Ligar um IPO e a listagem na bolsa de valores com um valuation de três dígitos nem sempre é o melhor caminho para empresas de tecnologia. No caso das principais startups de inteligência artificial (IA), atualmente o melhor caminho tem sido realizar rodadas privadas de captação de recursos.
Uma transação secundária ainda em curso da OpenAI, dona do ChatGPT, avalia a fabricante de modelos de IA em US$ 500 bilhões. Uma captação recente da SpaceX, do bilionário Elon Musk, deu à empresa de tecnologia aeroespacial um valor de mercado de US$ 400 bilhões. Por sua vez, a Anthropic, criadora do aplicativo Claude, está em um processo de financeiro que resultará na avaliação de US$ 170 bilhões.
A questão agora é como reagiria o mercado caso essas companhias resolvessem, eventualmente, abrir o capital - o que testaria a capacidade de acomodações de possíveis listagens com valores estratosféricos.
“Esses são preços extraordinários, mas para ativos extraordinários”, diz Mary D'Onofrio, sócia da empresa de capital de risco Crosslink Capital, ao Wall Street Journal.
Algumas dessas empresas, hoje financiadas pelo capital de risco, estão de fato pensando nessa escalada. Uma delas é a Databricks, em fase de abertura de nova rodada, que poderá fazer com que sua avaliação de mercado alcance US$ 100 bilhões.
O presidente-executivo da Databricks, Ali Ghodsi, diz acreditar que a empresa tenha chances de atingir um market cap de US$ 1 trilhão. “Dissemos aos investidores e funcionários que seremos uma empresa de capital aberto quando chegar a hora”, afirmou ao WSJ. “Mas, hoje, estamos focados em construir um negócio de um trilhão de dólares para as próximas décadas.”
Nos últimos 35 anos, desde 1980, apenas cinco empresas de tecnologia ultrapassaram a capitalização de mercado de US$ 100 bilhões após os IPOs nos EUA (já levando em conta a inflação do período), calcula Jay R. Ritter, pesquisador do Warrington College of Business da Universidade da Flórida.
Os dados excluem emissores estrangeiros que utilizam recibos de depósito americanos, como a empresa chinesa de comércio eletrônico Alibaba.
Na ordem de classificação, as listagens foram a cisão da AT&T Wireless em 2000, avaliada em US$ 138,6 bilhões em valores atuais, seguida pelo IPO do Facebook (em 2012), do Airbnb (2020), da Coupang (2021) e da Palm (2000). Os dados levam em consideração o preço das ações no fechamento do primeiro dia de negociação de cada ação para chegar ao valor de mercado.
A capitalização de mercado agregada de todos os 3.334 IPOs de tecnologia que ocorreram entre 1980 e 2024 foi de pouco mais de US$ 5,9 trilhões em uma base ajustada pela inflação, segundo os cálculos de Ritter.
O ano 2000 ainda lidera essa corrida. Os valores de mercado dos IPOs de empresas de tecnologia durante o auge da bolha da internet somaram mais de US$ 976 bilhões, na cotação atual.
Foram necessárias duas décadas para que o cenário de IPOs pudesse chegar perto desse patamar. Em 2021, as avaliações das aberturas de capital das empresas de tecnologia na Bolsa dos Estados Unidos totalizaram mais de US$ 905 bilhões, segundo o pesquisador da Universidade da Flórida.
“Existe a possibilidade de que algumas dessas empresas sejam como Alphabet, Meta, Nvidia e Microsoft, entre outras”, diz o Ritter.
Essas empresas conseguiram crescer sem que a concorrência afetasse suas margens de lucro. Cada uma delas também é avaliada na casa dos trilhões. Em julho, por exemplo, a Nvidia bateu US$ 4 trilhões.
Fato é que as avaliações atuais dessas startups ainda não listadas, principalmente as de IA regenerativa, mostra que há o surgimento de uma travessia diferente de qualquer geração anterior. Hoje, elas vendem serviços que substituem o trabalho humano. Como o volume de trabalho humano é muito maior do que o de software, as empresas que ocupam essa fatia de mercado podem se tornar gigantescas.
A crença está justamente nas taxas de crescimento recentes. A OpenAI, por exemplo, tem uma receita anualizada de US$ 13 bilhões, e está a caminho de ultrapassar US$ 20 bilhões até o final do ano, de acordo com uma fonte familiarizada com a situação financeira da empresa.
“Qualquer negócio que você faça no mundo, de energia à saúde, pode ser aplicado à IA”, diz Umesh Padval , ex-diretor administrativo da empresa de capital de risco Thomvest Ventures. E os investidores de capital de risco querem ter exposição a isso, disse ele.
A avaliação geral é que os investidores do mercado de empresas abertas também desejam essa exposição. “O mercado de IPOs certamente poderia acomodar empresas privadas avaliadas em mais de US$ 100 bilhões”, afirma Matthew Kennedy, estrategista sênior da Renaissance Capital, provedora de pesquisa pré-IPO e fundos negociados em bolsa focados em IPOs.
“O mercado de IPOs dos Estados Unidos representa uma das maiores reservas de capital do mundo. Acredito que veremos isso acontecer nos próximos anos”, complementa.