Um sentimento contraditório ronda o mercado financeiro dos Estados Unidos. Por um lado, o Federal Reserve (Fed), o banco central dos EUA, deverá aumentar as taxas de juros esta semana, em meio ao ciclo de aperto monetário mais agressivo visto no país em quatro décadas. Por outro, há um otimismo indisfarçável com a queda da inflação e outros indicadores positivos.
A expectativa é de uma virada de jogo no segundo semestre, em especial no ressurgimento das ofertas públicas iniciais (IPOs), que caíram em meio à escalada dos juros do Fed nos últimos 18 meses. Até esta segunda-feira, 24 de julho, foram registrados 87 IPOs no mercado de ações dos EUA -- 32,56% a menos que no mesmo período de 2022, que teve 129 IPOs.
E 2022 já havia sido um ano pouco alentador: excluindo as SPACs, as ofertas públicas iniciais arrecadaram US$ 154 bilhões em 2022, uma queda de 65% em relação ao recorde de 2021, de acordo com o provedor de dados Dealogic.
O otimismo de uma retomada cresceu nas últimas semanas, quando as principais barreiras para o ressurgimento dos IPOs foram levantadas.
À parte a queda da inflação (que saiu de um patamar de 9,1% ao ano em junho do ano passado para 3% doze meses depois), o mercado de ações nos EUA voltou a subir em direção a novas máximas de 52 semanas e a volatilidade caiu. Além disso, os investidores voltaram a fazer apostas especulativas, sintoma de que os IPOs devem recuperar a força perdida.
Parte desse otimismo se deve ao fato que o longo ciclo de juros altos e inflação alta levaram muitas startups a fazerem o que dois anos atrás parecia impensável: cortar custos e perseguir uma meta de lucratividade num curto período.
Isso é um atrativo que empurra o fluxo de empresas de olho nas ofertas dos EUA para um patamar mais elevado do que antes da desaceleração da economia. A dúvida, apontada por especialistas de mercado, é se empresas e startups estão dispostas a ir para o IPO num momento de alguma incerteza na economia. Isso faz com que o principal fator a restringir o mercado de IPOs não seja a demanda, mas a oferta.
Negócios à vista
É neste cenário turvo que o mercado aguarda a temporada de IPOs do segundo semestre, a partir de setembro, após o final do período de férias de verão nos EUA.
A expectativa maior, por enquanto, é em relação ao IPO da Arm, empresa britânica de chips, que pretende listar ações em meados de setembro. A Arm provavelmente visará uma avaliação de mais de US$ 50 bilhões.
Outros IPOs previstos animam os investidores. A plataforma de automação de marketing Klaviyo, avaliada em US$ 9,5 bilhões em uma rodada de financiamento privado em 2021, está se preparando para estrear também em setembro.
Outras duas empresas que demonstraram intenção de abrir capital estão na mira de agentes. O mercado de compartilhamento de carros Turo e a Instacart, aplicativo que opera serviço de entrega de compras de supermercado, devem fazer IPO até o final do ano.
O consenso entre agentes, no entanto, é que os IPOs do segundo semestre não voltem aos níveis alcançados em 2020 e 2021. Durante esses anos, as startups não lucrativas correram para listar suas ações nos EUA, pois os investidores as recompensaram com altas avaliações.
O apelo dos IPOs é que, embora as empresas possam não ganhar dinheiro no momento de suas ofertas, podem gerar lucros consideráveis ao longo do tempo. Como as taxas de juros pairaram perto de zero em 2020 e 2021, fazia sentido que os investidores pagassem um prêmio pelo potencial de grandes retornos futuros.
No final de 2021, porém, os bancos centrais sinalizaram que aumentariam as taxas de juros. As empresas que prometiam grande crescimento, mas tinham pouco ou nenhum lucro atual, tornaram-se menos atraentes e o mercado de IPO quase parou. A incerteza em relação ao futuro da economia americana também levou empresas visadas por investidores a adiarem seus IPOs.
É o caso da fintech Stripe, que arrecadou mais de US$ 6,5 bilhões de forma privada no início deste ano, e a Reddit – rede social que funciona como comunidade de fóruns onde os usuários podem votar no conteúdo. Ambas não planejam listar suas ações, por enquanto.