A dependência do mundo em relação às chamadas terras raras (TRs) é cada vez maior. Tido como o “ouro do século 21”, esse grupo de 17 minerais é matéria-prima para as indústrias de alta tecnologia e de transição energética. Dos celulares e supercondutores ao motor dos carros elétricos, das turbinas de energia eólica às lâmpadas LED, praticamente todas as inovações emergentes usam os elementos químicos.
Até 2040, a procura pelos materiais deve sextuplicar, indica estudo da Universidade Harvard, nos Estados Unidos. Ao contrário do sugerido pelo nome, os TRs são abundantes, mas dificilmente se acham em grandes concentrações, o que dificulta a mineração.
Há ainda um outro problema. Mesmo quando encontrados, é complicado separá-los de outros compostos. E, assim, o que deveria levar o planeta à descarbonização acaba se voltando contra o meio ambiente. Do modo como a extração é feita hoje em dia, cada tonelada de TRs produz 2 mil toneladas de resíduos tóxicos.
É urgente, portanto, encontrar alternativas mais sustentáveis aos minerais. Fundada em 2014, a startup inglesa GreenSpur parece ter encontrado um caminho promissor rumo a um futuro menos dependente de terras raras. Pelo menos, no setor de energia eólica.
Capitaneada pelos engenheiros Hugh-Peter Kelly e Andrew Hine, a empresa desenvolveu uma turbina livre dos minerais. Em parceria com gigantes da energia renovável, como a britânica OREC e a consultoria DNVGL, e renomados centros de pesquisa, como o da Universidade de Cambridge, a GreenSpur já testou, pelo menos, três novos modelos. E, em todas as experiências, funcionaram bem.
A sacada da startup foi mudar o design no miolo do gerador. Tradicionalmente, as turbinas usam imãs móveis de TRs, colocados em torno de boninas de fio de cobre estáticas, dispostas em círculos concêntricos. Deflagado pelo vento, o movimento dos imãs é o responsável pela produção de energia.
O projeto da GreenSpur, porém, está baseado em uma “arquitetura axial”. Como bolachas gigantes, as bobinas são empilhadas sobre os imãs. Ou seja, o campo magnético flui paralelamente ao eixo do gerador, resultando, em última instância, em aumento da força elétrica.
Com isso, é possível utilizar materiais menos potentes do que as terras raras. No caso, as TRs foram substituídas por ferrite, um derivado do ferro de fácil extração e abundante na natureza. No lugar do cobre das bobinas, a startup usa alumínio.
Um dos desafios dos novos modelos é manter o peso do gerador dentro da mesma faixa das máquina existentes. Torná-lo mais pesado requer a criação de um suporte estrutural extra, o que aumenta o custo. Apresentado em julho passado, o gerador de 15 mega-watts, para turbinas eólicas offshore proporcionou uma redução de 56% de massa, em comparação às estruturas tradicionais, sem perda de eficiência.
Ainda levará tempo até que a tecnologia da startup de Kelly e Hine se prove aplicável em larga escala. Mesmo assim o sucesso obtidos nos testes realizados até agora vem sendo comemorado por especialistas do mundo todo.
O entusiasmo com a descoberta de novas matérias-primas para a produção de turbinas eólicas se justifica não só pela promessa de um futuro verdadeiramente mais sustentável do ponto de vista do meio ambiente, mas também da economia global.
A China domina toda a cadeia produtiva, com cerca de 44 milhões de toneladas em reservas. O Brasil aparece em segundo lugar, com a metade desse total. Por aqui, as TRs são encontradas em áreas preservadas da Amazônia, Tocantins, Minas Gerais e no litoral do Nordeste e Norte. O potencial brasileiro, aliás, tem atraído o interesse de empresas, inclusive estrangeiras.
De acordo com a Agência Nacional de Mineração, o número de pedidos protocolados de pesquisas para a lavra de TRs, em dois anos, cresceu 70%. Em 2022, chegaram a 154.
Também pudera, o mercado global dos minerais está projeto para atingir US$ 5,5 bilhões, nos próximo cinco anos, evoluindo a uma taxa anual composta de 10%, entre 2021 e 2028. Para se ter ideia do que está por trás do aumento da demanda, um carro elétrico requer seis vezes mais minerais do que o convencional. Uma usina eólica, nove vezes mais do que uma movida a gás.