O mercado brasileiro de gestão de ativos de renda variável vem passando por momentos difíceis. Desde que a taxa Selic superou a barreira dos dois dígitos, muitas assets têm encontrado dificuldades para manter as portas abertas. Com estruturas caras, é preciso superar R$ 1 bilhão sob gestão para remunerar a equipe e não correr riscos. Há, no entanto, exceções, como é o caso da Organon Capital, que detém R$ 240 milhões.

“Com um capacity de R$ 1 bilhão, R$ 1,2 bilhão temos bastante conforto na nossa estratégia”, diz Raphael Maia, fundador e CIO da Organon Capital, em entrevista ao NeoFeed.

A estrutura da gestora é enxuta. Além de Maia e de André Carvalho, diretor de relações com investidores, o time é formado por outras cinco pessoas mais um estagiário. Ao todo, o escritório comporta nove profissionais.

Com um único fundo de ações, a rentabilidade tem comprovado a tese de Maia. Neste ano, até 30 de junho, o Organon FIA acumula alta de 35,5% ante 7,61% do Ibovespa. Em 12 meses, a diferença é de 59,1% a 19,8% para a gestora. E em 36 meses o ganho do fundo é de 174% ante 24,2% do benchmark.

Embora seja um fundo sem restrições de investimento em ações, a gestora tem preferência por small caps. Maia enxerga nessas empresas de menor valor de mercado uma vantagem sobre as maiores casas de gestão.

“O fundo é um ações livre, por isso não somos obrigados a investir só em small caps. Mas o mercado é superbem coberto nas large caps”, diz Maia. “Vemos muito mais assimetria entre preço e valor nas menores do que nas grandes.”

Ele exemplifica com a Petrobras, uma ação que acumula alta de 46,5% no ano. Dentro da Organon, a pergunta feita sempre antes de uma alocação em uma empresa é se a gestora terá um diferencial competitivo em relação ao mercado.

“É muito mais fácil ter um sim [diferencial competitivo de análise] nas small caps. Sinceramente, frente à média de mercado, não tenho diferenciais na Petrobras”, diz o fundador da Organon.

Outro caso ajuda a entender essa explicação de Maia. A São Carlos Empreendimentos, com valor de mercado de R$ 1,16 bilhão, recentemente entrou para o portfólio da gestora. Com uma crise reputacional em razão do histórico com a Americanas, um investidor passou a “queimar a ação”, ou seja, vender a qualquer preço para se “livrar do problema”.

Maia e o time da Organon, que já tinha interesse no ativo, passaram a analisar a operação. Viram que a ação a R$ 12 (na época, hoje negociando em torno de R$ 20) para um valor de mercado de R$ 700 milhões não fazia sentido.

A São Carlos detinha naquele momento R$ 5 bilhões em propriedades de alto valor. Era uma oportunidade de compra com 80% de desconto. Foram conversar com o management, entenderam o que estava acontecendo e compraram o papel.

“Na nossa conta conversadora, se a São Carlos vender os prédios muito mais baratos do que valem, a ação tem de estar próxima a R$ 40 e nós compramos por R$ 12”, diz o CIO da Organon.

E complementa: “Não entramos em uma posição para ganhar 10%, 20%, 30%. Entramos para ganhar 200%, 300%, 400%. Só que, obviamente, não é em um ano. É entre, quatro, cinco anos. Mas é importante acertar essa tese”.

Os casos de Marcopolo e Valid

Como a gestora não monta posições conforme o próximo resultado, Marcopolo e Valid são duas empresas que estão há muito tempo na carteira - desde 2019 e 2021, respectivamente.

Na Marcopolo, que acumula alta de 83,7% neste ano, a Organon acreditava que a fabricante de carroceria de ônibus entregaria esses resultados já em 2020. No ano anterior, a empresa entendeu que a indústria tinha crescido por uma demanda artificial criada em 2011 e começou a enxugar a estrutura. Entendeu o problema e endereçou a solução.

Mas a pandemia atrasou as encomendas de novos veículos, que tiveram início em 2022 e ganharam um reforço com o programa de R$ 1,5 bilhão do governo federal que subsidia a compra com crédito tributário a aquisição de carros, caminhões e ônibus mexeu com as empresas do setor.

Com a Valid (alta de 58,6% no ano) a tese é muito semelhante. Maior posição do Organon FIA, a gestora enxerga a empresa como uma integradora no universo de tecnologia que tem se adaptado às mudanças no segmento, conseguindo melhorias operacionais e buscando novos negócios (com uma participação estratégica relevante da Alaska Asset, de Luiz Alves e Henrique Bredda, reforça o CIO da Organon).

“O Maia entende mais da nossa empresa, em todos os aspectos, do que muitos dos executivos que estão aqui”, diz um executivo de uma investida da Organon.

Com 96% do patrimônio de R$ 240 milhões distribuído em 17 ações, as maiores posições ficam com 15% a 18% desse capital e as menores com 3%. O tamanho depende da relação risco-retorno que o time de análise enxerga e da confiança de que o investimento está muito descontado.

“Não controlamos o preço da ação. Mas, se um ativo está melhor do que achávamos e o preço continua igual, vamos comprar mais”, diz ele.

A lógica da Organon

Poucas semanas antes do início da pandemia, em março de 2020, Maia precisou tomar uma decisão profissional importante: empreender e criar a própria gestora ou continuar no BTG Pactual.

A escolha estava atrelada ao fundo de ações que deu origem à Organon, um produto que ele havia criado no banco, mas que seria descontinuado - o dinheiro, claro, devolvido aos cotistas.

A motivação do BTG não tinha a ver com a rentabilidade do fundo. Se de 2013, quando foi lançado, a 2015 o retorno ficou aquém do esperado, nos anos seguintes o Organon deslanchou.

Até o fim de 2019, quando ainda estava sob o guarda-chuva da instituição financeira, o ganho acumulado era de 660,1% ante 104% do Ibovespa. “Era um produto pequeno para o tamanho do banco, mas ideal para mim”, diz ele.

A decisão de Maia foi muito mais pela vontade de ser um investidor de bolsa do que um empresário de asset. Mas nessa mudança ele precisou buscar um nome para sua nova casa. Comprou um dicionário tupi-guarani para tentar encontrar um, mas “cheguei bem depois das melhores opções”, brinca ele.

Foi aí que surgiu a Organon, o primeiro livro de lógica feito pelo homem, que significa ferramenta ou instrumento em grego. “Era a combinação perfeita com o capital”, afirma Maia.

Na projeção do fundador da Organon, pelos próximos cinco anos a gestora terá esse foco, com tamanho pequeno e, sem preciso, com o fundo fechado a novas captações.

E daqui a 10 anos? É muito tempo, reflete Maia, que entende que ser pequeno para sempre vai penalizar o crescimento das pessoas e dos novos sócios que querem ganhar representatividade.

“O que nos comprometemos é retardar esse processo e focar em ser pequeno nos próximos anos”, afirma Maia.

E Carvalho, o RI da gestora, complementa: “Se os próximos 10 anos serão melhores para o Brasil, não tem como não estar em bolsa de valores. Mas se alguém acha que vai ser pior, haja criatividade”.