiro, há alguma coisa errada aí.”
A discussão vem na esteira de um aumento de pressão do governo para injetar mais dinheiro na mão da população às vésperas da eleição presidencial em outubro. No início dessa semana, em encontro com a Febraban, o presidente Jair Bolsonaro apelou para que os bancos dessem crédito consignado para os beneficiários do Auxílio Brasil.
Mesmo diante do pedido, as maiores instituições financeiras privadas já disseram que não vão conceder esse crédito. Elas querem tirar o jabuti da sala.