Desde a intervenção do presidente Jair Bolsonaro, na semana passada, a Petrobras vive dias tensos que têm se refletido em quedas substanciais do seu valor de mercado, a partir do anúncio da substituição de Roberto Castello Branco, atual CEO da companhia, pelo general Joaquim Silva e Luna.
No centro dessa turbulência, estão as críticas de Bolsonaro à política de paridade de preços dos combustíveis praticada pela estatal e os reajustes nos combustíveis decorrentes dessa abordagem. Em sua primeira manifestação pública desde o imbróglio e, provavelmente, a última à frente da companhia, Castello Branco não se furtou a falar sobre o tema.
“Se o Brasil quer ter uma economia de mercado, precisa ter preço de mercado”, afirmou Castello Branco, em conferência com analistas nesta manhã de quinta-feira. “O preço abaixo do mercado gera muitas consequências. Algumas previsíveis, outras imprevisíveis. Mas todas negativas.”
O executivo também destacou que, “em pleno século XXI”, é surpreendente o tema da paridade ainda chamar tanta atenção. “Os combustíveis são commodities, cotadas em dólares, os preços são formados pela oferta e demanda global. Não há como se desviar deles”, observou.
Ainda em referência aos acontecimentos da última semana, Castello Branco reforçou que a atual gestão foi acusada injustamente de falta de transparência e que nenhuma empresa privada do mundo revela detalhes da sua política comercial.
Ele também fez questão de dar mais detalhes do processo de definição de preços na companhia. “Temos times dedicados e todas as nossas decisões são data driven. Não são baseadas em achismos”, frisou. “É um trabalho de equipe, com executivos que analisam o mercado com base nesses inputs que eles recebem. Ninguém fica sentado em casa aumentando o preço do combustível.
Essa última frase remete a outro tema destacado nas críticas de Bolsonaro, o de que Castello Branco estava “há 11 meses de casa, sem trabalhar”, algo “inadmissível” na visão do presidente, também foi comentado pelo ainda presidente da estatal, mesmo que de forma indireta.
“O home office contribuiu não só para diminuir a contaminação pela Covid-19, mas também para aumentar a produtividade”, afirmou. Ele também disse que a empresa irá migrar para um regime híbrido de trabalho assim que houver um percentual significativo da população vacinada.
“Pegamos um paquiderme lento e conseguimos fazê-lo voar”, acrescentou o executivo, ressaltando as estratégias de reestruturação implantadas em sua gestão de pouco mais de dois anos e, em particular, sob o impacto da pandemia. “A Petrobras de hoje é muito melhor do que a companhia de um ano atrás.”
Apesar de destacar esses avanços, o executivo disse que ainda há muito a ser feito, especialmente em frentes como a continuidade das estratégias de cortes de custos, o plano de desinvestimentos e as iniciativas de transformação digital.
“Não vejo necessidades de mudanças no plano estratégico. Se ele for respeitado, a execução, sim, deverá seguir em ritmo acelerado”, afirmou. “Mas, quanto ao futuro, eu não devo nem posso opinar. Em março eu deixarei o cargo. Cabem aos que me sucederem tomarem as ações. Isso não é assunto meu.”
Resultados robustos
Entre outubro e dezembro, além de reverter o prejuízo de R$ 1,5 bilhão do terceiro trimestre, a Petrobras reportou um salto de 634,6% em seu lucro líquido, para R$ 59,9 bilhões, na comparação com igual período de 2019.
O desempenho na última linha do balanço no quarto trimestre foi atribuído a fatores como a reversão de impairment em R$ 31 milhões e ganhos cambiais de R$ 20 bilhões. No ano, porém, houve recuo de 82,3% no lucro líquido, para R$ 7,1 bilhões, em função de questões como a queda de 35% do preço do Brent em dólares e a desvalorização de 31% do real em relação à moeda americana.
A receita líquida da companhia caiu 8,3% no quarto trimestre, para R$ 74,9 bilhões, e 10% no ano, para R$ 272 bilhões. Juntamente com a queda nos preços do Brent em dólares, a companhia atribuiu o desempenho inferior ao recuo nas vendas de derivados.
Já o Ebtida ajustado cresceu 28,8% entre outubro e dezembro, para R$ 47 bilhões, e 10,6% em 2020, para R$ 142,9 bilhões. No ano, os investimentos da Petrobras totalizaram US$ 8,1 bilhões, uma redução de 25% na comparação com 2019.
As ações da empresa estavam sendo negociadas a R$ 25,21, por volta das 10h30, com alta de 3,07%. Em 2021, os papéis da estatal acumulam uma queda de 13,9%. Segundo a consultoria Economatica, levando-se em conta o pregão da quarta-feira, o valor de mercado da empresa recuou 16% nesse ano.
De acordo com a Economatica, na esteira da intervenção de Bolsonaro, entre os dias 18 e 22 de fevereiro, a Petrobras perdeu R$ 102,4 bilhões em valor de mercado. No período, as ações da companhia tiveram uma desvalorização de quase 26%.
Desde então, os papéis vêm reagindo na B3. De lá para cá, a alta ficou perto de 12,5%. Em termos de valor de mercado, a companhia recuperou R$ 32,4 bilhões.