Previsto para crescer globalmente 28,3% até 2025, o turismo de luxo está rejuvenescendo. Até bem pouco tempo atrás, as viagens ultrassofisticadas eram privilégio, sobretudo, dos mais velhos. Uma turma com tempo livre (e dinheiro) para curtir a vida, zanzando pelo planeta. O cenário mudou. Hoje, a maioria tem de 25 a 49 anos.
Entre eles há herdeiros, que flanam pelo mundo sustentados pelos negócios da família. Mas também os ricos da economia 4.0 – jovens executivos C-level, fundadores de startups e inovadores dos ecossistemas digitais.
E, em comparação às gerações anteriores, os viajantes endinheirados de agora são ainda mais exigentes. Com uma renda familiar de, no mínimo, R$ 20 mil, eles reservam uma parte maior do orçamento para as experiências megaexclusivas.
Abre-se, assim, uma série de oportunidades de negócios – tão grande quanto os desafios impostos à indústria.
Realizada em outubro de 2023, com 840 pessoas, uma pesquisa feita pela International Luxury Travel Market (ILTM), em parceria com o TRVL Lab, ilustra à perfeição a nova realidade.
Os millennials, nascidos entre 1981 e 1995, já somam 48,2%, dos consumidores das viagens de luxo. Os primeiros representantes da geração Z (1996-2010) vêm em seguida, com 28%.
“O novo turista de luxo não está procurando um lugar fabricado para o turismo nem um serviço tão formal”, diz, em entrevista ao NeoFeed, Simon Mayle, diretor da ILTM Latin America, North America e PROUD (evento internacional de turismo de luxo LGBTQIA+). “Ele procura experiências mais autênticas e genuínas."
Barba e tatuagem
É uma mudança radical de paradigmas. Uma experiência de luxo não se resume mais apenas a hotéis estrelados, lençóis de centenas de fios, travesseiros de plumas e serviços de altíssimo padrão. Luxo também é viver as comunidades e culturas locais. Mas só vale, é claro, se o evento for ultramegaexclusivo.
E, assim, sai de cena o chamado “turismo de luvas brancas”, enquanto cresce a procura por hotéis butique, restaurantes descolados e cruzeiros de expedição. É a era das “private expeditions”, dos “private cruises” e das “private experiences”. Quanto mais privado e personalizado, melhor.
O programa Luxury Private Jet Vacations, da rede Four Seasons, é emblemático do turismo de luxo contemporâneo. A bordo de um jato privado, o viajante conhece alguns dos lugares mais deslumbrantes do mundo. A “jornada” International Intrigue 2024, por exemplo, está prevista começar em 21 de setembro em Seattle, nos Estados Unidos, e terminar em 14 de outubro em Paris.
Entre um destino e outro, Kioto, no Japão; Ho An, no Vietnã; Kuda Huraa, nas Maldivas; Serengeti, na Tanzânia; Marrakech, no Marrocos; Budapeste, na Hungria; Florença, na Itália, e finalmente a capital francesa. Ao preço de US$ 198 mil, por pessoa, o passeio está esgotado.
"Estamos passando de um serviço formal para um serviço real", explica Mayle. "Funcionários dos hotéis mais luxuosos agora mostram suas tatuagens, usam barba e ficam confortáveis para conversar com o viajante. O turista quer conhecer a região e, para isso, os funcionários do hotel são as primeiras pessoas com quem ele vai conversar."
"Blended travels"
As chamadas "blended travels", os roteiros cujo único propósito não são as férias e o descanso, são forte tendência neste mercado. Itinerários que incluam também shows, eventos esportivos, feiras de arte, cursos, atividades religiosas e até trabalho são cada vez mais comuns entre os novos viajantes de luxo.
A brasileira Latitudes, por exemplo, é especializada em “roteiros de conhecimento”. Conforme descrito no site da empresa, a agência tem como missão “transformar viagens em períodos de aprendizado e enriquecimento interior (...) viajar vai muito além de estar nos lugares”.
Já esgotado, o roteiro Rājasthān: Outro olhar - Yoga e Cultura na Índia, propõe uma Índia “mais autêntica”, onde pontos turísticos clássicos, como o Taj Mahal, dão lugar a “uma Índia mais autêntica e culturalmente próxima das pessoas que habitam a região do deserto de Thar”.
Mudanças em alto mar
Se a hotelaria foi a primeira a perceber essa mudança no perfil do viajante de luxo, foi a indústria de cruzeiros que deu os passos mais arrojados para atrai-lo.
Em geral, os turistas mais jovens são pouco afeitos aos cruzeiros. Mas, armadoras de alto padrão como Silversea e Explora Journeys lançaram recentemente novos navios que fogem do estereótipo das viagens marítimas tradicionais.
Tem funcionado. Na Silversea, os hóspedes na faixa dos 30 anos são cada vez mais comuns. O novo navio da companhia, o Silver Nova, tem design assimétrico e, em sua piscina de borda infinita, o viajante nem lembra que está num navio.
"Eles começam a viajar conosco para chegar a destinos nos quais navios são realmente necessários, como Antártida ou Galápagos”, explica Barbara Muckermann, presidente da Silversea, em conversa com o NeoFeed. “Mas eles se encantam com a experiência e acabam voltando para fazer outros roteiros.”
Como nossos pais
As guerras e conflitos recentes também redirecionaram os olhares dos turistas em busca de exclusividade. Se o Oriente Médio antes estava em alta, hoje, a América Latina passou para o topo da lista de desejos de muitos viajantes.
"A hospitalidade latina, a pessoalidade dos serviços e o carinho com os viajantes são os pontos mais elogiados e mais difíceis de explicar; as pessoas precisam viver a experiência", conta Mayle.
Para os estrangeiros, o Brasil finalmente voltou a ser um mercado atrativo.
Importantes redes sofisticadas, como Kempinski, Faena e Anantara, devem abrir hotéis no país nos próximos anos.
O levantamento da ILTM traz um dado curioso.
Como os mais jovens estão familiarizados com as tecnologias 4.0, era de se esperar que, ao organizar seus passeios, recorressem às redes sociais. Mas não.
Como seus pais e avós, eles seguem priorizando as orientações de profissionais da área, informa a Virtuoso, rede global de consultores de turismo de alto padrão.
Para 46% dos novos turistas, os influencers não os influenciam em nada quando o assunto é viagem.