Após mais de três anos com um cardápio restrito, basicamente, ao iFood, o mercado brasileiro de delivery de comida vive a expectativa de um reaquecimento em seu cenário de competição. E uma das provas do apetite nessa disputa envolve dois nomes que estão movimentando para fazer frente ao aplicativo brasileiro.
Marca internacional da gigante chinesa Meituan, com chegada prevista ao Brasil em novembro de 2025, a Keeta deu entrada em dois processos recentes contra a 99Food, braço de delivery da 99, que, por sua vez, é controlada pela Didi Chuxing, outro grande player do país da Grande Muralha.
Na primeira ação, registrada nesta quinta-feira, 14 de agosto, no Foro Central de São Paulo, a Keeta pede a suspensão de cláusulas anticompetitivas, de bloqueio, que estariam sendo impostas pela 99Food a restaurantes parceiros estratégicos.
De acordo com a empresa, tais cláusulas são um mecanismo direcionado de exclusão de mercado, sem justificativa econômica legítima. E foram criadas especificamente para impedir a sua entrada no Brasil, sufocando a concorrência, fechando o mercado e “reduzindo a inovação”.
A companhia alega que, ao relançar seu serviço de delivery, em junho, após encerrá-lo em 2023, a 99 passou a oferecer pagamentos antecipados para grandes cadeias de restaurante. Os valores viriam acompanhados da proibição dessas redes negociarem com a Keeta.
A proibição, entretanto, não se estenderia ao iFood, que detém uma fatia de cerca de 80% do segmento. Essa é uma prática que, na visão da Keeta, busca criar um duopólio entre a líder do mercado e a 99Food, criando uma “barreira artificial” a novos entrantes.
“Essas cláusulas não estão em conformidade com a lei e as regras de concorrência, como a 99Food alega. São abusivas e anticoncorrenciais, e tentam fechar o mercado para apenas dois concorrentes, limitando a escolha do consumidor e minando os princípios de um mercado livre e justo”, afirmou a Keeta, em nota.
Segundo a empresa, até o momento, a 99 teria abordado mais de 100 redes no País, oferecendo pelo menos R$ 900 milhões em pagamentos antecipados, vinculados à assinatura de contratos nesses moldes.
“Esse valor é quase equivalente ao R$ 1 bilhão que a DiDi anunciou para reiniciar a 99Food”, ressalta a companhia, que, na ação, solicita a suspensão imediata das cláusulas de bloqueio e a proibição de sua inclusão em futuros contratos.
Já no segundo processo, a companhia acusa a 99 de concorrência desleal e uso indevido de marca, a partir da compra, no Google Ads, de palavras-chave com o termo Keeta e correlatos.
A empresa alega que, ao pesquisar essas palavras, o consumidor visualiza anúncios patrocinados da 99Food, deslocando o resultado orgânico da Keeta para posições inferiores no serviço de busca.
Na ação, a companhia teve deferido na última terça-feira, 12 de agosto, o pedido de concessão de tutela de urgência para que a rival cesse imediatamente essa prática, sob pena de multa diária mínima de R$ 20 mil, além do pagamento de indenização por danos morais de R$ 100 mil.
Procurada, a 99 não se manifestou até o fechamento dessa reportagem. Outros valores, no entanto, indicam que essa disputa ainda vai dar o que falar. E trazem um termômetro do que está envolvido nesse caldeirão.
Se a 99 anunciou o relançamento do 99Food, como parte de um investimento de R$ 1 bilhão, a Meituan também não está economizando com a chegada da Keeta ao País. Com a previsão de iniciar suas operações em novembro, o grupo projeta um aporte de R$ 5,6 bilhões no Brasil nos próximos cinco anos.
O fato é que, em meio a esse imbróglio judicial, e aos esforços e recursos dedicados a essa esfera, quem pode seguir se beneficiando é o iFood, que, por sua vez, também anunciou um pacote bilionário recentemente.
No início de agosto, a empresa controlada pela Prosus divulgou que planeja investir R$ 17 bilhões no Brasil para o ano fiscal que vai de abril de 2025 até março de 2026. O montante representa um crescimento de 25% sobre o valor aportado no exercício fiscal anterior.