Mercado de trabalho e renda ainda fortes evitam que a economia vá a nocaute, mas não impedem que o Brasil “ande para trás”. Sinal de retrocesso é a queda na confiança em todos os setores da economia. Trajetória que, se intensificada, deverá impor desafios ao presidente Lula que será instigado a fazer mais a caminho das eleições de 2026 para arrepio da Faria Lima atenta às contas públicas e à resistência do governo e do Congresso a cortar gastos.

No cardápio de “medidas” para driblar o pessimismo e fortalecer a atividade, traçado por economistas de mercado em conversas com o NeoFeed, estão possível redução mais agressiva da Selic; ampliação de programas sociais existentes e novas iniciativas que podem driblar o Orçamento; maior aporte de recursos para empresas atingidas pelo tarifaço; expansão de crédito subsidiado e mais negociação (que retaliação) do governo brasileiro com o americano para conter o apetite de Donald Trump por mais tarifas ou sanções que podem ser anunciadas após o julgamento do ex-presidente Jair Bolsonaro em curso no Supremo Tribunal Federal (STF).

Bola cantada, a taxa de expansão do Produto Interno Bruto (PIB) do Brasil desacelerou de 1,3% no primeiro trimestre para 0,4% de abril a junho. O resultado superou ligeiramente a projeção mediana de analistas que veem desaquecimento da atividade no segundo semestre. Em julho, a indústria voltou a cair. Na quinta-feira e sexta, 11 e 12 de setembro, o IBGE publicará pesquisas de vendas no varejo e serviços também de julho. A ver.

Apesar da expectativa de analistas, a economia pode não enfraquecer o bastante para que o Banco Central (BC) relaxe na vigília contra a inflação. Postura que poderá testar a paciência de Lula com o rigor monetário da instituição que mira inflação de 3% e não o teto da meta, 4,5%. Variação que, nos governos Lula 1 e 2, correspondia à meta central aceita à época pelo presidente por não impor arrocho tão grande à atividade.

Selic nas alturas a contaminar o custo e a oferta de crédito, além de turbinar o endividamento de empresas e famílias, é um dos fatores que minam a confiança, inclusive, quanto à manutenção de empregos já colocada à prova pelos efeitos das tarifas impostas pelos EUA que, reporta a S&P Global, já são sentidos nas empresas brasileiras.

O índice dos gerentes de compra (PMI, na sigla em inglês) da S&P sobre a atividade industrial caiu de 48,2 pontos em julho para 47,7 em agosto. Deterioração mais intensa desde 2023 por impactos negativos das tarifas como queda na demanda, suspensão de encomendas contratadas, redução na compra de insumos para otimizar estoques e menor confiança dos clientes, informou a agência em nota, lembrando que 50 pontos é a fronteira entre expansão e contração da atividade.

Confiança abatida por juro e tarifaço

O Instituto Brasileiro de Economia da Fundação Getulio Vargas (Ibre FGV) confirma a perda de confiança do consumidor, da construção civil, da indústria, do comércio e de serviços. Nos últimos meses, todos se afastaram, um pouco mais, de 100 pontos – referência de neutralidade. Em alguns casos, os índices tiveram as maiores quedas desde 2021.

Emblemático, o Índice de Confiança Empresarial que consolida sondagens da indústria de transformação, serviços, comércio e construção – combo que representa mais de 50% da economia nacional – recuou em agosto pelo terceiro mês consecutivo. Em três meses, declinou 4,9 pontos percentuais, para 88,2 pontos, patamar observado no pós-pandemia. Período em que a economia global e a brasileira estavam em reestruturação, penalizadas pela ruptura de cadeias de produção e suprimentos que puxou a inflação ao maior nível em décadas.

E, como consequência, ciclos igualmente históricos de aperto monetário. Nas maiores economias, as altas taxas de juros estão sendo revertidas lentamente por incertezas com repercussões do tarifaço de Trump. E passo relevante deverá ser dado pelo Federal Reserve (Fed) em 17 de setembro. A projeção de corte segue em 0,25 ponto, para 4% a 4,25%. Na Zona do Euro, o Banco Central Europeu (BCE), que se reúne na quinta-feira, 11 de setembro, tende a manter a taxa em 2% após cortes sucessivos desde meados no ano passado.

No Brasil, a queda na confiança de consumidores e empresários quanto à situação presente e futura favorece um cerco ao BC por ora poupado, ao menos publicamente, pelo presidente Lula e pelo ministro Fernando Haddad. Entretanto, a instituição é apontada como excessivamente conservadora por integrantes do governo e empresários que atribuem a desaceleração da atividade ao juro alto por tempo prolongado – mantra do BC em defesa da meta de inflação de 3%.

A inflação corrente e as expectativas declinam – a conferir o IPCA de agosto na quarta-feira, 10 –, mas estão distantes de 3% até 2028, pontua a Focus, o que explica Selic em 15% a ser reprisada no dia 17 pelo Copom que, neste ano, se reúne também em novembro e dezembro. Confirmada a estabilidade da Selic, acalentada pelo próprio BC ao reiterar seu compromisso com a meta, será a terceira vez que a taxa estará cravada em 15%, consolidando juro real ao redor de 10%.

Juro que reveste o sentimento pessimista espraiado em toda a economia por contratar um esfriamento maior da atividade, agravar a preocupação com o custo financeiro sobre negócios de toda ordem e justificar o pé atrás de empresas e bancos com a demanda futura devido ao endividamento das famílias e avanço da inadimplência. Condições que explicam a retração das instituições financeiras na concessão de empréstimos.

Nesse sentido, dados do BC, referentes a junho, sobre endividamento e comprometimento da renda dos brasileiros com pagamento de juros não dão refresco. O endividamento total em proporção da renda atingiu 48,7%, parcela mais expressiva em quase um ano. O comprometimento da renda com a fatura de juros alcançou 27,6%. A inadimplência dos empréstimos com recursos livres dos bancos chegou a 5,1% - a maior em oito anos. Inequívoco sinal de alerta para os balanços.