Durante a campanha eleitoral, a perspectiva de eleição de Luiz Inácio Lula da Silva trouxe certo temor ao mercado e aos acionistas da Eletrobras, diante das declarações de que, se eleito, ele poderia reestatizar a companhia.
O tema ainda é incerto, mas a perspectiva de uma reversão da privatização não é motivo de preocupação entre os analistas que acompanham a empresa. O BTG Pactual, por exemplo, estima que isso custaria mais de R$ 300 bilhões à União, considerando o prêmio que o novo estatuto social da companhia impõe a qualquer um que alcance uma participação de 50% mais uma ação no capital social da operação.
Para os analistas que acompanham a maior companhia de energia do País, outro tema, no entanto, deve provocar ruído e discussão entre os acionistas. É a proposta de conversão das ações preferenciais classe B (ELET6) em ações ordinárias (ELET3), como parte da migração da companhia para o Novo Mercado, nível mais alto de governança da B3 e que, entre outras exigências, admite companhias que tenham apenas ações ordinárias.
No fim do último dia 28 de setembro, a Eletrobras informou ao mercado que estuda uma proposta em que os acionistas das ações preferenciais receberão, em troca de seus ativos, o equivalente a 1,1 ação ordinária.
Isso representa um prêmio de 10% para as ações sem direito a voto, situação capaz de resultar numa controvérsia enorme entre os acionistas.
A proposta de pagar um prêmio está baseada no argumento de que os detentores de ações preferenciais classe B (PNBs) têm o direito de receberem um dividendo que seja 10% superior ao pago para aqueles que possuem ações ordinárias, papel que dá ao titular direito a voto em assembleias.
“Outro argumento para o pagamento do prêmio é que as ações preferenciais representam uma parcela pequena do capital social da Eletrobras e os acionistas preferenciais precisam aprovar a transação (migração ao Novo Mercado), então isso tornaria o processo muito mais tranquilo, considerando que o montante a ser ‘pago’ não seria tão significativo”, diz trecho do relatório do BTG Pactual, assinado pelos analistas João Pimentel, Gisele Gushiken e Maria Resende.
Atualmente, as ações ordinárias representam cerca de 87,8% das ações totais da Eletrobras, enquanto as PNBs equivalem a 12,1%.
No entanto, os analistas afirmam que alguns acionistas da Eletrobras com papéis ordinários não avaliam que o pagamento de prêmio é correto. Para esses investidores, os detentores de PNBs se beneficiarão de um aumento da liquidez no momento em que as ações forem convertidas e a Eletrobras for para o Novo Mercado.
Além disso, esses opositores citam o histórico de empresas que realizaram conversão de ações quando mudaram de patamar de governança, alegando que a relação de troca fica na casa de um papel preferencial para um ordinário.
Para os analistas Marcelo Sá, Fillipe Andrade, Luiza Candiota e Karoline Correia, do Itaú BBA, a proposta da Eletrobras deve sofrer contestações.
“Acreditamos que se esta proposta seguir em frente, os acionistas com ações ordinárias podem contestar a proposta de troca, argumentando que as ações ordinárias têm muito mais liquidez e, por tanto, o prêmio para as ações preferenciais deveria ser menor que 10%”, diz trecho do relatório.
No fato relevante que apresentou a proposta de conversão, a Eletrobras informou que os termos e condições, e a migração para o Novo Mercado, estão sob análise da administração e dependerão de aprovações societárias e autorregulatórias da B3.
A empresa acrescentou que a operação também dependerá de “eventuais condições que, na visão do conselho de administração da companhia, atendam aos melhores interesses da Eletrobras e dos seus acionistas”.
A listagem da Eletrobras no Novo Mercado é parte do processo de privatização da companhia, que ocorreu em junho deste ano, por meio de uma capitalização que movimentou cerca de R$ 33,7 bilhões e diluiu a participação da União em ações ordinárias de 51,8% para 33%.
No comunicado que divulgou a intenção de migrar ao Novo Mercado, publicado na quarta-feira, 26 de outubro, a Eletrobras informou que a medida faz parte do aprimoramento de sua governança corporativa. O nível mais alto de governança da B3 reúne companhias que são mais transparentes e que oferecem mais direitos aos acionistas, o que acaba fortalecendo a demanda pelos papéis.
As ações ordinárias da Eletrobras fecharam o pregão desta segunda-feira, dia 31 de outubro, com alta de 2,89%, a R$ 49,82, enquanto as PNBs avançaram 4,30%, a R$ 53,32. No ano, elas acumulam altas de 51,8% e 67,7%, respectivamente, levando o valor de mercado da companhia a R$ 117 bilhões.