Ao olhar para a grade de oportunidades no setor de educação do Brasil, a fintech de crédito estudantil Elleve decidiu apostar no segmento de cursos livres e profissionalizantes. E, mais especificamente, na proposta de conectar estudantes e instituições para acelerar o ingresso de profissionais no mercado de trabalho.

Com esse plano em mente, a startup está emitindo R$ 123 milhões em debêntures e já captou, até agora, R$ 28 milhoes de investidores institucionais e family offices que atuam no segmento de educação e no mercado financeiro. “Esses recursos nos dão fôlego e vão ser usados no desenvolvimento da Elleve", diz André Dratovsky, fundador e CEO da Elleve, ao NeoFeed.

A plataforma da empresa usa inteligência artificial para analisar os dados de estudantes, principalmente aqueles das classes C e D, sem histórico financeiro. Outras informações compõem essa avaliação, como as oportunidades do mercado no qual o aluno quer atuar; a disponibilidade de vagas na região em que ele mora e o reconhecimento da instituição onde pretende estudar.

A partir da análise de todas essas variáveis, a empresa cria um score de crédito para o estudante. "Nós entendemos se o curso que estamos financiando vai tornar o aluno um bom pagador daqui a alguns anos", explica Dratovsky.

Se aprovado, o aluno faz a matrícula online, em poucos minutos. A Elleve deposita o valor integral do curso para a instituição de ensino escolhida e passa a gerenciar a cobrança do financiamento, que inclui prazos maiores e taxas de juros mais atraentes.

Com esse modelo, a Elleve oferece cursos com taxas de juros em torno de 1,99% ao mês. Em alguns programas, dependendo da negociação com as instituições parceiras, o estudante tem acesso ao financiamento sem juros. Os prazos para quitar os empréstimos, por sua vez, podem chegar a 26 meses.

Os recursos da emissão de debêntures serão investidos no desenvolvimento dessa plataforma. Outro destino é a ampliação do time, que hoje conta com 15 pessoas, para cerca de 35 profissionais, até o fim de 2021. O valor captado também será aplicado no financiamento do crédito concedido aos alunos.

André Dratovsky, da Elleve

A empresa não trabalha com graduação tradicional nem com ensino médio e fundamental. "Somos absolutamente focados em cursos de alto impacto, que necessariamente tragam empregabilidade ou aumento de renda", diz Dratovsky. "Se possível, uma combinação dos dois."

O objetivo é fechar 2021 com seis mil alunos financiados. Para 2022, a expectativa é alcançar uma base de 30 mil estudantes.

O pacote da Elleve também contempla as instituições de ensino. Nessa ponta, a fintech oferece serviços como a antecipação do capital, a cobrança direta dos alunos e dados para a retenção dos estudantes, a partir da análise de perfil realizada. A receita da startup vem da cobrança de uma taxa recorrente, de acordo com o pacote selecionado por cada instituição.

Atualmente, essa carteira inclui 60 nomes. Entre eles, a Impacta, focada em cursos de TI, gestão, design, marketing e desenvolvimento; a Be Academy, com cursos voltados para a área financeira; a Mentorama, que atua em áreas como UX design e programação de games; e a Ironhack, sobre desenvolvimento de plataformas web e análise estatística. Juntas, essas instituições têm 40 mil alunos.

O número de escolas parceiras chama atenção pelo pouco tempo de atuação da startup. Embora tenha sido criada, oficialmente, em outubro de 2020, a empresa começou sua operação, de fato, no fim de janeiro deste ano.

A Elleve é o segundo empreendimento de André Dratovsky. Em 2011, depois de trabalhar em empresas de construção civil, ele se tornou sócio na Baueco, uma empresa de importação de pisos de borracha para utilização na indústria farmacêutica. "Era um bom negócio, mas eu não tinha um apego emocional. Queria tentar mudar a vida das pessoas", conta.

Foi assim que ele passou a olhar o setor da educação e decidiu fundar a Elleve, ao lado dos sócios Joseph Chehebar e Rafael Levi, executivos do mercado financeiro.

A inspiração veio a partir do estudo do conceito de lifelong learning, uma proposta apresentada pela primeira vez pela Unesco (Organização das Nações unidas para Educação, Ciência e Cultura), ainda na década de 1970.

Embora não seja exatamente novo, o conceito vem ganhando força com as mudanças no mercado de trabalho, cada vez mais focado em habilidades e competências específicas - uma tendência acelerada ainda mais com a pandemia e potencializada pelo formato a distância.

"As microcertificações são a nova cara do ensino", afirma William Klein, CEO da consultoria Hoper Educação. "O mercado já vinha exigindo esse tipo de certificação, mas a novidade é como essa tendência foi acelerada por conta da educação online."

Dados do Censo da Educação Superior, divulgados em 2020 pelo Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira (Inep) dão uma ideia sobre o potencial do ensino a distância: o número de estudantes matriculados nesse formato superou 1,5 milhão apenas nos cursos superiores. Há 10 anos, eram 332 mil.

Segundo Klein, além de oferecer um rápido caminho para o mercado de trabalho, as novas microcertificações funcionam como uma atualização constante para todo tipo de profissional, mesmo aqueles com graduações tradicionais. "Não é um formato que surge em detrimento da graduação tradicional, mas como um complemento a ela", diz o consultor.

Outras startups estão de olho nessa fatia do mercado. Entre os exemplos estão a Provi, que também oferece crédito estudantil com foco em cursos profissionalizantes.

Outra empresa atenta a essa tendência é a Pravaler, que há 20 anos oferece crédito privado com foco na graduação tradicional. Em março, a companhia captou R$ 180 milhões por meio de um FIDC e, com o montante, tem olhado para os cursos de curta duração e certificações de tecnologia.