Já atribulada, a agenda de Fernando Soares, CEO da rede de pizzarias Domino’s no Brasil, se tornou ainda mais intensa nas duas últimas semanas. Com poucas horas de sono, ele tem dividido seu tempo entre as telas e dados que monitoram a operação e as visitas a lojas em São Paulo, Rio de Janeiro e Belo Horizonte.

Por trás desse roteiro está um projeto que vem sendo preparado há seis meses e que acaba de sair do forno: a virada no cardápio da empresa, que passa a oferecer a possibilidade de o consumidor personalizar sua pizza com os ingredientes de sua preferência.

Com o foco de atrair novos clientes e ampliar, literalmente, as receitas, a nova alternativa ainda está em fase de soft launch. mas alguns números dão um sabor das opções presentes nesse menu. Os clientes têm 18 ingredientes e mais de 7,3 mil combinações possíveis à disposição.

Esse é mais um passo da Domino’s rumo ao que o mercado acredita ser um número mágico, R$ 1 bilhão de faturamento, cifra que seria fundamental para um eventual IPO da rede que, em 2020, último dado público, apurou uma receita de R$ 455 milhões. Além dessa frente, a empresa vai lançar um clube de assinatura e está testando novos formatos para expandir sua base de lojas.

“Nós percebemos que as vantagens que tínhamos, de tecnologia, de delivery, não se sustentariam, pois o mercado está fechando esse gap”, diz Soares, ao NeoFeed. “E decidimos mudar o cardápio por entender que, nesse momento, poucos players podem entregar esse nível de customização.”

Fruto de um aporte de R$ 7 milhões, o modelo começa com uma oferta de R$ 32,90, que inclui queijo e mais dois ingredientes. A partir dessa opção, o cliente pode adicionar outros itens e escolher, por exemplo, se quer mais ou menos molho, o tamanho da pizza e o tipo da massa.

O preço varia conforme o acréscimo desses itens. Segundo Soares, a expectativa é de que o consumidor mostre apetite por pedidos mais recheados e próximos do tíquete médio atual da rede, de R$ 66.

Na outra ponta dessa oferta, um dos elementos que exigiram mais atenção é o que acontece atrás do balcão. Com entregadores próprios e o apoio de automação e inteligência artificial, a Domino’s tem uma média de 25 minutos entre o pedido e a entrega da pizza nas mãos ou na casa do consumidor.

Nesse modelo, os ingredientes têm uma quantidade exata e cada etapa da preparação é cronometrada, com uma sequência a ser cumprida. Como o novo formato subverte essa lógica, mais de 90% das 300 lojas - sendo 213 delas franquias - passaram por treinamentos online e presenciais.

“Esse modelo aumenta a satisfação do cliente, mas gera desafios operacionais, pois a Domino’s já tem um nível de produtividade e um fluxo padronizado”, diz Cristina Souza, CEO da consultoria Gouvêa Food Service. “Mas, vencida essa barreira, a aposta deles vai fazer barulho e gerar reação no mercado.”

Do ponto de vista de tecnologia, a virada foi facilitada por um investimento feito em 2019, um ano depois de o fundo Vinci Partners assumir a operação. Na época, a Domino’s trocou sua plataforma online e implantou um sistema que integra os dados de todas as suas lojas.

“Nós sabemos exatamente todos os itens mais vendidos e o estoque de qualquer loja, em qualquer cidade, e monitoramos o tempo inteiro o comportamento de consumo”, diz Soares. “Toda essa mudança está sendo feita a partir desse acompanhamento, com base em dados e no histórico de vendas.”

Fernando Soares, CEO da Domino's no Brasil

O trabalho não se esgotou na preparação nos bastidores. Na noite de 22 de agosto, quando o modelo entrou no ar, a Domino’s montou um “comitê de guerra” em sua sede em São Paulo. Ao som de um DJ e alimentados, claro, por muitas pizzas, os times de diversas áreas acompanharam os pedidos sendo feitos em tempo real, a partir de telas que replicavam as operações de algumas das principais lojas da rede.

Essa abordagem segue em curso e torna possível acompanhar, por exemplo, se um consumidor desistiu de uma compra e em qual etapa específica isso aconteceu. Com esses dados, a Domino’s tem confirmado algumas de suas teses e, ao mesmo tempo, feito ajustes no modelo.

Uma das premissas revistas foi a decisão de eliminar os combos tradicionais do menu. Com três dias de operação, a rede percebeu que a opção de montar a pizza caiu no gosto dos novos clientes. Mas muitos consumidores habituais desistiam da compra ao não acharem o que estavam acostumados a pedir.

