A agenda de Milton Pilão, CEO da Orizon, foi bastante intensa no início de 2021. No período, ele participou de 120 reuniões com investidores, como parte do roadshow da abertura de capital da empresa de tratamento de resíduos.
O fato de o setor de gestão ambiental ter apenas uma representante na B3, a Ambipar, e de sua dinâmica ainda ser pouco conhecida pelos investidores contribuiu para que o valuation ficasse abaixo da expectativa. O que não impediu a companhia de seguir com a oferta.
Avaliada em R$ 1,6 bilhão, a Orizon abriu capital em 17 de fevereiro, levantando R$ 486,8 milhões, sendo R$ 381,3 milhões foram para o caixa da empresa. A decisão de “pagar o preço” veio do entendimento de que o IPO era o melhor atalho para a empresa alcançar outro patamar.
Oito meses depois, é hora de tornar realidade essa nova escala. A Orizon vai colocar, enfim, sua estratégia de aquisições na rua. E a largada será dada com a compra de um “pacote” de até 20 aterros sanitários, daqui até o fim de 2021, que farão a empresa duplicar sua operação.
“Como primeira empresa listada de aterros sanitários, nossa obrigação é ser um consolidador desse mercado”, afirma Pilão, ao NeoFeed. “Com o que temos no pipeline até o fim do ano, vamos dobrar nosso volume atual de 5 milhões de toneladas de resíduos sob gestão.”
Parte dessa conta será fechada com a compra de cinco empresas. Os acordos já estão em fase de diligência e incluem de 10 a 12 aterros sanitários. Pilão prevê anunciar ao menos três dessas transações até o fim do ano.
As aquisições também têm sido o mote da Ambipar que, desde o seu IPO, em julho de 2020, fechou 29 acordos. Ontem, a empresa suspendeu o IPO da Environmental ESG, unidade de gestão de resíduos, justamente por não atingir o valuation que buscava.
No caso da Orizon, as compras no radar vão reforçar uma rede atual de cinco aterros, que recebe um volume de resíduos equivalente a cerca de 20 milhões de habitantes. As unidades estão distribuídas nos estados do Rio de Janeiro, Paraíba e Pernambuco.
“Os ativos que estamos negociando tem localização complementar a essa base”, diz Pilão. “Vamos passar a operar em uma configuração nacional.”
A equação para duplicar a operação inclui ainda outros oito aterros m São Paulo, Rio de Janeiro, Goiás, Alagoas e Sergipe. A venda desses ativos integra o plano de recuperação judicial da Estre e tem data marcada.
O martelo será batido em leilão no dia 4 de novembro e a Orizon tem vantagem na disputa. No processo da recuperação judicial, além de comprarem dívidas bancárias da Estre, a empresa e a gestora Jive fizeram uma proposta vinculante pelos aterros.
Com a tacada, a dupla será a primeira proponente no certame. O consórcio levará os ativos se não houver nenhuma outra proposta e também terá direito de preferência para cobrir qualquer lance feito, além de poder usar as dívidas adquiridas como moeda no leilão.
Diante da alta fragmentação do setor, a Estre também apostou em uma estratégia agressiva de aquisições. Mas viu seu projeto fracassar com a crise econômica dos últimos anos e o envolvimento de seu fundador, Wilson Quintella Filho, nas investigações da Lava Jato.
A Orizon, por sua vez, não centra seus esforços apenas na via inorgânica. A empresa está prestes a receber o sinal verde para que mais um aterro da sua própria lavra entre em operação, em Minas Gerais.
“Temos aterros em diversas fases de licenciamento”, diz Pilão. “E, dessa frente, a ideia é ter um aterro novo a cada ano nos próximos cinco anos, sendo o de 2022 no Rio Grande do Sul.”
Enquanto toca esses planos, a Orizon vem tendo um bom desempenho no mercado de capitais. Desde o IPO, suas ações, cotadas a R$ 24,70, acumulam uma valorização de 12,3% e seu valor de mercado está em R$ 1,76 bilhão.
Nem mesmo alguns indicadores do primeiro semestre de 2021 parecem ter abalado essa performance. No período, a receita recuou 6,1%, para R$ 180,3 milhões. E a empresa reportou um prejuízo de R$ 39,1 milhões.
