Na semana passada, o Alibaba anunciou o plano para uma abertura de capital em Hong Kong da Cainiao, seu braço de logística. Antes de seguir esse trajeto, a empresa terá de lidar, porém, com um obstáculo à frente, que veio à tona na quinta-feira, 5 de outubro.

A pedra no caminho surgiu a partir de uma reportagem do jornal Financial Times, em que fontes de serviços de inteligência e de segurança da Bélgica revelaram que estão trabalhando para detectar “possíveis atividades de espionagem e/ou interferência” de companhias chinesas, “incluindo o Alibaba”.

Uma das conexões desse “pente fino” é um centro logístico da Cainiao no terminal de cargas do Aeroporto de Liège. A unidade é a única desse porte gerida pela companhia na Europa. E é mais um exemplo do escrutínio crescente dos governos do Velho Continente sobre empresas chinesas.

O Alibaba, que negou qualquer irregularidade, assinou um acordo com a Bélgica em 2018 para a abertura do hub, que agora está no centro dessa questão. Como parte do projeto, o grupo investiu € 100 milhões na região da Valônia, que abriga o aeroporto e estava em dificuldades.

Esse cartão de visitas da companhia não impediu, no entanto, que a unidade fosse monitorada. E, mesmo dois anos depois do desembarque da operação, esse trabalho segue ativo a partir de análises feitas pelos órgãos de inteligência do país.

Segundo o Serviço de Segurança do Estado Belga (VSSE), o Alibaba é um ponto de atenção para o órgão, em função da legislação que obriga as empresas chinesas a compartilharem seus dados com as autoridades e serviços de inteligência do país asiático.

Sob essa ótica, uma das áreas no radar do monitoramento é um sistema para coletar informações econômicas sensíveis. Outro risco potencial é um software usado para agilizar os processos logísticos. “A China tem a intenção e a capacidade de utilizar esses dados para fins não comerciais”, observou a VSSE.

Segundo uma das fontes ouvidas, a Cainiao é capaz de acessar informações sobre varejistas, produtos, detalhes e fluxos de transporte, além de dados pessoais dos consumidores. Esse “arsenal” seria valioso para a China, especialmente para seus planos de dominar a cadeia de abastecimento.

Atento a essa questão, Vincent Van Quickenborne, ministro da Justiça da Bélgica, ressaltou ao jornal britânico que o acordo inicial com o Alibaba era do “século passado” e acrescentou que “os tempos de ingenuidade mudaram”.

Como parte dessa mudança de cenário, em julho deste ano, entrou em vigor na Bélgica uma nova lei para examinar os investimentos estrangeiros em infraestruturas críticas. O monitoramento do centro da Cainiao se enquadra justamente nesse arcabouço.

Essa unidade se concentra especialmente em produtos vendidos pelo Alibaba diretamente aos consumidores europeus, por meio da operação do AliExpress. O centro fica em uma área industrial de armazéns, com acesso ao campo de aviação do aeroporto.

Os funcionários da Cainiao carregam e descarregam mercadorias e transportam as encomendas para o hangar de 30 mil metros quadrados da operação para serem classificadas e enviadas. A empresa já solicitou uma licença para mais do que triplicar o tamanho da unidade, para 100 mil metros quadrados.

Em outra escala, os planos de um IPO da Cainiao apontam para a meta de captar, no mínimo, US$ 1 bilhão por meio da oferta. A abertura de capital da operação é parte de um movimento de divisão do Alibaba em seis unidades independentes de negócio, anunciado no primeiro semestre.

As ações do Alibaba encerraram o pregão de quinta, 5, cotadas a US$ 83,67, com ligeira queda de 0,49%. Em 2023, os papéis registram um recuo de 5%. A empresa está avaliada em US$ 213,9 bilhões.