Como todos sabem, o dia tem 24 horas e, na média, dorme-se um terço desse tempo. Ok. Normal. Natural. Ou deveria ser. Mas por que usar essa medida de tempo para dormir? Ou por que se empurra as coisas mais importantes a serem feitas para a noite se isso pode não ser saudável?
Não são poucas as pessoas que ficam acordadas até tarde, fazem exercícios físicos depois do trabalho, e, em geral, têm vida social depois de anoitecer. Além disso, cada vez mais, muitos se esquecem que o corpo é regido por um relógio biológico rigoroso dia após dia.
Em "O ciclo da vida: Como a nova ciência do relógio biológico pode revolucionar seu sono e sua saúde", o neurocientista inglês Russell Foster faz uma série de questionamentos sobre esse tema e o que impacta na vida de cada um. Ah, e o preço que o corpo cobra a qualquer momento para quem não presta atenção nesses ponteiros – que são diferentes de pessoa para pessoa.
O autor fala em empoderar o leitor, com informações e ensinamentos concretos com base nas últimas pesquisas científicas. Desse modo, será capaz de usar as ideias expostas no livro para compreender melhor aquilo que forma o tique-taque do relógio biológico e, o mais importante, usar esses conhecimentos para elaborar uma rotina pessoal ideal, quaisquer que sejam a idade e situação.
Mesmo que para isso tenha buscado romper alguns mitos e furar algumas bolhas, como a ideia de que os adolescentes são preguiçosos e de que o executivo que acorda às quatro da manhã para trabalhar é um modelo a ser seguido.
Ele dá resposta para tudo. Na verdade, sugere. Antes, pergunta, por exemplo, se todo mundo precisa de oito horas diárias de sono. E afirma que comer após o pôr do sol pode afetar o peso. Portanto, ser bem-informado pode levar a decisões que permitem uma vida mais saudável e ativa, tanto no privado quanto no profissional.
Seu estudo sobre o relógio biológico de 24 horas conclui que pode ser uma boa ideia identificar os horários ideais de dormir, comer, praticar exercícios, fazer sexo, tomar remédio, estudar e trabalhar. Seria uma espécie de harmonização com o próprio corpo e a mente. E isso o próprio organismo sugere. Quantas pessoas não se dão por satisfeitas com quatro ou cinco horas de sono?
A partir de suas próprias constatações e das mais recentes descobertas da ciência que estuda os ritmos circadianos (mudanças regulares dos estados mentais e físicos que ocorrem em cerca de um período de 24 horas), ele mostra os impactos que a hora do dia pode ter na saúde e no desempenho do indivíduo ― os efeitos dos medicamentos, por exemplo, podem depender do horário em que são ingeridos. Sim, uma caminhada ao ar livre, bem cedinho, pode garantir uma melhor noite de sono.
Como entender por que o humor e as habilidades de uma pessoa mudam da manhã para a tarde? Por que certas pessoas acordam de péssimo humor? Em busca de respostas, Foster estuda a natureza do relógio biológico há quatro décadas. Atualmente, é professor de Neurociência Circadiana e diretor do Instituto Sir Jules Thorn do Sono e de Neurociência Circadiana, em Oxford. “De certa forma, este livro representa um compilado de tudo que aprendi”, afirma, modestamente.
Sua esperança “é transmitir um pouco do entusiasmo, do encanto, do fascínio e do permanente prazer que senti ao longo de todos esses anos” de tanta dedicação. O autor destaca que nas últimas décadas, tem-se visto uma explosão de descobertas sobre a ciência do relógio biológico e dos ciclos de 24 horas que regem a vida das pessoas em todo o planeta.
Desses ciclos, o mais evidente é o padrão diário de sono e vigília. Segundo ele, a maioria dos livros discute o relógio biológico e o sono em separado. Novas constatações, porém, mostram que essa abordagem desconexa só conta uma parte da história: “Não há como compreender o sono de forma apropriada sem compreender o relógio biológico; e o sono, por sua vez, é quem regula esse relógio”.
