No combate às mudanças climáticas, a montadora japonesa Toyota investe em carros limpos, energia renovável em suas instalações, reciclagem de resíduos sólidos e... em uma plantação de morangos e tomates cereja.
Sim, para a maior fabricante de automóveis do mundo, na busca por um futuro social e ambientalmente responsável, é preciso ir além da mobilidade. E isso passa, necessariamente, pela cadeia agrícola – por ajudar os produtores a colher mais, com menos; sem agredir o planeta.
A ideia é levar para a agricultura o célebre Sistema Toyota de Produção (TPS, na sigla em inglês); ou “toyotismo”. Desenvolvido pelo engenheiro mecânico Taiichi Ohno, entre 1947 e 1975, o modelo propõe aumentar a eficiência e a produtividade, pela combinação da redução de desperdícios, estoques baixos e gestão precisa dos fluxos de trabalho.
O TPS está esmiuçado no best-seller “A máquina que mudou o mundo”, de James Womack, Daniel Jones e Daniel Roos. Lançado em 1990 e reeditado em 2007, o livro foi traduzido para 11 idiomas e vendeu quase um milhão de exemplares. Até hoje a metodologia serve de referência para empresas de todo o mundo.
Agora, o modo enxuto de fazer carros da Toyota está se revelando eficaz também no campo. As experiências agrícolas da montadora estão em duas estufas, montadas em duas fábricas, na província de Aichi, ao sul de Tóquio.
Na unidade Kamigo, de onde saem os motores dos modelos Crown e Nexus, também se colhem quatro variedades de morangos. E, na Myochi, peças de transmissão e componentes fundidos são produzidos lado a lado com tomates cereja.
Com a ajuda de agricultores locais, em abril de 2022, a Toyota deu início ao projeto. Logo no início da plantação dos morangos, os engenheiros da montadora sugeriram organizar as linhas de cultivo à semelhança das linhas de montagem de carros.
Nas lavouras convencionais, as sementes são dispostas em fileiras retas e paralelas, com um vão entre elas. Em Aichi, os morangos são plantados em fileiras móveis, que deslizam de um lado para outro. O corredor só é criado quando e onde for necessário. Com mais espaço para as plantas, lá, a colheita rende, pelo menos, uma vez e mais do que na técnica tradicional.
O calor residual e o carbono provenientes da construção de motores e peças de automóveis são desviados para as estufas para ajudar no crescimento e fortalecimento das frutas. Imprescindível para a biota do solo, o CO² alimenta os microrganismo e pequenos animais que, em última instância, contribuem para o desenvolvimento das culturas.
E o ambiente aquecido (sem exageros, claro) influencia a maioria dos processos da planta, como fotossíntese, respiração, transpiração, germinação e floração.
Os técnicos da Toyota adotaram nas fazendas de Kamigo e Myochi algumas das tecnologias mais modernas da agricultura vertical. A iluminação, por exemplo, é fundamental para a colheita de frutas suculentas e saborosas.
LEDs cor de rosa nutrem os morangos e tomates, na medida certa, conforme as necessidades da plantação. É a fotossíntese hightech na produção de alimentos com altos teores de vitaminas e minerais – mais nutritivos do que os produtos cultivados ao ar livre. E mais protegidos contra fungos e bactérias; a luz ultravioleta mata os micróbios.
Outro preceito do “toyotismo” levado do chão de fábrica para as lavouras de morangos e tomates é a metodologia 5S. Criado para tornar o ambiente de trabalho mais organizado e confortável, aumenta a produtividade e a qualidade dos produtos, melhora o aproveitamento dos materiais, reduz custos e acidentes.
Os “Ss” referem a cinco expressões japonesas: “seiri”, senso de utilização; “sieton”, senso de ordenação; “seisō”, senso de limpeza; “seiketsu”, senso de saúde; e “shitsuke”, senso de autodisciplina. Nas estufas da montadora, por exemplo, as linhas de cultivo foram numeradas e catalogadas. Assim, o monitoramento fica mais fácil e, em caso de algum imprevisto, o problema pode ser solucionado rapidamente.
Iniciativas como essa podem parecer básicas, até óbvias, mas os sistema agrícolas, sobretudo os operados segundo os preceitos mais antigos, sofrem com a falta de processos bem estabelecidos.
Os morangos e tomates colhidos nas fábricas da Toyota não vão para o mercado. São oferecidos gratuitamente nos refeitórios da companhia. Diz Hiroshi Okajima, gerente geral de projetos, da divisão de P&D e gerenciamento de engenharia da empresa, em comunicado: “Não estamos aqui para tirar o emprego dos agricultores – queremos ajudá-los na construção de sistemas agrícolas eficientes”.