“A Orizon está muito bem posicionada para aproveitar as oportunidades orgânicas e inorgânicas”, diz Maira Maldonado, analista da XP, que tem recomendação de compra e um preço-alvo para a ação de R$ 30.
“O mercado de aterros tem muitas barreiras de entrada, especialmente por conta das licenças, cujo processo de obtenção leva, em média, sete anos”, afirma. “E, por ser essencial e não faltarem resíduos, é muito resiliente. Questões como PIB e crises não afetam suas receitas.”
Esse contexto positivo é reforçado por mudanças recentes na regulação, especialmente com o Marco Legal do Saneamento, sancionado em julho de 2020. Entre outras questões, ele prevê o encerramento de todos os lixões em operação no Brasil.
Desde então, mais de 600 lixões foram fechados, o que reduziu o número total a cerca de 2,6 mil unidades. Hoje, essa base recebe cerca de 40% do volume anual de 80 milhões de toneladas de resíduos gerados no Brasil.
“A estimativa é que 600 aterros substituam o volume destinado aos lixões”, diz Pilão. “É um mercado de 30 milhões de toneladas que vai passar a existir no nosso setor.”
Além da destinação
Nesse cenário, a Orizon está dando mais peso à exploração de novos negócios em seus aterros. A ideia é ir além da destinação final dos resíduos e rentabilizar ainda mais essas unidades, que têm uma vida útil, em média, de 30 anos.
“Com as aquisições, vamos criar um banco de 10 a 12 milhões de toneladas de resíduos sob gestão”, afirma Pilão. “A partir dessa estrutura, nossa segunda onda de crescimento será a criação de uma grande empresa de energia e biogás.”
A Orizon tem plantas de geração de biogás e de energia em seus aterros. “A energia gerada a partir de resíduos é a única que não depende da natureza. O lixo é gerado 24 horas por dia, 365 dias por ano”, diz Pilão. “E o governo está começando a enxergar essa oportunidade.”
Parte dessa nova visão veio à tona recentemente, conectada com outra iniciativa da Orizon, dentro do conceito conhecido como waste to energy, que envolve usinas de geração de energia a partir da queima de 100% dos resíduos.
No último dia 30 de setembro, um leilão promovido pela ANEEL para a compra de energia de longo prazo viabilizou a construção da primeira usina com esse perfil no País, fruto de uma parceria público privada da Orizon com a prefeitura de Barueri (SP), que vai demandar um aporte de R$ 500 milhões.
Prevista para 2025, a usina terá capacidade de tratar 300 mil toneladas de resíduos por ano e vai gerar uma energia equivalente ao consumo de 320 mil pessoas.
A Orizon não é a única empresa de aterros sanitários e de gestão ambiental de olho nessa tendência. A brasileira ZEG Ambiental já desenvolve projetos e multinacionais como a francesa Veolia, a americana Babcock & Wilcox e a suíça Hitachi Zosen Inova estudam investir nesse filão no País.
Desde o IPO, as ações da Orizon acumulam uma valorização de 12,3%
Na Orizon, outra área no foco é a reciclagem e a geração de combustível derivado de resíduos. A empresa está erguendo uma planta de triagem mecanizada na sua unidade de Jaboatão dos Guararapes (PE), que terá capacidade de reciclar 500 mil toneladas de resíduos por ano.
As áreas de energia e de reciclagem estão ligadas a outro projeto. No primeiro trimestre de 2022, a Orizon vai lançar uma plataforma para a venda de créditos de carbono e de reciclagem no varejo.
A empresa gera 2,5 milhões de toneladas de crédito de carbono por ano e vende esses ativos para clientes como o Banco Mundial, governos europeus e multinacionais dispostas a apagarem suas pegadas de carbono.
Todo o desenho atual da Orizon começou a ser traçado em 2013, quando a Inovatec Participações assumiu o controle da empresa. A Inovatec tem Pilão e nomes como Ismar Assaly, ex-dono da marca de pescados Gomes da Costa, entre seus sócios.
Na época, os novos sócios decidiram se concentrar na destinação e na valorização dos resíduos. Até então, a Orizon também atuava com água, esgoto e outros segmentos e etapas da cadeia.
“Temos um negócio seguro, estável e com receita perene, de longo prazo, por conta da vida útil dos aterros”, diz Pilão. “E, ao mesmo tempo, um alto potencial de crescimento por conta das outras avenidas que estamos construindo.”