Entre 2019 e 2022, mesmo com o mercado aquém das expectativas, a Döhler injetou R$ 100 milhões na ampliação da verticalização, da automação e da capacidade da sua fábrica em Joinville, voltada à produção de artigos de cama, mesa e banho, além de tecidos para setores como calçados e hotelaria.
Concluída essa etapa, a companhia catarinense, fundada em 1881, revelou com exclusividade ao NeoFeed um novo plano de investimentos. A empresa projeta um aporte de aproximadamente R$ 80 milhões no prazo de dois a três anos.
O montante é menor quando comparado ao ciclo anterior, mas não reduz o valor estratégico por trás da nova cifra. A quantia será aplicada majoritariamente em inovação e em produtos com apelo sustentável, e tem como principal racional proteger o negócio de uma “ameaça” no horizonte da indústria centenária.
“Hoje, a empresa pode ampliar sua produção em 20%, 25%, sem nenhum problema”, diz Udo Döhler, presidente do conselho de administração da Döhler, ao NeoFeed. “Mas a inovação passa a ser essencial pra que a companhia não corra o risco de conviver com uma concorrência predatória que se avizinha.”
O ponto de atenção reflete o receio, não restrito à empresa, de que o “efeito Shein” no setor de vestuário se estenda a outros ramos da indústria têxtil. Na Döhler, o temor envolve a categoria de cama, mesa e banho, responsável por 70% da sua receita bruta, da ordem de R$ 770,6 milhões em 2022.
Nesse caso específico, a ameaça estaria personificada em outros atores. Em particular, na entrada no País de fornecedores da Índia, mais conhecidos por praticarem preços agressivos, muito abaixo do mercado, e de qualidade inferior.
Com um quadro de 3,2 mil funcionários e um time em ampliação, de cerca de 40 profissionais de pesquisa e desenvolvimento, a Döhler enxerga no novo plano, cujos recursos serão financiados por mecanismos de inovação, uma maneira de se preparar - e de se distanciar - dessa briga por preço.
Na prática, o montante do novo plano será destinado desde áreas como fiação, com a busca por novas composições nas fibras, até a confecção. A ideia é desenvolver produtos que mesclem, da produção até a ponta da oferta, componentes como tecidos inteligentes e uma pegada ESG.
“Já temos opções no portfólio e estamos trazendo mais produtos nessa ótica de inovação”, explica Döhler. “Acabamos de lançar, por exemplo, uma linha onde transformamos fios de garrafas PET em tecidos de cortinas, colchas e roupas de cama.”
Em outros exemplos recentes, a empresa anunciou nesta semana o pré-lançamento de uma linha de tecidos impermeáveis para decoração, além de uma nova opção de roupas de cama com tecido inteligente, que absorve o suor e permite maior conforto em termos de temperatura.
Já na fábrica da empresa, essa abordagem se conecta com investimentos realizados em frentes como uma estamparia digital, que não usa água, não gera afluentes e que hoje já cobre 18% da produção de 1,4 mil toneladas de tecidos por mês.
Hoje, além dos 70% concentrados no segmento de cama, mesa e banho, cerca de 10% do negócio vêm da hotelaria; outros 10% de exportações, em especial, para os Estados Unidos; e, parcela restante, para outras indústrias.
Em 2023, a projeção é de um faturamento na casa de R$ 900 milhões. Já em um intervalo de sete a oito anos, a meta é dobrar o tamanho da operação. E, nessa direção, a nova fase de investimentos não é o único passo para alcançar essa escala.
Listada na B3 e avaliada em R$ 527,7 milhões, mas com um volume ínfimo de negociações, a empresa planeja, também no prazo de dois a três anos, buscar um follow on. Na oferta, a família Döhler, que detém 87% das ações, abriria mão de parte da sua fatia para ampliar a liquidez do papel.
“Já avançamos bem na profissionalização da gestão”, diz Döhler, membro da quarta geração do clã. “Dentro dessa meta de dobrar a operação, quando tudo estiver equacionado, a família vai deixar de participar diretamente da operação e, naturalmente, se for o caso, ocupará seus espaços no board.”