De olho na convergência entre a mídia tradicional e o digital, a Play9 nasceu em 2019 com a ideia de criar uma network onde a audiência não estaria mais concentrada em afiliadas. E sim em “emissoras” personificadas em um casting de influenciadores, com conteúdos em diferentes telas e formatos.

O elenco mesclava nomes já estabelecidos na mídia e novas celebridades que fizeram fama no online. E essa mesma conexão se traduzia na dupla de fundadores da mediatech: o youtuber Felipe Neto e João Pedro Paes Leme, jornalista com uma passagem de 20 anos pela Rede Globo de Televisão.

Assim como a emissora da família Marinho, no entanto, a Play9 foi além da sua tese inicial. E, para reorganizar sua “grade”, está criando uma holding para dar mais visibilidade a todos os seus tentáculos, além de anunciar a compra do Top10, canal do YouTube, no seu primeiro M&A sob essa nova estrutura.

“Muitos ainda veem a Play9 como uma empresa de casting, o que é muito reducionista, mas também deixa claro que estávamos nos comunicando mal”, diz João Pedro Paes Leme, que passará a ser o CEO do grupo, rebatizado como Play9 Content Group.

“Internamente, essa evolução já era quase compreensível. Mas, para fora, sempre foi uma confusão”, afirma Leme, ao NeoFeed. “Nós nascemos dos influenciadores e é natural que eles ofusquem os outros negócios. Mas, agora, queremos dar luz às demais operações.”

Na nova etapa, quatro divisões ganharão status de empresa. Já a estrutura societária permanece inalterada. Além de Leme e Felipe Neto – hoje, com um assento no board e afastado do dia a dia, esse quadro inclui nomes como o fundo M4 Ventures, de Clécio Guaranys, fundador e ex-CEO da Bemobi.

O organograma, por sua vez, abrirá espaço para duas posições abaixo de Leme. Thiago Meirelles será o COO do grupo, enquanto Gustavo Serra vai acumular o cargo de CCO com a vice-presidência da Play9, uma das empresas que, a partir de agora, irão compor o Play9 Content Group.

“A ideia é que eles olhem a harmonização de conteúdo e da operação de toda a holding”, afirma Leme. “Não vamos perder o olhar de ecossistema. As empresas vão seguir se falando e bebendo do todo. Mas agora, com metas – que às vezes se misturavam – separadas para cada uma delas.”

Fazer essa distinção, também sob o ponto de vista dos clientes, é mais um racional por trás desse movimento. Especialmente no que diz respeito aos erros de interpretação que a antiga estrutura, eventualmente, sugeria.

“Temos dois grandes clientes, que são os criadores de conteúdo e as marcas. E todos os serviços falam com essas duas pontas, mas nunca devem se misturar”, diz Leme. “Estamos deixando mais claro que sempre atuamos agnosticamente.”

Isso se aplica, principalmente, a duas das companhias da holding. A primeira é a Play9, que vai herdar justamente o casting de influenciadores e criadores de conteúdo que deu origem ao grupo. E que reúne mais de 80 artistas, youtubers, instagrammers e tiktokers.

Essa lista tem nomes com os jornalistas Fátima Bernardes e Tino Marcos; a comentarista Gabriela Prioli; a atriz Giovanna Ewbank; além de creators como Felipe Castanhari e Thallyson Borges. E soma 6 bilhões de visualizações mensais em plataformas como YouTube, TikTok, Instagram e Kwai.

A segunda empresa é a PlayGround, agência de conteúdo e marketing de influência que será comandada por Andrea Hirata. Aqui, diferentemente da Play9, onde os clientes são os influenciadores, o foco são as marcas.

Nessa ponta, o grupo, dono de um faturamento de R$ 170 milhões em 2024, já contabiliza uma média de 1,7 mil a 1,8 mil campanhas por ano, com aproximadamente 450 marcas. Entre elas, clientes como Amazon Prime Video, NBA Brasil e Bob’s.

“Nosso papel é fazer essas marcas entenderem que temos uma área que cuida para elas sejam protagonistas nas redes sociais”, diz o CEO. “E com influenciadores que não necessariamente são os da Play9. Existe um chinese wall em relação ao nosso casting.

O novo desenho envolve ainda a produtora audiovisual PlayAction, que será liderada por Luiza Maggessi. E o PlayNest, centrado em micro, pequenos e nano influenciadores, com um recorte de até 100 mil seguidores, que terá Gabriel Paes Leme como diretor-geral.

Criado em 2023, com o racional de trabalhar com a “base da pirâmide” dos influenciadores, o PlayNest inclui desde ferramentas de profissionalização até a oportunidade deles se conectarem com ações das marcas. Hoje, são 53 mil usuários cadastrados e 23 mil ativos, que somam 1,2 bilhão de seguidores.

De Mostardas para o mundo?

Outra vertente que acompanha a criação da holding é o plano de dar mais autonomia para as quatro empresas. E isso envolve uma maior abertura para que cada uma delas possa captar recursos e busque parcerias estratégicas, o que pode incluir joint ventures e aquisições.

“Até então, quando se olhava a Play9 como aquela geleia geral que muitos não entendiam, isso era mais difícil”, diz Leme. “Agora, a Play9, por exemplo, pode fazer um M&A com outra empresa de casting e essa companhia não precisa necessariamente ser sócia da holding.”

Essa avenida está sendo inaugurada com a aquisição do Top10, canal do YouTube que será integrado à Play9 e que Leme classifica como uma espécie de “Superinteressante do Digital”, ao se concentrar em curiosidades como os maiores vulcões do planeta ou a formação das galáxias.

Com o acordo, cujo valor não foi revelado e inclui três tranches, Mateus Souza e Lucas Barrios permanecerão na operação, com uma fatia minoritária. A dupla criou o canal em 2007, na pequena Mostardas, cidade do litoral gaúcho.

De lá para cá, a operação expandiu bastante o seu alcance. Hoje, o Top10 tem 9,5 milhões de inscritos, além de uma versão em inglês, criada na pandemia e que já responde por quase 40% da sua receita. E essa foi uma das razões de o canal ter entrado no radar da Play9.

“O Top10 nos dá a possibilidade de testar algo que sempre sonhamos, que é crescer em territórios que não só o Brasil”, diz Leme. “É só um primeiro passo, mas que abre um caminho para trazermos receitas de fora.”

Ao lado dos Estados Unidos, Inglaterra e Austrália, o mapa à frente passa por países fluentes como Suécia, Dinamarca, Noruega e Holanda. Esse não é, porém, o único racional por trás da aquisição.

Além da possibilidade da criação de um conceito de grade no canal, com a inclusão de outros conteúdos, Leme destaca a bagagem que os dois fundadores trarão para a Play9. “Eles nasceram no YouTube, sabem apertar todos os parafusos e têm uma visão raiz da plataforma”, diz.

Essa orientação se conecta com o que ele chama de uma terceira guinada do YouTube, marcada por uma volta às origens da plataforma após o investimento no Shorts, seu formato de vídeos curtos.

“O YouTube sofreu sem saber se era o TikTok ou o próprio YouTube. E muitos criadores tiveram uma crise existencial nesse período”, afirma. “Mas houve quem preservasse a ideia original dos vídeos longos, que é o território da plataforma e que está ressurgindo fortemente agora. E o Top10 está nesse time.”