Como head de venture capital da XP e managing partner da Headline no Brasil e na América Latina, Romero Rodrigues costuma reservar um espaço em sua agenda para conversas periódicas com fundadores de startups que conheceu em mais de duas décadas como empreendedor e investidor.
“Do meio do ano para cá, passei a incluir uma pergunta nesses bate-papos: você tem algum ‘equity morto’ no seu captable?”, diz Rodrigues, ao NeoFeed. “E comecei a ouvir: poxa, temos 12, 13 anos de mercado, sempre tem. O que você está pensando?” A resposta a essa pergunta está sendo dada agora.
A Headline e a XP acabam de concluir a captação de um fundo de R$ 62 milhões, o Headline Prime I, que marca a entrada da dupla em uma nova classe de ativos: as rodadas secundárias, que, nesse caso, serão 100% centradas na compra de participações em startups de tecnologia.
Um componente, em particular, embala a estreia nesse terreno, ainda pouco explorado no Brasil. O cenário atual – e que já perdura há algum tempo – de opções escassas para as saídas de investidores dessas startups. O que tem se refletido em ciclos mais longos dessas empresas no mercado privado.
“Você tem pouca liquidez, um contexto macro que machuca, com juros de 15%, e um custo de oportunidade altíssimo”, diz Rodrigues. “E, ao mesmo tempo, um cenário de liquidez que pode mudar daqui a um ou dois anos. É a combinação perfeita para montar um produto desses.”
Concluída em quatro semanas, entre setembro e outubro, a captação do fundo, que será gerido pela XP Vista Asset Management, foi realizada junto à rede da XP e atraiu 1.141 cotistas. Os R$ 62 milhões vieram abaixo da meta inicial de R$ 100 milhões, mas ficaram acima do mínimo de R$ 40 milhões.
“Tínhamos a opção de ficar com o fundo aberto por mais tempo, só que os deals, que já estavam quentes, podiam começar a cair”, afirma. “Então, decidimos fechar em R$ 62 milhões. E se, no futuro, houver outra oportunidade, já teremos um track record aqui.”
Há dois grupos na mira do fundo para construir essas posições em startups de tecnologia por meio das rodadas secundárias. Além de investidores-anjo, o primeiro envolve ex-executivos e founders já distantes do dia a dia dessas operações, mas que ainda detêm ações nessas companhias.
Um segundo inclui fundos de early stage e de aceleradoras cujos prazos de saída estão próximos ou já expiraram. Rodrigues e seus pares já têm conversas, por exemplo, com fundos de corporate venture capital e de family offices que estão descontinuando suas operações e se desfazendo de suas posições.
Já os cheques para a compra dessas fatias irão variar de R$ 1 milhão a R$ 15 milhões. Em outra característica dessas rodadas, o fundo vai buscar um desconto em relação ao valor justo dessas operações, que poderão variar de 20% até 50%, dependendo da classe da ação adquirida.
Em outro elemento dessa equação, o fundo vai se concentrar em empresas mais maduras, especialmente nos estágios de série B e C, com um faturamento anual acima de R$ 150 milhões. Com esse viés, o plano é reunir um leque de oito a dez companhias no veículo.
“Aqui, diferentemente do venture capital, estamos falando com algumas empresas que são mamutes e já faturam R$ 1 bilhão”, afirma. “Então, você não precisa ter tanta diversificação para o caso de alguém morrer. Essas empresas já deram certo e você pode ter um portfólio mais reduzido.”
Nessa pegada, a projeção é alocar 30% do fundo ainda em 2025, a partir da perspectiva de anunciar três transações nesse intervalo. A meta, por sua vez, para investir 100% dos recursos captados é de seis meses – o período total de alocação é de 18 meses.
A velocidade também dá o tom em mais indicadores. Na contramão dos veículos de venture capital e de outros investimentos alternativos. Rodrigues ressalta que o fundo terá um prazo mais curto, de seis anos, e vai entregar, já na largada, uma rentabilidade positiva.
“Como você compra com desconto e é obrigado a marcar pelo valor justo no day zero, o fundo já dá um degrau para cima”, explica Rodrigues. Ele observa que a rentabilidade total estimada é de cerca de 25% ao ano, um pouco abaixo da média de 30% a 35% dos fundos de venture capital.
“A rentabilidade é, teoricamente, um pouco menor, mas ele é pensado para ter saídas rápidas”, diz. “Há empresas que vamos entrar que provavelmente terão saídas em um ou dois anos. Então, você não precisa esperar aqueles sete anos do venture capital para ver as primeiras startups darem certo.”
Produto oportunista
Apesar de pouco difundidas no Brasil, as rodadas secundárias estão atraindo outros investidores no País. Esse é o caso do Patria, que, em março deste ano, criou uma vertical batizada de High Growth, reunindo as gestoras Kamaroopin e Igah.
Um dos mandatos dessa nova área, cuja meta é chegar a R$ 1 bilhão sob gestão, é justamente comprar fatias secundárias de investidores de startups. Até então, um dos únicos nomes que atuavam nessa área no mercado local era a Spectra, gestora com mais de R$ 7 bilhões sob gestão.
Recentemente, a Spectra, em parceria com a Beacon, divulgou um relatório sobre a modalidade. Entre outros dados, a pesquisa mostrou que 66% dessas rodadas se deram a partir da série A. E que 46% delas acontecem com um desconto do valuation do atual aporte, sendo o mais comum, entre 10% e 20%.
Apesar dessa primeira incursão nesse formato, Rodrigues não crava que a Headline e a XP Asset irão engrossar esses números com novos veículos dedicados a rodadas secundárias.
“Esse não é um produto estratégico. Ele é tático. É um produto oportunista. Tudo vai depender das condições de mercado”, afirma. “Se tivermos saída das posições que fizermos, eu digo que não. Porque isso vai significar que o problema da falta de liquidez acabou. Então, a tese cai.”
Enquanto isso, o Headline 3, o outro fundo da dupla, já reúne um portfólio de 17 empresas investidas, o que se traduz em 45% dos R$ 916 milhões captados. Os recursos restantes serão aplicados em follow ons e em novas empresas – no momento, há cinco startups em diligência.