A tokenização deixou de ser uma tese de futuro e entrou de vez no radar dos investidores institucionais. De acordo com o Brazil Tokenization Report 2025, elaborado pela Nexa Finance em parceria com a Fintrender, 71% dos fundos de venture capital brasileiros já investem em startups ligadas a blockchain ou ativos digitais, quase o dobro do registrado no ano anterior.
O estudo ouviu mais de 100 participantes, entre 40 fundos de venture capital (VC), dez bancos e as principais plataformas de tokenização do País. “O que vimos foi uma convergência muito clara: regulação, tecnologia e adoção institucional andando juntas”, afirma Lucas Borges, CEO da Nexa, em entrevista ao NeoFeed.
Borges pontua que a regulação nos Estados Unidos — com o Genius Act e a entrada de gigantes como a BlackRock e a Nasdaq no tema — foi o ponto de virada que deu tração global à tokenização. Para o CEO da Nexa, “quando a Casa Branca e a SEC passam a tratar disso, o assunto muda de patamar”.
Pedro Sirotsky Melzer, vice-presidente da ABVCAP e sócio do Patria, comenta que o que tem atraído os fundos são as diferentes possibilidades que se abrem com a tokenização, como contratos inteligentes e potencial aumento de liquidez, se aplicados a instrumentos financeiros.
“Os VCs têm demonstrado interesse por empresas de tokenização como um todo”, diz Melzer, que é coCEO do Patria High Growth. “Tem uma questão de alinhamento cultural com as empresas, que são empresas de tecnologia. Para os fundos de VC, tokenização também é uma forma de estar conectado à inovação e ao mindset das startups que já nascem digitais”.
Em relação à pesquisa anterior, caiu de 28% para 7,7% o número de fundos de venture capital que se dizem pouco ou nada interessados em investir em empresas do setor. Já a fatia dos que disseram ter interesse muito alto subiu de 13,4% para 15%, e a dos com interesse alto, de 27% para 28,2%.
Gustavo Ahrends, general partner da Norte Ventures, conta que tem investido em empresas do setor nos últimos anos. Já são quatro no portfólio: Crown, a mexicana Capa, a OranjeBTC, que se listou recentemente na B3, e a própria Nexa Finance.
“O mundo está entendendo que a tokenização é o novo normal. Não é algo futurista. Essa questão do blockchain, do digital currency, stablecoin, veio para ficar. Isso evolui o mercado, com mais eficiência de transação e geração de liquidez. Há várias aplicações”, diz Ahreds.
Apesar da diversidade de teses dentro do mundo da tokenização, as usabilidades ligadas ao mercado financeiro são as que concentram as maiores apostas entre os fundos de venture capital. Segundo a pesquisa, entre os fundos que tinham investimentos em empresas de tokenização, 74% tinham apostas em plataformas de trading e corretagem e 70%, em serviços financeiros.
A vez das stablecoins
A Lumx foi uma das últimas empresas do setor a realizar uma rodada de captação, levantando US$ 3,4 milhões em uma rodada seed liderada pela Indicator Capital e pela CMT Digital, que também contou com investimento da Nomad, além de outros investidores-anjos corporativos.
Com os recursos levantados, a empresa de infraestrutura de blockchain que permite que bancos, fintechs e provedores de pagamento integrem soluções baseadas em stablecoins pretende ampliar suas licenças no Brasil e no exterior, reforçando o compromisso com a regulação e a expansão internacional.
“Buscamos o smart money porque precisávamos das pessoas e empresas certas ao lado da companhia”, diz Nathaly, CRO da Lumx.
Embora somente a metade dos fundos de VC tivesse alguma exposição ao mercado de stablecoins, é justamente nos pagamentos transfronteiriços - que são uma de suas principais utilidades - que, hoje, 92% dos investidores veem oportunidades. A segunda maior oportunidade em tokenização, segundo a pesquisa, está no seu envolvimento com o mercado financeiro e de capitais, com interesse de 82% dos investidores.
Um exemplo dessa nova geração de empresas é a própria Nexa Finance, que atua como uma plataforma de tokenização voltada à personalização de investimentos. A companhia oferece infraestrutura para que bancos, gestoras e plataformas possam criar e distribuir produtos financeiros de forma customizada.
Outro exemplo é a GCB, que já estruturou mais de R$ 1 bilhão em operações de dívida por meio de tokenização. A empresa atua como uma originadora e distribuidora de títulos de crédito tokenizados, conectando pequenas e médias empresas a investidores que buscam alternativas com retornos mais altos.
“O mercado tradicional de dívida não fazia emissões abaixo de R$ 100 milhões, e a tokenização permitiu reduzir drasticamente esse custo de entrada”, afirma Gustavo Blasco, CEO da companhia.
Blasco explica que as emissões são realizadas por meio de uma plataforma própria de crowdfunding, que viabiliza ofertas de dívida tokenizada com valores menores e custos reduzidos em relação ao mercado tradicional. “A tokenização é o viabilizador disso tudo, porque reduz o custo de emissão e aproxima quem precisa captar de quem quer investir”, afirma o executivo.
Enquanto as aplicações da tokenização ligadas ao mercado financeiro começam a ganhar tração, as iniciativas voltadas à economia real ainda engatinham. Casos como a tokenização de imóveis, ingressos para shows ou outros ativos físicos foram mencionados por apenas 35% dos participantes da pesquisa, refletindo a perda de fôlego desse segmento.
No caso do mercado imobiliário, o cenário ainda é incipiente, segundo André Blazoudakis, CEO da Netspace, de tokenização de imóveis na planta. A empresa é a maior do Brasil no ramo, com cerca de 100 imóveis tokenizados — “quase nada”, segundo o próprio CEO. Mas, pelas suas expectativas, com avanços regulatórios, esse mercado de imóveis tokenizados ainda pode ser o dobro do mercado financeiro.
“O que se vê muito hoje são derivativos tokenizados do mercado imobiliário — recebíveis, CRIs, aluguéis. Tudo isso são derivativos da propriedade, mas não o imóvel em si. Nós acreditamos muito e estamos trabalhando forte para que os direitos sobre os imóveis sejam amplamente tokenizáveis aqui no Brasil.”