Fundada em 2020, a fintech mineira PrecPago nasceu com foco na antecipação de ativos judiciais – em particular, os precatórios – em âmbito federal. Agora, está recebendo o reforço – e a chancela – de um “conterrâneo” para expandir essa tese.

A empresa está anunciando a entrada do Banco Mercantil em seu quadro de sócios, a partir da compra de uma participação minoritária na operação. A startup não revela a fatia e a cifra envolvidas na transação, mas não esconde o que a levou a assinar o acordo para essa conexão com o banco mineiro.

“Como o nosso mercado movimenta valores muito expressivos, era muito importante termos um ‘braço direito’ com robustez de capital”, diz Bruno Xavier, cofundador e CEO da PrecPago, ao NeoFeed. “E a chegada do Mercantil traz justamente essa segurança para expandirmos nossa operação.”

Outra questão favoreceu essa associação: a base de 9,1 milhões de clientes do Mercantil, formada, em sua maioria, por pessoas com mais de 50 anos. Segundo Xavier, essa faixa etária também tem ampla participação na área de atuação da fintech, pois detém cerca de 45% do volume de precatórios federais.

Em um número mais abrangente, que dá a dimensão do mercado na mira da fintech, o CEO da PrecPago ressalta que o governo federal desembolsou R$ 70,7 bilhões em ativos judiciais apenas no acumulado de 2025. E que, para 2026, o volume projetado já é de R$ 69,7 bilhões.

Há uma questão, porém, que promete movimentar esse segmento. Promulgada na terça-feira, 9 de setembro, no Senado, a PEC 66/2023 (Proposta de Emenda à Constituição) flexibiliza as regras para o pagamento dos precatórios.

Entre outros pontos, a PEC permite o pagamento dessas dívidas contraídas pela União, estados e municípios em parcelas menores e num prazo mais longo. Além de substituir a taxa Selic pelo IPCA+2% ao ano como a referência para a correção dos valores dos precatórios. E foi alvo de críticas.

“Com tetos de pagamento baixos, correção monetária inferior ao custo do capital e ausência de um prazo final para quitação, a proposta transfere parte do custo do ajuste aos credores e consolida um regime de postergação permanente dos pagamentos”, escreveu o BTG Pactual, em relatório recente.

Para Xavier, há “dois lados” nessa moeda, que trazem um componente de incerteza, tanto para os detentores dos precatórios como para os investidores, especialmente na precificação dos ativos a serem antecipados. Mas que, ao mesmo tempo, podem favorecer a fintech.

Ele entende, por exemplo, que há uma perspectiva de aumento no volume de interessados na antecipação de precatórios, dado que a percepção é de que os ativos serão menos valorizados com a substituição da taxa Selic como referência.

“Por outro lado, tende a ocorrer um deságio um pouco maior no mercado para compensar esse déficit de correção”, afirma. “E é nesse ponto que a PrecPago, por seu modelo de atuação, pode reduzir o impacto da precificação para o credor e ganhar destaque.”

Esse modelo começou a ser construído em 2018, com a criação da Triad Investimentos, que atuava como uma intermediária nessas transações, ao conectar os detentores de ativos judiciais e os interessados em comprá-los.

A operação foi rebatizada como PrecPago dois anos depois, quando a empresa estruturou um Fundo de Investimento em Direitos Creditórios (FIDC) próprio e decidiu se concentrar na aquisição desses ativos. Na época, a fintech atraiu seu único aporte – de valor não revelado – de investidores-anjo.

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Os sócios da PrecPago, Bruno Xavier, Bruno Vidal, Osmar Vaz de Mello Neto e Daniela Pierobon, com Gustavo Araújo, CEO do Banco Mercantil (ao centro)

Com esse reposicionamento e a partir do FIDC, a PrecPago passou a investir em um tripé, cujo primeiro pilar são os investimentos em uma tecnologia própria, em busca de mais eficiência, agilidade e assertividade na segunda ponta desse modelo: a due diligence dos ativos judiciais.

Nesse formato, entre outras frentes, a fintech chega ao detalhe de avaliar a previsibilidade de pagamento dos ativos de acordo com os perfis de cada vara judicial. O que se conecta com o terceiro pilar da sua tese – a precificação correta dos precatórios e afins, que varia de caso a caso.

Com parte da receita capturada nas taxas de deságio praticadas nessas transações, a PrecPago tem mais de 250 parceiros para a originação dessas operações, entre eles, o próprio Mercantil. E, em cinco anos, soma mais de 3 mil operações e um volume de R$ 500 milhões em antecipações.

Agora, a meta é chegar a R$ 1 bilhão em antecipações nos próximos três anos. E, num dos passos em direção a essa meta, as operações passarão a ser financiadas pelo balanço do Mercantil, a partir da cessão dos ativos do FIDC da PrecPago.

Os planos também passam por usar o ecossistema de ofertas que o banco vem construindo com foco nos clientes de mais de 50 anos como um diferencial na atração de outras operações para a fintech.

Embora não revele detalhes, Xavier diz que, em paralelo, o plano é desenvolver a quatro mãos ofertas de antecipação mais personalizadas às demandas de cada cliente. Algo que já vinha em curso, mas que deve ganhar velocidade com o novo sócio. Assim como o volume de operações feitas.

“Faltava o know how de uma instituição financeira e o Mercantil supre essa lacuna, tanto em capital como em segurança”, diz. “Porque corríamos o risco de ficarmos reféns de crescer o volume de originação e não termos a garantia de alguém que subsidiasse a compra desses ativos.”