Gestora de venture capital fundada por Antonio Moreira Salles e Julio Benetti, a brasileira Mandi Ventures nasceu em 2020 com a tese de investir em startups nos segmentos de agro e de alimentação no País e no exterior.
Desde então, essa proposta rendeu quatro investimentos no Brasil, nos Estados Unidos e na França. Agora, a gestora brasileira está acrescentando mais uma escala em seu portfólio ao liderar uma rodada de série A na Multus Biotechnology, startup britânica de agricultura celular.
O aporte de £ 7,9 milhões (US$ 9,5 milhões) também conta com a participação dos fundos SOSV, Big Idea Ventures e SynBioVen, além da empresa Asahi Kasei. O montante inclui ainda uma doação de £ 2,15 milhões da Innovate UK, agência de inovação do Reino Unido, por meio da EIC Accelerator.
“Começamos a olhar para empresas que pudessem atuar no meio da cadeia de carnes cultivadas”, diz Antonio Moreira Salles, cofundador da Mandi Ventures. “E, além do time, a Multus tinha a tecnologia que fazia mais sentido em termos de escalabilidade e potencial de ganhos de custo.”
Fundada em 2019, a Multus Biotechnology já havia captado um aporte de £ 2,15 milhões (US$ 2,5 milhões) em julho de 2021. Além da Innovate UK e da SOSV, a rodada em questão atraiu fundos como Zero Carbon Capital e Marinya Capital.
A proposta da startup é atuar justamente na cadeia de carnes cultivadas, também chamadas de “carnes de laboratório”, produzidas a partir de células de animais. Segundo um estudo da consultoria McKinsey, o segmento deve movimentar US$ 25 bilhões globalmente em 2030.
Com os recursos injetados em 2021, a Multus lançou seu primeiro produto, batizado de Proliferum. Trata-se de uma alternativa para eliminar o uso de soro fetal bovino na cultura de células e que ainda está em fase inicial de comercialização.
“Estamos confiantes de que nossa abordagem única desempenhará um papel fundamental em tornar a carne cultivada uma escolha sustentável e acessível para todos”, afirmou, em nota, Cai Linton, CEO da Multus Biotechnology.
Ao frisar que a Mandi Ventures enxerga grande potencial no cultivo celular como uma fonte de proteína animal na “dieta do futuro”, Julio Benetti, cofundador da gestora, ressalta outro ponto que chamou a atenção para o modelo da startup britânica, dentro de um processo que incluiu a avaliação de cerca de 30 empresas.
“Analisamos empresas com diferentes teses e em diferentes geografias. E o que gostamos da Multus é o fato deles terem uma abordagem mais horizontal”, diz Benetti. “Eles não querem fazer tudo sozinhos e têm muito mais potencial para ter acesso a várias empresas desse mercado, como fornecedores.”
Benetti, que, a partir do deal, irá ocupar um dos assentos no board da Multus, também detalha os principais destinos do aporte que está sendo liderado pela Mandi Ventures. O primeiro deles é criar uma primeira linha de produção, relativamente pequena, para começar a escalar o produto. Isso incluirá a obtenção de certificações do ponto de vista de segurança alimentar.
Uma segunda frente será ampliar a equipe da companhia, formada atualmente por menos de dez profissionais. Esse crescimento envolverá tanto o time de cientistas como o de outras áreas, entre elas, o departamento comercial.
“Eles estão em estágios iniciais de comercialização, mas a ideia é ampliar as conversas nessa direção”, afirma Benetti. “E os recursos também serão usados para pesquisa e desenvolvimento e para novas gerações do produto, pra tipos de cultivos diferentes.”
Esse mercado tem se mostrado um campo fértil para outros investidores brasileiros, também com um alcance global. Um exemplo é a Lifely, fundo de venture capital lançado em 2021 e cuja tese está centrada em empresas cujas operações eliminam a necessidade dos animais nas cadeias produtivas.
Desde a sua criação, a Lifely já investiu em mais de 12 startups de países como EUA, China, Austrália, Estônia e Eslovênia. Entre elas, as americanas Jellatech, que desenvolveu um colágeno a partir do conceito de agricultura celular, e Bucha Bio, que cria alternativas a materiais como o couro.
Esse portfólio inclui ainda nomes como a americana Wildtype, que produz frutos do mar a partir de células de salmão selvagem do Alasca. A relação de investidores da startup também dá uma medida mais ampla do interesse por empresas que estão desbravando esse espaço.
A Wildtype já atraiu investidores como a gestora L Catterton; o Bezos Expeditions, de Jeff Bezos, da Amazon; o Temasek, fundo soberano de Cingapura; e fundos dos astros de Hollywood Robert Downey Jr. e Leonardo DiCaprio.
Outro nome de peso que começou a olhar com mais interesse especificamente para o mercado de carnes cultivadas é a JBS que, em agosto de 2021, ingressou nesse espaço ao comprar o controle da espanhola BioTech Foods. Já em maio do ano passado, a empresa anunciou a operação do JBS Biotech Innovation Center. Os dois movimentos concentraram um investimento de mais de US$ 100 milhões.
No caso da Mandi Ventures, cuja tese inclui outros componentes além das carnes cultivadas, a Multus Biotechnology é o quinto investimento no portfólio. Já integram esse pacote a americana Farmer Business Network, a francesa Les Miraculeux e as brasileiras Gaivota e Tarken.
“Estamos crescendo o time para apoiar esse portfólio. O ano passado foi, provavelmente, nosso ano mais ativo no mercado”, observa Salles. “E ainda temos cerca de 70% do capital que levantamos, de US$ 30 milhões, para investir.”