Em novo e bilionário capítulo na disputa tecnológica entre China e Estados Unidos, uma fabricante chinesa de chips fundada por um ex-executivo da Nvidia viu na sexta-feira, 5 de dezembro, suas ações se valorizarem 425% em relação ao preço inicial em sua estreia no Star Market de Xangai, voltado para empresas de tecnologia, tornando-se o segundo maior IPO da China continental neste ano.

A Moore Threads, com sede em Pequim, arrecadou 8 bilhões de yuans (US$ 1,13 bilhão) com a valorização do preço inicial da oferta pública de seus papéis durante o pregão. O resultado reflete a expectativa chinesa de reduzir a dependência do país em relação à Nvidia, gigante americana de tecnologia, para suas necessidades de inteligência artificial.

Parte do sucesso da estreia da Moore Threads na bolsa de Xangai se deve menos ao potencial tecnológico imediato de seus chips e mais à expectativa chinesa de criar uma cadeia de suprimentos local de componentes cruciais para o boom da IA que não dependa de fornecedores americanos de chips.

Desde 2022, quando os Estados Unidos proibiram a Nvidia de vender seus processadores de IA mais avançados na China, o governo chinês instruiu suas empresas de tecnologia a abandonarem esses produtos.

Fundada em 2020 por Zhang Jianzhong, um ex-executivo sênior da Nvidia na China, a Moore Threads é vista como uma fabricante nacional de chips de segunda linha, ficando muito atrás da Huawei e da designer de chips Cambricon em participação de mercado.

A empresa, agora listada, vinha acumulando prejuízos e obteve aprovação acelerada para abrir capital após os reguladores terem flexibilizado, este ano, os requisitos de rentabilidade para companhias que buscam IPO no Star Market, em um esforço para impulsionar a captação de recursos para setores estratégicos.

A Moore Threads é a primeira de uma série de fabricantes de chips de IA que devem abrir capital em Hong Kong ou na China continental. A MetaX recebeu recentemente aprovação para listar suas ações no Star Market de Xangai. A Biren e a Enflame também planejam abrir capital em Hong Kong.

Apoiada pela firma de capital de risco HongShan, anteriormente Sequoia Capital China, a Moore Threads projeta unidades de processamento gráfico, inicialmente para jogos, mas agora adaptadas para o treinamento de grandes modelos de linguagem usados em IA — uma trajetória semelhante à da Nvidia.

Em contrapartida, a Huawei e a Cambricon desenvolvem principalmente chips de circuitos integrados de aplicação específica (ASIC), que foram originalmente otimizados para aplicações de visão computacional mais restritas antes de serem reestruturados para trabalhos de IA generativa.

Supervalorização

Para se ter uma ideia da supervalorização das ações da Moore Threads em sua estreia na bolsa chinesa, o mercado estima que a empresa deverá vender cerca de US$ 60 milhões em chips este ano, uma ninharia frente aos US$ 10 bilhões que Huawei e Nvidia, individualmente, devem colocar no mercado.

Até 2026, prevê-se que as vendas da Huawei aumentem para US$ 12 bilhões, representando cerca de metade do mercado de chips de IA da China, enquanto a tecnologia Moore Threads deverá gerar modestos US$ 93 milhões.

A Nvidia, por sua vez, que hoje responde por 40% do mercado chinês, deve desacelerar sua participação para 8% em 2026, devido às restrições impostas pelos EUA, passando a fornecer apenas US$ 2 bilhões ao país asiático.

O governo americano proibiu a venda dos processadores de IA mais avançados da Nvidia para a China em outubro de 2022, quando o Departamento de Comércio impôs restrições ao H100 e outros chips de ponta. O objetivo era limitar o acesso chinês a tecnologias críticas de IA que poderiam ser usadas em aplicações militares e de vigilância.

Em outubro de 2023, as regras foram ampliadas para incluir também os modelos A800 e H800, que eram versões adaptadas para contornar as primeiras restrições. A medida afetou não só a Nvidia, mas também fabricantes como AMD e Intel, além de fornecedores de equipamentos de fabricação de semicondutores.

Este ano houve escassez de chips de IA fabricados na China devido à capacidade limitada das fábricas nacionais. A Moore Threads foi adicionada à lista de entidades dos EUA em outubro de 2023, o que lhe cortou o acesso à Taiwan Semiconductor Manufacturing Company (TSMC), que produz a maior parte dos chips de IA do mundo.

Desde então, a empresa transferiu a produção para a Semiconductor Manufacturing International Corporation (SMIC), uma contratada da China continental, que apresenta menor rendimento de chips e processos de produção mais caros. Com os aportes de estreia, a Moore Threads deve agora investir na melhoria tecnológica de seus chips.