Desde o início de 2020, o IRB vive uma crise de credibilidade e vem penando para reconquistar a confianças dos investidores. No início de setembro deste ano, o grupo de resseguros parecia, enfim, estar saindo desse inferno astral, quando finalizou um follow on no qual captou R$ 1,2 bilhão.

Nesta segunda-feira, 24 de outubro, no entanto, uma queda intensa nas ações da companhia voltou a colocar em xeque essa recuperação. Os papéis do IRB registravam queda de 6,6% por volta das 16h24 na B3, dando à companhia um valor de mercado de R$ 2,4 bilhões.

Durante todo o dia, não foram poucas as vezes em que as ações chegaram a serem negociadas abaixo de R$ 1. No ano, elas acumulam uma desvalorização superior a 75%.

O novo revés teve como estopim números divulgados na última sexta-feira, 21 de outubro, como parte da prestação de contas enviada todos os meses à Superintendência de Seguros Privados (Susep). Entre outros indicadores, o IRB reportou um prejuízo líquido de R$ 164,7 milhões em agosto.

O montante em questão reverte o lucro de R$ 84,8 milhões registrado no mesmo período, um ano antes, quando houve um efeito positivo de R$ 129,4 milhões decorrente do ganho de uma ação judicial referente ao PIS/PASEP. E é 179,6% maior do que a perda divulgada em julho de 2022, da ordem de R$ 58,9 milhões.

Já nos primeiros oito meses de 2022, o prejuízo líquido foi de R$ 516,4 milhões, contra uma perda de R$ 168,9 milhões em igual período, um ano antes. Esses e outros indicadores acenderam um novo sinal de alerta para o IRB, que irá divulgar os resultados consolidados do terceiro trimestre em 10 de novembro.

“Eles tiveram dois anos sequenciais de resultados fracos no segmento agro, o que não é comum, e boa parte dessas perdas foi registrada no segundo trimestre. O mercado não esperava um prejuízo tão grande agora”, diz Eduardo Nishio, analista-chefe da Genial Investimentos, ao NeoFeed.

Ele acrescenta: “Eles acabaram de fazer um follow on e seguem comendo capital. Em tese, era o momento de começarem a recompor organicamente esse capital”, afirma Nishio. “Do contrário, será preciso cortar na carne, ou seja, pegar parte do prêmio e vender e tentar buscar outros ganhos.”

Com recomendação neutra para o papel e preço-alvo de R$ 1,30 para a ação, o BTG Pactual seguiu na mesma linha. “Embora uma perda líquida fosse esperada, pelo menos por nós, essa magnitude não era. O aumento de capital mais recente pode ser insuficiente se a empresa não puder voltar ao lucro em breve”, escreveram os analistas Eduardo Rosman, Thiago Paura e Ricardo Buchpiguel, do BTG Pactual.

O banco ressaltou outros pontos negativos. Entre eles, o índice de sinistralidade – bem acima de 100% - e o volume de prêmios emitidos pela companhia. No acumulado de janeiro a agosto, o índice de sinistralidade da operação ficou em 107,2%.

Já as despesas com sinistros totalizaram R$ 3,76 bilhões, um volume 1,8% maior na comparação com o mesmo intervalo de 2021. Em agosto, as despesas de sinistro foram de R$ 633,7 milhões, alta de 18,8% sobre agosto de 2021, com um índice de sinistralidade de 145%, contra o patamar de 84,6%, há um ano.

“Nós modelamos a sinistralidade em 98% para o terceiro trimestre. Mas parece que os resultados serão muito piores do que isso. Ainda precisamos ver como setembro se molda, mas a impressão está sendo mais forte do que temos em nosso modelo”, destaca outro trecho do relatório do BTG.

O prêmio emitido nos oito primeiros meses de 2022, por sua vez, ficou em R$ 5,5 bilhões, uma redução de 7,4% na comparação anual. No mês de agosto, esse indicador somou R$ 524,9 milhões, o que representou um recuo de 30,1%.

“O IRB ganhou algum tempo com as agências de rating, mas pode estar em risco em breve se não parar o sangramento”, afirmaram os analistas do BTG, ressaltando que a resseguradora pode precisar levantar mais capital, ainda mais se confirmar outro grande prejuízo no terceiro trimestre.

Além da piora em indicadores como a sinistralidade, o J.P. Morgan destacou que, dado os números divulgados, a projeção é de uma perda significativamente maior ante o prejuízo de R$ 27 milhões estimado anteriormente pela Bloomberg e do lucro de R$ 29 milhões projetado pelo banco.

“Além disso, a liquidez regulatória que estimávamos em um excedente de aproximadamente R$ 650 milhões após a oferta de agosto, deve estar mais próxima de cerca de R$ 400 milhões a R$ 450 milhões”, escreveram os analistas Guilherme Grespan, Domingos Falavina, Yuri Fernandes e Marlon Medina.

Embora siga vendo um cenário desafiador para o IRB, o quarteto de analistas do J.P. Morgan manteve a elevação da recomendação para o papel, feita em setembro, para neutro. “Ainda assim, mantemos a nossa preferência no setor pelas seguradoras primárias Porto e BB Seguridade”, acrescentaram os analistas.

O calvário do IRB teve início nos primeiros meses de 2020, quando uma carta da gestora Squadra expôs uma série de inconsistências no balanço da companhia. Esse contexto foi agravado com a veiculação de que a gestora Berkshire Hathaway, do bilionário Warren Buffett, havia comprado uma participação na companhia, o que foi desmentido posteriormente.

Na época, a cotação das ações do grupo despencou. O papel, que era negociado a R$ 41,43, em 31 de janeiro de 2020, passou a valer R$ 6,47, em apenas dois meses. O cenário ganhou contornos ainda mais críticos com a descoberta de práticas da gestão anterior, que encobriu sinistros e inflou os resultados da empresa, entre outras questões.