Assim, o novo modelo terá destaque no cardápio, mas haverá espaço para as ofertas tradicionais. “Estamos nesse test and learn, dia a dia”, diz Soares. Essa rotina intensa para ajustar as engrenagens seguirá, ao menos, até o dia 12 de setembro, quando a Domino’s promove outra estreia. Para comunicar e marcar o lançamento oficial do cardápio personalizado, a empresa vai veicular, pela primeira vez, uma campanha na TV aberta.

Sem distrações

Já no diálogo com o mercado, outro possível capítulo dessa trajetória veio à tona na semana passada. Em um relatório, a partir de um encontro com Soares e seus pares, o Credit Suisse destacou que a Domino’s prepara o caminho para um IPO. A oferta aconteceria após a rede superar R$ 1 bilhão em vendas.

“Essa foi uma conclusão deles e a cifra que cravaram é meio óbvia para entrar nessa dança, mas essa é uma agenda do fundo, de liquidez, que não pode passar pelo meu dia a dia”, diz Soares. “Estou mais preocupado com as nossas entregas, até porque cravar algo assim, com prazo e número, não nos ajuda. Só nos distrai.”

Essa também foi a postura adotada na fusão frustrada com o Burger King. Anunciado em julho de 2021, o acordo terminou em pizza três meses depois, quando as duas partes desistiram da transação.

“Foi uma decisão amigável e que não teve impacto, porque a negociação estava sendo feita via Vinci”, ressalta. “Não mudou nossa rotina. Dali em diante, seguimos a vida.”

Nessa trajetória, o delivery segue sendo um dos focos. Hoje, essa modalidade responde por 64% das vendas da Domino’s. Para efeito de comparação, no segundo trimestre de 2022, as entregas representaram 28% das vendas da Pizza Hut e do KFC, bandeiras do grupo IMC. No Burger King, esse índice foi de 32,6%.

Dados da consultoria Euromonitor apontam que, em 2021, o segmento que inclui restaurantes de autoatendimento e delivery movimentou R$ 3,48 bilhões no Brasil. No recorte das pizzarias, a Domino’s tem uma fatia de 17,3% do mercado. Na sequência, está a Pizza Hut, com 7%, e a Patroni, com 6%.

Soares não revela o quanto a Domino’s faturou no período. O último dado publicado se refere ao ano de 2020, quando a receita foi de R$ 455 milhões.

Em 2020, no último dado publicado pela Domino's, a rede faturou R$ 455 milhões

Além de seus canais próprios, a Domino’s segue apostando em aplicativos como iFood e Rappi como mais uma alternativa para alimentar o seu delivery e atrair novos clientes.

“Não estar nesse espaço é negligenciar uma ocasião de consumo”, diz Soares. “Mas são canais complementares e uma forma de a pessoa experimentar a Domino’s, com o diferencial da entrega ser sempre nossa.”

Se o menu personalizado e aplicativos parceiros têm como racional ser uma porta de entrada para novos consumidores, a Domino’s também tem novidades para os clientes que já estão na sua base.

A empresa criou um clube de assinatura, com lançamento previsto para outubro e que trará alternativas de preços mais acessíveis. A princípio, a iniciativa incluirá quatro planos mensais, com valores que irão de R$ 9,90 a R$ 29,90.

Em outra frente, a rede vem testando novos formatos de expansão. Um dos modelos envolve unidades compactas, de 80 metros quadrados e investimentos de R$ 750 mil. Hoje, as lojas padrão têm áreas a partir de 150 metros quadrados e demandam um aporte de cerca de R$ 1 milhão.

Uma segunda vertente passa pela conversão de pizzarias em cidades menores que, tradicionalmente, não entrariam no radar da rede. O processo mira estabelecimentos com um faturamento médio mensal de R$ 100 mil. Já são 12 lojas no estado de São Paulo e o próximo mercado a ser testado é o Ceará.

Em linha com essa expansão, que prevê ao menos 50 unidades em 2023, a Domino’s não descarta ampliar sua área de produção. Atualmente, a empresa tem uma fábrica em Itapecerica da Serra (SP) e outra em Fortaleza, inaugurada em setembro de 2021. As duas unidades fornecem as massas das pizzas para 96% das lojas da rede.

“A fábrica de Fortaleza se pagou em oito meses, contra uma projeção inicial de dois anos”, diz Soares. “O que nos dá uma perspectiva, não necessariamente de curto prazo, de verticalizar cada vez mais a nossa operação.”