O CEO e fundador do St. Marche, Bernardo Ouro Preto, gostava de comparar o jeito Disney de encantar o cliente com o serviço prestado pela rede de mercados voltado para o público de alta renda. A curadoria de produtos e os itens diferenciados eram atrativos para se diferenciar no competitivo varejo de consumo. Mas essa experiência foi quebrada com o pedido de recuperação extrajudicial (RE) há seis meses.

Agora, Ouro Preto escreveu uma carta com um pedido de desculpas aos clientes que deixaram de frequentar as 32 lojas do grupo após a homologação do término da recuperação extrajudicial.

Na carta, que o NeoFeed obteve com exclusividade, ele reconhece o problema causado pela dívida de R$ 528 milhões da companhia, que fez com que a empresa deixasse de oferecer 1,5 mil produtos de seus 10 mil itens em exposição nas gôndolas. E pede “uma nova chance”.

"O St. Marche viveu um processo intenso de expansão. Abrimos muitas lojas em um curto espaço de tempo e essa decisão acabou pressionando nossas finanças. Como consequência, alguns produtos essenciais para o seu dia a dia ficaram faltando em nossas prateleiras", diz um trecho da carta (leia a íntegra no fim da reportagem).

Por mês, a empresa contabiliza 1,2 milhão de compras efetuadas em todas as unidades do grupo. Em agosto, o índice de ruptura calculado pela empresa de inteligência de dados Neogrid mostrava um indicador de 13,1% em toda rede de supermercados do Brasil. Agora, o St. Marche alcançou patamar de 10%.

Em entrevista ao NeoFeed, Ouro Preto afirma que o objetivo da rede de varejo mudou. A expansão saiu do horizonte da companhia - pelo menos no médio prazo. Em vez de inaugurar novas lojas, a intenção é maturar as últimas unidades abertas. Em menos de três anos, foram 12 inaugurações.

“É muito raro crescer em um cenário de juros a 15%. O St. Marche vai passar agora uns anos consolidando o que já tem", diz o CEO e cofundador da marca. "Ainda temos lojas novas, que precisam de um tempo. Vamos fortalecer a empresa nos próximos cinco anos.”

Para ele, o importante nesse período foi não se esconder dos cerca de 730 fornecedores nem dos clientes. “Foi um desafio manter o ânimo dos executivos e dos cerca de 2,5 mil funcionários durante a crise, que ouviam reclamações de clientes sobre falta de produtos”, diz o CEO, que criou a empresa em 20o2, junto com Victor Leal.

A empresa deve fechar 2025 com uma queda de 10% na receita sobre o volume de R$ 1,3 bilhão alcançado no ano passado, o que, para o empresário, já será um grande resultado.

O plano e a recuperação

Do total da dívida de R$ 528 milhões, a rede varejista conseguiu esticar o início do pagamento de 75% (equivalente a quase R$ 400 milhões) para daqui a 30 anos, com reajuste anual de 1%. Na prática, é desconto quase total desse montante pois em 2065 esse valor será muito menor com a correção da inflação.

Bernardo Ouro Preto, CEO e cofundador do St. Marche

Os outros 25% (cerca de R$ 130 milhões), que serão efetivamente quitados, começam a ser cobrados em sete anos, com carência de cinco anos de juros e principal. No plano aprovado, a empresa paga 20% dessa fatia no ano 5, 30% no ano 6 e 50% no ano 7. Com isso, até 2030, nenhuma parte da dívida será paga.

A empresa conseguiu o aval de 53% de seus credores para que o plano pudesse ser aprovado pela Justiça, acima do mínimo de 30% exigido pela legislação. E, para encerrar o período de RE, a companhia apresentou um ofício com 92% de aprovação ou não oposição às condições de pagamento apresentadas pela companhia.

Ainda durante a fase de reestruturação, o grupo conseguiu R$ 90 milhões por meio de um debt-in-prossession (DIP), que veio do fundo americano L Catterton (que tem 70% de participação no St. Marche) e do BTG Pactual. Parte desse valor foi usado para quitar os atrasos com uma parcela significativa dos fornecedores do St. Marche, que já somavam R$ 40 milhões.

“Hoje devo zero para fornecedores e tenho uma dívida equacionada com bancos. Com esse aporte, a gente ainda conseguiu aumentar nosso estoque para retomar os volumes”, diz Ouro Preto.

Por enquanto, não haverá nenhum rearranjo societário a partir do último aporte, mas é possível que, futuramente, o BTG ganhe participação. Ouro Preto e outros acionistas somam os outros 30% da empresa. Esse desenho será discutido a partir do ano que vem, junto com a necessidade de aumento de capital.

Leia, a seguir, a íntegra da mensagem cujo título era: "Errei e queria te pedir desculpas".

Hoje escrevo para te pedir desculpas.

Nos últimos anos, o St. Marche viveu um processo intenso de expansão. Abrimos muitas lojas em um curto espaço de tempo e essa decisão acabou pressionando nossas finanças. Como consequência, alguns produtos essenciais para o seu dia a dia ficaram faltando em nossas prateleiras.

Eu sei o quanto isso foi frustrante e talvez, por conta disso, você tenha diminuído as suas compras nesse período. Mesmo assim, ainda esteve do nosso lado nesse momento. Essa experiência está muito distante daquela que me propus a oferecer quando cofundei o Marche há quase 23 anos, uma experiência feita para encantar e que sempre levou você a nos visitar todas as semanas.

A boa notícia é que conseguimos superar essa crise. Com muito trabalho e dedicação do nosso time, reorganizamos a operação e as nossas lojas estão novamente cheias, com os produtos básicos que você precisa e, também, com aqueles itens especiais que só o Marche tem.

Nós queremos fazer ainda mais parte da sua rotina e te convido a voltar a olhar para todos os nossos departamentos na sua próxima visita a uma de nossas lojas para conferir você mesmo. O Marche de sempre está de volta, com a experiência completa que fez parte da sua rotina por tanto tempo.

A gente quer te ver de volta!
Vem pro Marche!

Um abraço, Bernardo Ouro Preto, CEO e Co-fundador do St Marche