Três meses após assumir o controle da operação do KFC no Brasil, a companhia Kentucky Foods Chile quer levar o frango frito empanado para as ruas e mudar a lógica do plano de crescimento até aqui. Hoje, das 233 lojas no País, apenas oito estão em vias públicas. As demais 225 estão instaladas em shopping centers.
É esse desequilíbrio de 3,4% contra 96,6% que o CEO Otávio Pimentel vai começar a mudar nos próximos meses. O plano é abrir de 50 a 60 lojas por ano a partir de agora, o que daria uma média de pelo menos uma nova unidade KFC no Brasil por semana. E, em cinco anos, inverter a lógica do cenário atual, fazendo com que 90% dessas novas unidades sejam em ruas.
“Há um limite de shoppings-alvo que fazem sentido para a nossa operação. Uma vez que estamos nos principais do Brasil, se seguirmos nessa linha iremos para centros com menos movimento, o que vai afetar a venda média por loja”, diz o CEO do KFC Brasil, em entrevista ao NeoFeed.
O racional dessa mudança está no fato de que unidades fora dos centros de compras, principalmente em regiões com grande fluxo de pessoas, têm quase o dobro de rentabilidade das instaladas em shoppings (atualmente, em média, R$ 400 mil por loja). E elas vendem, aproximadamente, de uma vez e meia a duas vezes mais.
Ainda que sejam mais rentáveis, as lojas de rua custam bem mais. Enquanto, em média, a construção de uma unidade de shopping necessite de aportes entre R$ 2 milhões e R$ 3 milhões, uma unidade de rua sai entre R$ 5 milhões e R$ 6 milhões.
A meta é crescer esse volume aos poucos. No ano que vem, por exemplo, a tendência é de que somente 70% sejam em shoppings, reduzindo esse índice ano a ano. Com isso, a companhia espera alcançar a marca de cerca de 500 lojas do KFC no Brasil até 2030.
A companhia não revela o montante exato de investimentos por ano, mas tomando como base a perspectiva de volume de até 60 aberturas em 2026, dos quais 30% serão em ruas, a estimativa de capex será entre R$ 170 milhões e R$ 230 milhões no ano que vem.
Das atuais oito lojas de rua no País, cinco estão no estado do Rio de Janeiro (quatro na capital e uma em Duque de Caxias) e três no estado de São Paulo (em Campinas, em São Bernardo do Campo e uma na Rua 25 de Março, na capital).
Na média, essas oito lojas de rua alcançam receita mensal cerca de 70% acima do valor obtido pelos restaurantes do KFC instalados nos shopping centers do Brasil, o que representa algo em torno de R$ 680 mil. “Isso apesar de ser uma marca que não é muito conhecida no País. Com mais aberturas, isso beneficia todo o ecossistema da rede.”
Know-how operacional
Pimentel, que foi vice-presidente da rede Popeyes, da Zamp, chegou ao grupo no fim de junho, no momento da conclusão da venda, por parte da International Meal Company (IMC), dona das marcas Frango Assado, Pizza Hut e Viena, de 58,3% das ações do KFC Brasil por US$ 35 milhões, ao grupo equatoriano Serrano, que é dono da Kentucky Foods Chile.
Com a criação de uma joint-venture, a IMC ainda ficou com pouco mais de 40%, mas sem o controle operacional nem as decisões sobre futuros investimentos. A tendência é de que, em até cinco anos, esse percentual caia para 15%, a partir dos aportes realizados pela subsidiária chilena do KFC.
O novo comprador opera no Equador, Venezuela, Colômbia, Argentina e Chile (quando chegou em 2018). Sob a ótica de quantidade de lojas, o KFC Brasil passa a ser a maior operação do grupo equatoriano, mas, em faturamento, a venda média dos demais países é superior.
No Equador, por exemplo, o volume de vendas é três vezes superior ao do Brasil. No Chile, com 150 lojas, é duas vezes maior. A ideia, então, é fazer com que, em um médio prazo, as lojas brasileiras tenham a rentabilidade das unidades do KFC na América Latina.
“Com o mercado consolidado nestes outros países, chega uma hora que o crescimento começa a desacelerar. No Brasil, cabe esse volume de aberturas de mais de 50 por ano, o que não é a realidade na Colômbia ou Equador, por exemplo”, diz Pimentel.
“É trazer o nosso know-how para um país no qual o KFC tem uma penetração relativamente baixa e com muitas oportunidades para crescer”, complementa.
O raciocínio do executivo de que há uma grande avenida de crescimento faz sentido. Mas ele enfrentará no Brasil, seja em shopping ou em rua, uma grande disputa pelo mercado de concorrentes consolidados.
Controlado pelo grupo Arcos Dorados, o McDonald’s conta hoje com 1.020 lojas no País, quase cinco vezes mais do que tem a rede de frango frito. A rede carioca Bob’s tem 1.070 unidades. O Burger King tem 959 unidades e o Subway, 1.518 (ambos da Zamp).
“Essas marcas estão, de fato, na cabeça do brasileiro. Elas chegaram antes, mas há espaço para outras, principalmente pela enorme dimensão do País. Para se ter uma ideia, no Reino Unido tem mais de 1 mil lojas KFC, com muito menos habitantes [cerca de 69 milhões]”, afirma Pimentel.
Exatamente pela pouca presença de rua, com apenas uma loja de rua na principal cidade do Brasil, por exemplo, o crescimento geográfico terá várias direções, em todas as regiões. Hoje, das 233 lojas, um terço delas está no estado de São Paulo.
“Existe uma indústria que busca bons espaços nas ruas, como redes de farmácias, conveniências e minimercados. É necessário encontrar essas oportunidades. Salvo a Região Norte, em que há uma complexidade logística maior, nas demais temos o mesmo interesse”, afirma o CEO do KFC Brasil.
Frango brasileiro na América Latina
Não é só o know-how, com a experiência adquirida nos demais países latinos, que o dono do Kentucky Foods Chile quer aproveitar no Brasil. O objetivo é também garantir maior sinergia da operação, principalmente em supply chain.
Terceiro maior produtor de carne de frango no mundo (atrás apenas dos Estados Unidos e China) e maior exportador global, o Brasil pode servir de hub para a compra da principal matéria-prima dos restaurantes do KFC.
Somente nas lojas brasileiras, o volume mensal é de 1 mil toneladas, totalizando 12 mil toneladas ao ano. Somando todas do grupo equatoriano, essa conta ultrapassa 10 mil toneladas por mês (ou 120 mil toneladas/ano).
“Nossa cadeia de compras muda. A IMC tinha o time dela e estamos mudando esse processo. A gente começa a ter algumas vantagens pela enorme escala do produto. Ajuda muito poder comprar para três ou quatro países”, afirma Pimentel.
O Brasil fornecia pouca quantidade para a rede no Chile, mas não era representativo. Com o crescimento a partir das novas lojas, o volume anual de compras de carne de frango no Brasil deve girar entre 15 mil toneladas e 18 mil toneladas.
Com essa sinergia, o frango brasileiro poderá ser o principal insumo nos outros cinco países em que o grupo Serrano opera. A empresa não revela qual é o fornecedor.
Segundo balanço do segundo trimestre reportado pela IMC, o KFC Brasil registrou receita de R$ 271 milhões, alta de 34,2% sobre os R$ 202 milhões do segundo trimestre de 2024. Em relação às mesmas lojas, o crescimento no trimestre é de 15,5%, em comparação com a mesma base do ano anterior.