O mercado financeiro internacional abriu a segunda-feira, 23 de junho, com expectativa de aumento dos preços do petróleo e queda das ações, na expectativa de uma prometida retaliação do Irã aos bombardeios americanos em três de suas instalações nucleares durante o fim de semana.
Mesmo com um ataque iraniano a uma base aérea dos EUA no Catar, que não deixou vítimas, o cenário de tensão ficou para trás: os preços do petróleo do mercado futuro caíram mais de 7% e o S&P 500 encerrou o dia com um ganho de quase 1%.
O petróleo Brent, referência internacional, caiu quase 6%, para US$ 71,11 o barril, após os ataques, que tiveram como alvo a base aérea de Al Udeid, perto de Doha, onde 10.000 soldados americanos estão estacionados. O Catar afirmou ter repelido os ataques com sucesso.
O petróleo bruto foi negociado a US$ 81,40 o barril na segunda-feira, em meio a preocupações de que o Irã atacaria a infraestrutura petrolífera ou tentaria fechar o Estreito de Ormuz em retaliação ao ataque dos EUA às instalações nucleares iranianas no fim de semana – nenhuma das possibilidades ocorreu.
O West Texas International, referência dos EUA, caiu em uma quantia semelhante, para menos de US$ 70, devolvendo em grande parte os ganhos obtidos desde que Israel lançou seu ataque surpresa contra as instalações nucleares e defesas aéreas do Irã há 10 dias.
Antes da retaliação iraniana, o presidente dos Estados Unidois, Donald Trump, publicou uma postagem sobre os preços do petróleo bruto nas redes sociais. "Todo mundo, mantenha os preços do petróleo baixos", postou Trump no Truth Social, em letras maiúsculas, na manhã de segunda-feira. "Estou assistindo! vocês estão fazendo o jogo direto do inimigo."
Pelo menos três fatores foram alinhados por analistas para explicar o surpreendente desfecho de mais um dia de tensão no conflito do Oriente Médio, com os mercados de capitais permanecendo calmos.
O primeiro deles foi sintetizado pelo CEO do Deutsche Bank, Christian Sewing: “Isso ocorreu porque as empresas estão muito mais bem preparadas para eventos de alto risco do que antes”, disse o executivo.
O mesmo argumento foi citado por Daniel Hynes, estrategista sênior de commodities da ANZ Research, para quem o mercado de petróleo também está mais bem equipado para responder a choques do que no passado devido à capacidade ociosa dos exportadores.
Segundo ele, eventos geopolíticos envolvendo produtores podem ter um grande impacto nos mercados de petróleo, mas, nos últimos anos, os preços tendem a recuar rapidamente à medida que os riscos diminuem.
Além disso, outros analistas pontuaram que os mercados já haviam precificado um alto grau de incerteza sobre o Oriente Médio na sexta-feira, quando os futuros do petróleo Brent de referência fecharam em torno de US$ 77 , acima dos US$ 70 antes de Israel atacar o Irã pela primeira vez.
A oscilação do dia, portanto, reflete a correção de preços inflados nos últimos dias pelo chamado “prêmio de guerra”, diante da possibilidade de escalada no conflito entre Irã, Israel e EUA.
Ação calculada
É neste sentido que o segundo fator sem encaixa: como o Irã sinalizou o ataque previamente ao governo do Catar e evitou alvos civis, o mercado interpretou a ação como calculada, reduzindo a percepção de risco sobre a oferta global de energia e pressionando fortemente as cotações do petróleo.
"A decisão do Irã de retaliar por meio de um ataque de mísseis bem telegrafado contra bases americanas implica que eles estão menos propensos a usar petróleo como arma", disse Michael Alfaro, diretor de investimentos da Gallo Partners, um fundo de hedge focado em energia e indústria.
Segundo ele, os preços devem permanecer elevados, em geral, devido ao aumento das tensões, mas os fundamentos continuam sugerindo que o mercado de petróleo está bem abastecido.
O terceiro motivo para um final feliz dos mercados na segunda-feira diz respeito à decisão iraniana de não cumprir a promessa de fechar o Estreito de Ormuz - um ponto de trânsito crucial para o abastecimento global de petróleo.
No ano passado, cerca de 20 milhões de barris de petróleo foram transportados por dia pela hidrovia, representando cerca de 20% do abastecimento total mundial. A maior parte desse petróleo tinha como destino a Ásia.
Países como Japão e Taiwan dependem do Oriente Médio para quase toda a sua importação de petróleo bruto, o que significa que qualquer interrupção no tráfego pela passagem pode causar um grande impacto econômico. A China é a maior compradora de petróleo iraniano.
O Irã é o terceiro maior produtor de petróleo da Opep e certamente deve ter avaliado que fechar o Estreito de Ormuz pouco acrescentaria à sua agenda no momento.
"De certa forma, já vimos esse filme antes. De todas as tensões geopolíticas que vimos no Oriente Médio, seja com Israel, Irã ou outros, ainda não vimos o fechamento do Estreito de Ormuz, embora a questão sempre revele sua face feia", disse Andy Lipow, presidente da Lipow Oil Associates.
Pelo menos dois superpetroleiros fizeram meia-volta perto do estreito após os ataques militares dos EUA ao Irã, mostram dados de rastreamento de navios. De qualquer forma, mais de uma semana de violência na região levou os navios a acelerar, pausar ou alterar suas viagens.
Os investidores ainda estão avaliando qual prêmio de risco geopolítico atribuir aos preços do petróleo. O HSBC espera que os preços do Brent subam acima de US$ 80 o barril, considerando uma maior probabilidade de fechamento do estreito, mas recuem novamente se a ameaça de interrupção não se concretizar, informou o banco na segunda-feira.