A proposta que ele defende é pensar os dois – relógio biológico e sono – em conjunto, como duas áreas da biologia intimamente ligadas e entrelaçadas, que definem e controlam a saúde de todo mundo. Em inúmeros casos, escreve Foster, a capacidade de ter ou não êxito em algo, de voltar do trabalho dirigindo em segurança ou de fazer uma dieta para perder peso dependerá de o indivíduo trabalhar a favor ou contra esses ciclos de 24 horas.
A proposta que ele defende é pensar os dois – relógio biológico e sono – em conjunto
Para ele, aconteceu tantas coisas nessa área da ciência e da medicina que muitas vezes fica difícil diferenciar o que é fato do que é lenda. E algumas coisas se transformam em verdades absolutas ou “ordens peremptórias”. Por isso, “em vez de serem reconhecidos como amigos fiéis, os ritmos biológicos e o sono costumam ser retratados como um inimigo que precisa ser combatido, subjugado e derrotado”.
O que ele propõe é, em vez disso, compreender e abraçar esses ritmos. Assim, procura elucidar a ciência dos relógios biológicos e do sono. Não só recorre às próprias experiências como cientista. Ele diz que tirou proveito das discussões com amigos e colegas que contribuíram para compreensão atual do tempo biológico.
Sua intenção é mostrar que uma série de evidências em que se baseiam os conhecimentos atuais podem ser usadas por todos para tomar decisões mais informadas sobre como melhorar as próprias vidas – dormir melhor, organizar atividades diárias, como vacinar em determinado horário etc.
É possível compreender também o porquê de adolescentes e idosos terem dificuldade em conseguir um sono reparador ou seu estado de espírito e sua capacidade de tomar decisões podem mudar da manhã para a tarde; e o risco de o divórcio ser maior entre aqueles que trabalham no turno da noite. “Busquei salientar que somos todos muito diferentes e que, embora seja possível generalizar, tentar tirar uma média pode ser enganoso”. E causar equívocos ou riscos.
Seu estado de espírito e sua capacidade de tomar decisões podem mudar da manhã para a tarde
Há curiosidades reveladoras. Afirma Foster que, ainda que a duração média do ciclo menstrual seja de 28 dias, apenas 15% das mulheres têm de fato um ciclo de 28 dias. “O relógio biológico e a biologia do sono podem ser comparados ao tamanho de um sapato: não existe um número que sirva para todos, e obrigar todo mundo a usar o mesmo número não apenas seria estúpido, mas potencialmente danoso”.
Ele explica que o sono e os ritmos diários provêm da genética de cada um, fisiologia, comportamento e entorno, e, assim, como a maioria dos comportamentos, não podem ser vistos como fixos. “Modificam-se de acordo com nossas atitudes, a forma de interagir com o ambiente e as mudanças do nascimento à velhice”, afirma.
Da primeira infância à idade adulta avançada, o relógio biológico e padrões de sono se transformam de modo profundo. Mas isso não é necessariamente algo que deva ser visto como ruim. “Precisamos parar de nos preocupar com nosso sono e aceitar que diferente não quer dizer pior”.
Em síntese, o relógio de cada pessoa é o que avisa qual é a melhor hora para dormir, comer, pensar e realizar uma série de outras tarefas essenciais. E não que todo mundo deva dormir em certa hora. “Esse ajuste interno diário permite operar de maneira ideal em um mundo dinâmico, sintonizando nossa biologia com as exigências profundas impostas pelo ciclo dia/noite gerado pela rotação de 24 horas da Terra em torno do seu eixo”.
O relógio de cada pessoa é o que avisa qual é a melhor hora para dormir, comer, pensar e realizar uma série de outras tarefas essenciais
Foster destaca que ao antecipar a manhã que se aproxima, o corpo se prepara de modo que o novo ambiente possa ser explorado de imediato. “A pressão arterial e a taxa metabólica, junto com outros processos biológicos, sobem antes da alvorada”. Tudo isso exige uma biologia e um comportamento que estejam prontos e preparados na hora certa do dia. Sem essa regulação precisa de um relógio interno, toda a biologia do indivíduo viveria no caos.
Serviço:
O ciclo da vida - Como a nova ciência do relógio biológico pode revolucionar seu sono e sua saúde
Russel Foster
Editora Objetiva
432 Páginas
Impresso: R$ 119,90
ebook: R$ 44,90