O engenheiro Vidyut Mohan nasceu em Nova Delhi e o físico Kevin Kung, em Taiwan. Ambos têm 32 anos e, apesar das diferenças culturais, guardam uma mesma recordação da infância: as nuvens sazonais de poluição.
Os dois moravam perto de fazendas e, a cada fim de colheita, os agricultores punham fogo nos campos, uma forma rápida e barata (e também inadequada) de “limpar” o terreno para a próxima safra.
“O cheiro das queimadas me traz até uma certa nostalgia”, conta Kung, ao lembrar das plantações de arroz, nos arredores de sua casa. “Mas essa não é uma memória que quero que meus filhos tenham.”
Já, Mohan perdeu as contas de quantas vezes ele, parentes e amigos caíram doentes por causa da qualidade do ar em sua cidade natal. Em algumas regiões da Índia, a contaminação atmosférica reduziu a expectativa de vida em até um década.
Cada um de seu lado, o engenheiro e o físico optaram por trabalhar no ecossistema de inovação agtech, para livrar o planeta daquela “fumaça”. Em meados dos anos 2000, os caminhos dos dois se cruzaram. E, em 2018, eles fundaram a Takachar, um spin-off do Instituto de Tecnologia de Massachusetts (MIT, na sigla em inglês), onde Kung cursava o mestrado.
A agtech desenvolveu uma máquina portátil que, conectada na traseira de tratores e picapes, transforma os resíduos agrícolas e florestais em biomassa, para a produção de combustíveis, fertilizantes e defensivos. Batizada Takavator, a tecnologia reduz em 98% as emissões de gases de efeito estufa (GEE), em comparação à queima do “lixo” a céu aberto.
O CEO Mohan e o CTO Kung se propõem a enfrentar uma das práticas agrícolas mais nocivas ao planeta e um entrave rumo a sistemas agroalimentares mais sustentáveis, resilientes às mudanças climáticas, inclusivos e produtivos. Além da sujeira atmosférica, o fogo compromete a qualidade da terra.
E não só isso. Junto com os talos de milho, as cascas de arroz, a palha, o feno e outros resíduos deixados pelas colheitas anteriores, o mundo queima US$ 120 bilhões, anualmente, conforme relatório do MIT. A poluição do ar mata 7 milhões de pessoas, todos os anos, informa a Organização Mundial de Saúde (OMS).
A transformação dos restos das colheitas em biomassa não é novidade. O diferencial da Takachar está no tamanho do processador. Portátil, o Takavator é usado no campo, eliminando inclusive os gastos e os custos ambientais com a logística. A máquina, segundo Mohan e Kung, pode proporcionar uma renda extra para os pequenos produtores rurais, a partir do comércio da biomassa.
“Para enfrentar a crise climática e proteger os mais vulneráveis, devemos mitigar urgentemente o problema, reduzindo as emissões e, ao mesmo tempo, apoiando as comunidades na transição para práticas mais sustentáveis”, fiz Mohan, em entrevista ao blog do MIT. Criando, assim, a bioeconomia local, de circuito fechado, sem exigir a entrada de energia externa. É a circularidade levada à máxima potência.
Desde a fundação da startup, o engenheiro e o físico levantaram cerca de US$ 4 milhões. Mais do que o dinheiro, impressiona mesmo quem os apoia. No ano passado, a Takachar venceu o concurso XPrize Carbon Removal, financiado pela fundação de Elon Musk. A empresa levou US$ 1 milhão, mais a chance de continuar na competição por US$ 100 milhões, em 2025.
A ideia de Mohan e Kung levou também a Takachar ao portifólio da aceleradora Breakthrough Energy, criada por Bill Gates. Em 2021, foram agraciados £ 1 milhão, pelo prêmio Earthshot idealizado pelo príncipe William, do Reino Unido.
Além disso, os empreendedores contam com o apoio da aceleradora do Programa Mundial de Alimentos (WFP, na sigla em inglês), uma das maiores agências humanitárias do mundo, responsável pelo fornecimento de comida para 90 milhões de pessoas, em 80 países.