Em 13 de maio, o empresário Elon Musk, fundador da Tesla, anunciou que a fabricante de carros elétricos não aceitaria mais bitcoins para a compra de seus veículos, devido às preocupações ambientais que envolvem a mineração da criptomoeda.
“Criptomoedas são uma boa ideia em muitos níveis e acreditamos que elas têm um futuro promissor, mas isso não pode ter um grande custo para o meio ambiente”, disse Musk, na ocasião.
O posicionamento de Musk deflagrou um mau humor com a moeda que tem levado a quedas expressivas nos últimos dias. Só ontem, a moeda digital caiu 35%. Hoje, se recupera do baque e voltou a ser cotada acima de US$ 40 mil. Mas está longe de seu patamar recorde de meados de abril, quando a cotação superou os US$ 64 mil.
Musk não é o único a se preocupar com esse tema. O cofundador da Microsoft, Bill Gates, assim como a secretária do Tesouro dos Estados Unidos, Janet Yellen, também já manifestaram suas restrições à moeda digital – a questão ambiental está no centro das preocupações de ambos.
Afinal, Musk, Gates e Yellen têm razão? No estudo “É possível amar bitcoin e meio ambiente ao mesmo tempo?”, divulgado com exclusividade pelo NeoFeed, Marcella Ungaretti, analista de research ESG da XP, e Jennie Li, estrategista de ações da XP, tentam responder essa pergunta.
Em primeiro lugar, o bitcoin, de fato, é um problema ambiental pela forma como é minerado, usando computadores potentes que consomem muita energia. “Vários computadores trabalham ao mesmo tempo competindo entre si”, afirma Li. “É um processo muito ineficiente.”
Segundo um estudo feito pela Cambridge Center for Alternative Finance (CCAF), o consumo estimado de energia para minerar bitcoins salto saltou de 6,6 terawatts-hora, no início de 2017, para 67 terawatts-hora, em outubro de 2020. Em fevereiro deste ano, a CCAF estimou que esse número subiu para 121,9 terawatts-hora.
Para se ter uma ideia do que isso significa, esse consumo representa aproximadamente 0,6% da produção global de eletricidade e é equivalente ao consumo anual de energia de pequenos países como Malásia ou Suécia.
Pior ainda: somente 39% dos mineradoras de bitcoin usam pelo menos alguma energia renovável. A imensa maioria depende de combustíveis fósseis, mais baratos, para minerar a moeda digital. “Como há muita competição, os mineradores têm incentivo para buscar as opções mais baratas, que são as mais poluentes”, diz Ungaretti.
Nesse mercado, a China, cuja principal matriz energética é o carvão, lidera o ranking de consumo de energia. Ela é seguida pelos EUA e pela Índia.
Conclusão: o bitcoin é sim um vilão do meio ambiente. Certo? Depende. As duas analistas resolveram comparar o consumo de energia do bitcoin com outras atividades para saber o impacto da mineração da moeda digital.
Segundo um estudo do Digiconomist, as emissões anualizadas do bitcoin são estimadas em 37 milhões de toneladas de dióxido de carbono. Esse é o mesmo nível emitido anualmente pela Nova Zelândia.
Um estudo de Evan Mills, cientista sênior do Laboratório Nacional Lawrence Berkeley, feito em 2018, estimou que os videogames, apenas nos Estados Unidos, respondem por cerca de 12 milhões de toneladas de CO2 por ano, um terço das emissões produzidas globalmente pelo bitcoin.
Outra comparação mostrada no estudo é com a extração do minério físico – o bitcoin, na verdade, é uma espécie de “ouro digital”. Segundo a Digiconomist, todos os anos, cerca de 3,5 milhões de toneladas de ouro são extraídas, com um total de emissões atingindo 81 milhões de toneladas métricas de dióxido de carbono, pouco mais de duas vezes a do bitcoin.
Além disso, a pegada de carbono do bitcoin é mínima quando comparada à dos carros, usinas de energia, fábricas e bancos. Segundo uma pesquisa da ARK Investment Management, o ecossistema do bitcoin consome menos de 10% da energia necessária para o sistema bancário tradicional.
Mas as duas analistas lembram que o sistema financeiro atende a um número imenso de pessoas, possui milhares de funcionários e conta com um número considerável de escritórios para sustentar.
“A infraestrutura da indústria de criptomoedas ainda está sendo construída e o número de indivíduos envolvidos neste ecossistema é consideravelmente menor”, escreveram em um trecho do relatório.
Conclusão: o bitcoin não é tão vilão como se pensava. Certo? Nem tanto. “O bitcoin não é o grande monstro causador de emissões”, diz Ungaretti. “Mas ele é um dos problemas e faz parte de um desafio muito maior, que é reduzir as emissões de dióxido de carbono.”
As duas analistas lembram que o bitcoin está dando os primeiros passos e que deve ainda crescer bastante. Ao manter essa matriz energética poluente e ineficiente pode ser tornar em um problema maior no longo prazo.
“Não existe uma bala de prata”, escreveram as duas analistas no relatório. “É preciso unir esforços por parte dos governos, empresas e sociedade no combate à alta das emissões de carbono e aos desafios climáticos como um todo, inclusive dentro da indústria de criptomoedas.”