Horas após a divulgação do Relatório Focus, do Banco Central, indicar uma nova projeção do mercado de queda de inflação e aumento do PIB para 2023, o presidente do BC, Roberto Campos Neto, participou nesta segunda-feira, 12 de junho, de um evento no IDV (Instituto para o Desenvolvimento do Varejo) no qual foi cobrado pelos maiores varejistas do País, sem maiores rodeios, para começar a reduzir a taxa de juros.
Campos Neto fez uma palestra mostrando toda a evolução da política monetária do BC no pós-pandemia. Durante a apresentação, deu várias sinais de que os indicadores confirmam que o cenário “está abrindo caminho para a queda de juros”, citando até a aprovação do arcabouço fiscal na Câmara dos Deputados.
“O juro futuro caiu, o câmbio melhorou, tudo está indo na direção certa”, disse Campos Neto. “Parte do trabalho está sendo feito, o processo é lento, por isso é preciso paciência”, acrescentou diante da plateia ilustrada – que reunia altos executivos das maiores empresas de varejo do país, entre elas, Magazine Luiza, Bob’s, Zara, Telhanorte, Drogasil, Grupo Soma, Carrefour e Pão de Açúcar, entre outros.
O tom cordial, que prevaleceu ao longo do evento, de duas horas de duração, ganhou emoção nos instantes finais, quando a empresária Luiza Trajano, presidente do conselho de administração do Magazine Luiza, pediu a palavra.
“Por favor, presidente, nos dê um sinal para baixar os juros, nem as grandes e muito menos as pequenas e médias empresas estão aguentando”, cobrou Trajano, de forma educada, mas firme, sob o olhar surpreso do presidente do BC.
E prosseguiu: “Podemos até fazer um pacto de não subir os preços se o senhor baixar os juros. E reduzir 0,25 ponto percentual não adianta, tem de ser mais”, emendou com uma risada, para quebrar o gelo.
“Não posso comentar sobre a próxima reunião do Copom”, rebateu Campos Neto, demonstrando tranquilidade, referindo-se ao encontro da semana que vem, quando os nove integrantes da diretoria do BC vão decidir se a instituição vai alterar a taxa Selic, hoje em 13,75%.
“Meu voto é de 1 em 9, o trabalho do BC é técnico, trabalhamos com a expectativa de inflação futura e os dados são animadores, é preciso paciência”, emendou o presidente do BC.
Inflação em queda
A pressão pela queda de juros era esperada depois de o Relatório Focus divulgar pela manhã novas estimativas para a inflação do IPCA de 2023, que caiu para 5,42% ante 5,69%da semana anterior - e bem abaixo dos 6,02% de quatro semanas atrás.
O mercado também revisou o avanço da inflação nos próximos três anos. Para 2024, o índice que mede a variação nos preços para o consumidor deve subir 4,04%, ante 4,12% da semana passada. Já em 2025 e 2026, as novas projeções sinalizam aumentos de 3,90% e 3,88%, respectivamente.
O PIB de 2023 também foi revisado, de 1,84% de crescimento, acima da última previsão, da semana passada, de 1,68%. A taxa Selic, no entanto, deve fechar o ano em 12,5%.
Antes de Luiza Trajano, Marcelo Silva – vice-presidente do conselho de administração do Magazine Luiza e ex-presidente do IDV – já havia mostrado o efeito dos juros nas empresas do setor. Em 2022, segundo ele, já houve redução sensível no balanço de 27 empresas de capital aberto do varejo, as maiores do setor.
“Em 2023, os juros correspondem a 32% das despesas financeiras”, afirmou Silva, apontando que as maiores varejistas saíram de um lucro médio de 1,9% no primeiro trimestre de 2022 para um resultado negativo de 1,5% no primeiro trimestre deste ano: “Essa carga está se tornando insuportável.”
Antônio Carlos Pipponzi, presidente do conselho de Administração da RD (Raia Drogasil), a maior empresa farmacêutica varejista do Brasil, também reclamou que “a dor está demais” para o setor.
Campos Neto reforçou alguns argumentos usados anteriormente, lembrando que não adianta “apressar” a queda de juros. “Só quando a taxa de juros de longo prazo cai que permite a queda da Selic”, disse, lembrando que o BC forçou uma queda de juros entre 2012 e 2013 que durou pouco. “O ciclo monetário é de 2 anos ou 2,5 anos, subimos os juros 9%, o mesmo que o Chile, e o juro real brasileiro é o menos alto da média histórica”, argumentou.
Já no fim do evento, quando foi cobrado por Luiza Trajano, Campos Neto usou um tom descontraído ao responder à empresária, afirmando ter certeza de que, quando voltar ao IDV no próximo ano, os varejistas, olhando em retrospectiva, farão uma avaliação positiva do trabalho do BC.
“Quando o senhor voltar daqui a um ano vai ter muita empresa quebrada...”, respondeu Trajano.