Brasília - O preço do barril do petróleo tipo brent chegou a tocar em US$ 80 com a escalada do conflito entre Israel e Irã, que teve os Estados Unidos como peça-chave, no início desta semana.

Mas, após o cessar-fogo e o alívio das tensões no Oriente Médio, o preço ficou abaixo de US$ 70 - o tipo Brent está sendo negociado em torno de US$ 67 na sexta-feira, 27 de junho.

Para Evaristo Pinheiro, presidente da Refina Brasil, associação da empresas privadas de refino de petróleo, que engloba 20% do mercado nacional, não é possível prever as consequências mundiais desse conflito a curto, médio ou longo prazo.

Mas, uma coisa é certa: “O Brasil será impactado em qualquer cenário quando se trata de abastecimento de combustíveis”, diz ele, em entrevista ao NeoFeed.

Pinheiro explica que, embora o Brasil tenha se tornado autossuficiente na extração de petróleo, o País não atingiu a soberania energética nos combustíveis porque a capacidade de armazenamento é insuficiente.

Atualmente, o País tem um déficit de produção de combustíveis de 600 mil barris por dia, o que equivale a 20% do nosso mercado.
Para reduzir a distância entre a produção e o armazenamento, Pinheiro defende uma precificação racional dos derivados de petróleo para melhorar a competitividade das refinarias independentes.

De que maneira? Fazendo com que o preço de referência da Agência Nacional de Petróleo (ANP) e preço de mercado sejam iguais. Essa diferença gera distorções de todo o tipo - inclusive afastando potenciais investidores.

“Está cheio de investidores querendo investir em refino. Não precisa de um real de dinheiro público para isso. A expectativa é de investimentos em novas refinarias de R$ 75 bilhões”, diz o presidente da Refina Brasil, que tem entre as associadas as empresas Acelen, Atem, Brasil Refino, Dax Oil, Paraná Xisto, Brava Energia e SSOil Energy.

Confira, a seguir, os principais trechos da entrevista:

O que o conflito no Oriente Médio impacta no abastecimento no Brasil?
Temos dois pontos: guerra e dependência. Isso depende de como cada mercado vai reagir. É impossível prever como a guerra vai se desenrolar, como vai terminar ou quais vão ser as consequências de curto, médio e longo prazo decorrentes desse conflito. Agora, uma coisa a gente tem certeza: o Brasil é impactado em qualquer cenário. É impossível isso não bater em preço na bomba, e isso deixou evidente como o Brasil é dependente em relação à importação de combustíveis.

Por quê?
Porque para além da escalada de preços, que a gente não tem muito controle, a gente paga frete e seguro para importar. Então, ele fica ainda mais caro. Se a gente não é autossuficiente, a gente enfrenta um problema grave. A gente tem um déficit de produção de combustíveis de 600 mil barris por dia, isso é 20% do nosso mercado hoje. Esse déficit aumenta todo ano.

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Evaristo Pinheiro, presidente da Refina Brasil

Como resolver isso?
O Brasil, reiteradamente, vem desde 2013 abdicando da sua soberania energética. A gente se tornou autossuficiente em petróleo, na extração de petróleo. Hoje nós produzimos mais petróleo do que necessitamos de consumo no Brasil, mas a gente não atingiu a soberania energética nos combustíveis. Isso é algo bastante ruim para o país. Porque a gente não tem armazenamento suficiente, a capacidade de armazenamento aqui é muito pequena.

Qual a medida a ser adotada a curto prazo?
É a correção do preço de referência. O que que isso significa? Significa o seguinte: a ANP calcula um preço de petróleo que ele serve para calcular para royalties e participações especiais. Mas a fórmula está desatualizada. Isso gera um preço de petróleo reiteradamente menor do que o preço de mercado. O preço de referência da ANP gera um petróleo de entre 5% e 10% menor do que o preço de mercado. Esse preço é um preço oficial. E, como o preço oficial, as petroleiras também usam esse preço para informar à Receita Federal o preço que elas estão exportando petróleo para elas mesmas. Isso é chamado uma operação entre partes relacionadas, a Receita não aceita o preço de nota fiscal dessa operação, exige um preço de transferência para calcular imposto de renda e contribuição social sobre lucro líquido.

Qual é o preço então que as petroleiras usam?
O preço da ANP. Só que esse preço está menor do que o preço de mercado. Se esse preço está menor que o preço de mercado, acontece um fenômeno muito bom para as petroleiras e muito ruim para o Brasil, que é o seguinte: a base de cálculo do imposto de renda e CSLL é menor do que o deveria ser. Então eu tenho uma elisão fiscal, não é crime, não é ilegal, mas não é arrecadação que deveria estar acontecendo. E ao ter essa diferença, essa distorção tributária, eu tenho um impacto para as refinarias independentes, que compram petróleo, que não produzem o seu próprio petróleo.

E qual é o impacto para as refinarias independentes?
Ora, a petroleira prefere exportar do que vender no mercado interno. Porque se ela vender no mercado interno o petróleo, o que que vai acontecer? Ela vai precisar emitir nota fiscal. E aí ela vai pagar o imposto de renda CSLL sobre o petróleo.

Como isso chega no combustível?
Eu acabo vendendo combustível mais caro no Brasil. Eu tenho um desestímulo, não só à sobrevivência das refinarias privadas que já existem, mas um desestímulo a novos investimentos em refino no Brasil. A ANP precisaria corrigir a fórmula inteira para um ganha-ganha para todo mundo.

O que você chama de ganha-ganha?
Eu teria um ganha um ganho para União que passaria a arrecadar R$ 15 bilhões a mais por ano de royalties, participações especiais, imposto de renda e CSLL. Eu teria um ganho para os estados e municípios com royalties, participações especiais, e um ganho para o Brasil, porque eu passaria a comprar petróleo nacional mais barato, eu seria mais competitivo, poderia vender combustível mais barato, poderia concorrer melhor com a com as refinarias da Petrobras e eu tenho um mercado efetivamente competitivo e atraindo investimentos do Brasil. Está cheio de investidores querendo investir em refino; cheio. Não precisa de um real de dinheiro público para isso. A expectativa é de investimentos em novas refinarias de R$ 75 bilhões.